Nas últimas décadas, excetuando o período da troika, os Orçamentos de Estado em Portugal são sempre muito semelhantes. A despesa aumenta sempre acima da inflação e quase sempre acima do crescimento do PIB. Crescendo a despesa, crescem também os impostos, por meios cada vez mais dissimulados. Recentemente usou-se a não atualização dos escalões de IRS para fazer crescer o bolo. Antes, inventaram-se novas taxas e eliminaram-se benefícios e deduções. O objetivo, evidente mas nunca proclamado, é o de garantir que a insaciável máquina do Estado se mantém bem alimentada.

Todos os anos se anunciam novas despesas e novos benefícios. A necessidade de apresentar medidas que favoreçam alguns grupos de pressão e que alegrem sindicatos de voto é permanente. É esta necessidade que está na origem da política de medidinhas, tão apreciada pelo governo de António Costa.  Criar uma nova despesa é fácil. Acabar com ela é quase impossível. O anúncio da nova despesa é sempre muito aplaudido pelos beneficiários da medida, cuja alegria lubrifica a predisposição ao voto nas próximas eleições. O impacto fiscal é minimizado pela quase totalidade dos contribuintes que pagam a medida, porque dificilmente compreendem que é o custo somado de todas essas medidinhas que cria o monstro fiscal que aterroriza quem vive ou investe em Portugal.

O anúncio da medida é um momento de grande impacto propagandístico. O anúncio do corte é um momento de protestos, manifestações e greves, em alta pressão sobre o governo. Se algum governo tentar cortar uma qualquer linha de despesa, alguns anos depois da sua criação, será crucificado em horário nobre. Os afetados explicarão que é manifestamente inadmissível cortar o benefício, um direito adquirido, que a democracia está em perigo e que o mundo pode acabar. Os telejornais, dezenas de comentadores e até, se necessário, os juízes do Tribunal Constitucional corroborarão esse sentido de tremenda injustiça. O Presidente da República recomendará que se estudem alternativas. Afinal, o que são uns poucos tostões no meio de milhões?

Estará ainda na memória de muitos a complexidade que foi encerrar a Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, porque os responsáveis por uma comissão evidentemente temporária pretendiam eternizar-se nos cargos, metamorfoseando-se num novo organismo permanente, pago pelos contribuintes. Provavelmente teriam tido sucesso, se o governo de António Guterres não se tem perdido no pântano.

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Estes orçamentos, que nada mudam e que em cada ano, acrescentam despesa e complexidade, não servem para colocar Portugal no caminho do crescimento. Se servissem, Portugal não estaria há 20 anos a cair no ranking europeu, a caminho de se tornar no país mais pobre da UE. Manter a mesma lógica de sempre na construção dos orçamentos é garantir de que o país continuará estagnado, irrelevante e sem esperança.

Portugal tem neste momento uma das mais altas fiscalidades da Europa para níveis de rendimento equivalentes, um esforço fiscal asfixiante tanto para pessoas como para empresas. É o país em que as taxas marginais de imposto elevadas se aplicam a partir de rendimentos mais baixos e é o país que mais penaliza os lucros das grandes empresas. Portugal afasta não só os seus melhores quadros, como repele qualquer empresa que aspire a ter grandes resultados no futuro.

Para haver crescimento de salários consistente e relevante, é necessário investimento. Muito investimento. Os salários crescem pela pressão da procura no mercado de trabalho. As novas empresas estão dispostas a pagar mais para roubar os melhores quadros, as boas empresas querem crescer e manter os melhores funcionários. É num cenário de concorrência apertada no mercado de trabalho que as empresas premeiam os seus trabalhadores com aumentos de salários e melhores regalias. É assim que o nível de vida cresce em qualquer país.

Como é que se consegue que Portugal seja um destino apetecível para grandes investimentos internacionais, que as multinacionais possam considerar Portugal como uma possível sede europeia para as suas atividades, que o risco de investir em Portugal seja considerado reduzido? A resposta não é complexa. Os países que crescem têm uma fiscalidade simples, competitiva e consistente. Têm pouca burocracia, leis laborais flexíveis, e um ambiente económico business friendly. Os investidores acreditam que o cenário em que os investimentos são decididos não será alterado três meses após as próximas eleições.

