O PAN é um partido que anda entre a anedota e o perigo. Um exemplo: numa entrevista, o seu líder André Silva afirmou, sem uma hesitação ou um estremecimento, que “há características mais humanas num chimpanzé ou num cão do que numa pessoa em coma” — o que não mostra o respeito que tem pelos animais, mas mostra, de forma evidente e involuntária, o desrespeito que tem pelas pessoas. Outro exemplo: numa sessão solene de comemoração do 25 de Abril no Parlamento, o mesmo André Silva usou o Butão como exemplo de uma democracia invejável que valoriza os níveis de bem-estar mental, emocional e físico das populações — mas esqueceu-se de explicar que o país tem uma minoria étnica violentamente perseguida e que os estrangeiros não têm direito à educação, entre muitas outras excentricidades pouco democráticas.
Se o PAN é uma anedota e um perigo, como inegavelmente é, os 5,1% que o partido teve este domingo nas eleições europeias são um aviso. E um aviso sério. Os partidos do sistema estão a ignorar um dos temas que mais preocupa os eleitores jovens: o ambiente.
É um problema antigo. Antes do PAN, o bloqueio ecológico em Portugal chamava-se, pomposamente, Partido Ecologista “Os Verdes”. Na realidade, não é um partido — é uma ficção inventada pelo PCP, que quis dominar o movimento ambientalista para evitar uma competição à esquerda. Basta este detalhe: desde que foi criado, em 1982, o Partido Ecologista “Os Verdes” nunca concorreu a eleições sozinho; concorreu sempre em coligação com o PCP. Usando esta sua velha táctica de telecomandar movimentos potencialmente ameaçadores, os comunistas secaram durante décadas qualquer forma organizada de promoção ambiental.
Com a esquerda controlada pelo PCP, sobraria a direita como terreno possível para um pensamento sensato sobre ecologia. No começo da democracia, a direita conservadora tinha um discurso ambiental estruturado e tinha uma figura de referência, Gonçalo Ribeiro Telles. O fundador do PPM e depois do Movimento Partido da Terra foi subsecretário de Estado do Ambiente em três governos provisórios e no primeiro governo socialista. No início dos anos 80, foi Ministro de Estado e da Qualidade de Vida no governo da AD liderado por Balsemão. Tem no currículo a criação da Reserva Agrícola Nacional, da Reserva Ecológica Nacional e dos Planos Regionais de Ordenamento do Território — além de muito, muito trabalho como arquiteto paisagista e divulgador de temas ambientais. Quando Gonçalo Ribeiro Telles fez 95 anos, Vasco Rosa lembrou no Observador a sua “frontal denúncia dos empórios do betão, da celulose e da energia”.
Mas, a pouco e pouco, o conservadorismo verde foi substituído pelo vácuo. O PSD chegou a cultivar a efervescência ecológica de Carlos Pimenta, mas depois exportou-o para Bruxelas. E, no CDS, Luís Nobre Guedes defendeu há uns anos que o ambiente era o lugar natural da direita, mas não deixou eco nem consistência (de tal forma que, quando foi ministra, Assunção Cristas tratou o ambiente como um dispensável apêndice da agricultura).
Estamos, portanto, assim: com a esquerda armadilhada e a direita desistente, o único partido que fala sobre o tema que mais preocupa os novos eleitores é o PAN. Isto quer dizer que não há um contraponto racional ao extremismo fantasista que trata a ecologia como uma religião laica. Se os partidos do sistema não querem perder uma geração inteira de eleitores, têm que ser rápidos a arranjar um discurso, uma atitude e um foco. O vazio não está a dar bons resultados.