Duas em cada seis pessoas não sabem o que é um NFT. E oito em cada dez pessoas talvez achem que a estatística anterior é completamente aleatória – e estão certas! – mas o ponto mantém-se.
Apesar de já não serem uma novidade para muitos, a pergunta que serve de título a este artigo continua a ser ouvida em quatro de cada nove jantares de amigos. (Ok, se calhar deixamos as estatísticas aleatórias por aqui.)
O primeiro obstáculo é logo o nome: non-fungible token ???? ????
Duas em cada três das palavras que compõem a sigla NFT não são de uso comum, o que não ajuda nadinha. (Juro que esta estatística já não é aleatória).
Vamos lá desconstruir o termo.
Non (não). Vá, esta é fácil.
Fungible (fungível). Uma coisa é fungível quando é substituível, quando não é única. Uma nota de 5 euros, por exemplo, é fungível. Se eu tiver uma e trocar por outra, o valor é exatamente o mesmo.
Já a Mona Lisa, ou o primeiro tweet do fundador do Twitter (que foi vendido como um NFT por quase 3 milhões de dólares), são exemplos de coisas não fungíveis. São únicas e insubstituíveis.
Token (bem, acho que não há uma boa tradução para este).
Há várias definições e discussões sobre o tema, pelo que vamos ter de simplificar ou não saímos daqui hoje. Um token, historicamente, é uma senha. Ou melhor: um sistema que gera senhas (códigos numéricos) usado, inicialmente, para aceder a serviços de e-banking. Tinha a particularidade de ser fornecido por um dispositivo físico, uma pen, que gerava uma senha aleatória a cada utilização. Desta forma, os utilizadores garantiam a segurança no acesso às suas contas.
Atualmente, todos nós usamos tokens de uma forma muito mais simples. O pin do nosso cartão SIM é um token, assim como aqueles códigos de confirmação que recebemos por e-mail quando nos esquecemos da password do Instagram e a queremos recuperar.
No âmbito da nossa conversa, um token tem um significado um bocadinho diferente.
Vamos assumir que um token é a representação digital de um bem ou ativo real. Esse ativo pode ser físico, como um objeto ou até um bem imóvel, como uma casa, ou pode ser digital, como uma música ou um vídeo.
Um token de um objeto, por exemplo, é uma confirmação digital da propriedade desse objeto, e o valor desse token depende do valor do objeto a que se refere.
Imaginem que as malas da Gucci tinham um Qrcode na etiqueta e ao ler esse Qrcode validávamos se a mala era verdadeira ou não. Agora imaginem que, além de validar se a mala era verdadeira, também podiam validar quem era o proprietário legitimo dessa mala.
É mais ou menos isso.
Uma particularidade essencial destes tokens é o facto de serem registados em blockchain, o que faz com que sejam públicos e inalteráveis.
Para simplificar, vamos assumir que blockchain é uma série de caixas fortes transparentes, de alta segurança e ligadas entre si. Dentro dessas caixas fortes estão registos de operações. Assim que o registo de uma operação entra na caixa forte, é impossível alterar.
Toda a gente consegue ver o que lá têm dentro mas ninguém consegue alterar o seu conteúdo.
Fechando a rubrica de dicionário, podemos concluir – de uma forma muito resumida – que um NFT é um certificado digital de propriedade com duas particularidades: toda a gente o pode ver e ninguém o pode alterar.
Eis um exemplo de um NFT:
(Uma das 3350 Weird Whales criadas por Benyamin Ahmed)
“Epá, isso podia ter sido feito pelo meu neto de 12 anos”
Bom, contra factos não há argumentos. A verdade é que esta série de NFT’s foi criada por um rapaz de inglês de 12 anos, que a vendeu por aproximadamente 290 000 libras (cerca de 350 000 euros).
Neste caso, o NFT não é apenas a imagem. É a imagem, sim, acompanhada de um certificado digital de propriedade de quem a comprou.
”Ok, já percebi o que são NFT’s mas isso não serve para nada!” (Esta frase é ouvida diariamente em cinco em cada… Vá, desculpem. Já parei).
No último ano o mercado de NFT’s cresceu mais de 18 000%. Tem a sua quota parte de especulação, claro. Mas os NFT’s estão a permitir que artistas de todo o mundo tenham acesso a uma nova forma de vender a sua arte.
Mike Winkelmann é um artista conhecido como Beeple. Até ao início do ano passado, Beeple nunca tinha vendido um print (impressão de uma das suas criações digitais) por mais de 100 dólares.
Em Março vendeu um NFT por 69 milhões de dólares num leilão, sendo o NFT mais caro até à data.
(Everydays: The First 5000 Days by Beeple)
Além do mercado da arte, os NFT’s estão a dar cartas no desporto, música, moda, gaming e muitas outras áreas.
Em Portugal, até a Santa Casa da Misericórdia lançou um Marketplace de NFT’s.
Estranho para uns e inevitável para outros, a realidade é que os NFT’s estão a ganhar terreno e não é pouco provável que em breve sejam usados para provar a identidade de quase tudo. Carros, relógios, livros ou até um par de ténis.
Vamos esperar para ver!
Pedro Líbano Monteiro tem 27 anos e é fundador da Musicasa, Fyre Agency e Importrust, entre outras empresas. Juntou-se aos Global Shapers em 2018.
O Observador associa-se aos Global Shapers Lisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa. O artigo representa, portanto, a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.