Um crescimento económico sólido não se consegue estalando um dedo. É necessário ganhar a confiança dos investidores, e essa confiança só se adquire com um longo período de legislação equilibrada e consistente. É essencial ter estabilidade fiscal. Não se pode gerir uma política fiscal aos solavancos. Em 2013, o PS e o PSD acordaram numa redução gradual da taxa de IRC para 17%, um pacto entre os dois maiores partidos que foi feito para sinalizar investidores que mudanças de governo não implicavam alterações nesta regra. A primeira coisa que o PS fez quando chegou ao governo foi rasgar o acordo e aumentar a derrama estadual, transformando Portugal no país da União que mais castiga o lucro de grandes empresas, com uma taxa marginal máxima de 31,5%. Se alguém investiu naquele período entre a assinatura e o rasgar do acordo, sentiu-se justamente ludibriado. Na Irlanda, a taxa de IRC de 12,5% mantém-se inalterada desde 2003.

Sendo o crescimento resultado de períodos longos de estabilidade num ambiente jurídico, fiscal e económico adequado, o fluxo constante de medidas macroeconomicamente irrelevantes é um dos exercícios mais fúteis a que os políticos de dedicam. Acreditar que é possível voltar a crescer com níveis fiscais extorsionários e orçamentos baseados em medidinhas, só pode ser resultado de má-fé, incompreensão do mundo ou descrença empírica nas estatísticas internacionais.

Um dos melhores exemplos que demonstram a falta de entendimento de fenómenos básicos está nas interpretações que foram feitas depois do mini-orçamento da ex-primeira ministra britânica, Liz Truss. Evidentemente a economia não cresce nem desaba numa semana por alteração de medidas fiscais que tentam promover o investimento. Não se cresce através de aumento de investimentos nem numa semana, nem num mês, nem mesmo num ano. No entanto, foram muitos os comentadores que se apressaram a gritar em alto e bom som que as medidas fiscais não resultaram, quando o que falhou teve pouco a ver com impostos. Bem pelo contrário, o que Liz Truss fez foi prometer um aumento de despesa pública significativo, através de uma garantia de fixação do preço de energia aos britânicos por dois anos, o que resultaria num pesado aumento do défice e da dívida pública, que, segundo o Deutsche Bank, se estimava em 200 mil milhões de libras. A medida que mais foi falada na imprensa, o corte da taxa máxima de IRS de 45% para 40% para rendimentos superiores a 150.000 libras representava apenas 1% do custo que os mercados estimavam para o pacote energético. Para quem tem grande dificuldade em entender grande números, a dívida pública total portuguesa contraída ao longo de décadas de défices acumulados, é da mesma ordem de grandeza que os mercados estimavam para o pacote de Liz Truss em apenas dois anos.

O que pode fazer Portugal para regressar à senda do crescimento? Sinalizar um caminho, percorrê-lo sem piruetas nem hesitações e manter-se firme nos objetivos por muitos anos, sendo que esses objetivos terão de incluir, obrigatoriamente, uma descida gradual mas significativa de IRC, de modo que Portugal volte a ser competitivo, a eliminação de bloqueios e exceções nas leis fiscais e uma grande simplificação administrativa. Se Portugal pretende reter os seus melhores jovens talentos, precisa reduzir significativamente a progressividade fiscal que afeta essencialmente os principais quadros de empresas.

Será necessário que exista um mecanismo de garantia fiscal, de modo que quem esteja disposto a investir em Portugal minimize o risco político de uma inversão de caminho. Quem investe tem de receber uma garantia contratual da fiscalidade a que estará sujeito a longo prazo. A despesa pública terá de acompanhar a capacidade de gerar receita que será muito maior num cenário de crescimento económico relevante. Não podem voltar a acontecer loucuras insanas como a que foi feita à volta da TAP. É essencial fazer periodicamente orçamentos de base zero, que permitam identificar custos desnecessários, e ter a coragem de encerrar organismos em que o benefício seja claramente inferior aos seus custos. Existirão muitos, nestas condições.

Este caminho tem de começar a ser trilhado, sendo que Portugal ainda continua em contramão e não se vê grande possibilidade de inversão de marcha com este Partido Socialista. Resta saber se o PSD, quando voltar ao poder, terá coragem de dar os passos necessários. Possivelmente necessitará de ajuda. É a única esperança que nos resta.