O escândalo dos Panama Papers levanta, mais uma vez, a discussão sobre os limites do planeamento fiscal e os crimes fiscais.

Serão os offshores legítimos? Existe alguma justiça na tentativa de pagar menos impostos?

E existe justiça na forma como os impostos são pensados e cobrados?

O próprio conceito de justiça fiscal parece assumir várias formas quando nos confrontamos com estas questões.

Porém, há pontos que raramente entram em discussão pública. Deixando de lado a questão da legitimidade ou legalidade destes mecanismos, outros temas despertam curiosidade. Se as próprias operações de desvio de capitais para offshores são dispendiosas e de elevada complexidade, porque são tão procuradas por indivíduos e empresas? O que leva um contribuinte a gastar milhares de euros para pagar menos impostos no seu país? Serão os sistemas fiscais sustentáveis para os contribuintes?

É um facto que os países contendem por regimes fiscais competitivos, de forma a atrair investimento e capital. O escândalo dos LuxLeaks, que envolveu multinacionais, e que teve como foco o Luxemburgo foi mais uma forma de demonstrar como esta luta fiscal pode ser muito agressiva.

Depois do LuxLeaks a União Europeia decidiu apostar numa maior troca de informação e transparência entre os Estados Membro em operações fiscais além-fronteiras.

Ainda assim, existe uma margem de discricionariedade que permite aos países construir sistemas fiscais mais competitivos, apetecíveis e sexys para os investidores. Sistemas fiscais sustentáveis.

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Olhando para o caso concreto de Portugal verificamos que a fiscalidade tem sofrido reformas estruturais de cada vez que se verifica uma mudança de governo.

Estas alterações resultam numa enorme instabilidade para os contribuintes. A economia portuguesa torna-se pouco atrativa para o capital nacional e estrangeiro.

O anterior governo tentou levar a cabo um conjunto de reformas bastante inovadoras e arrojadas, que pareciam contar com algum apoio das restantes bancadas parlamentares e ajudou Portugal a entrar no mapa dos países fiscalmente inovadores. Essas reformas parecem ter sido agora preteridas por uma abordagem bastante diferente do que é, ou deve ser, a fiscalidade. Independentemente de ideologias ou pontos de vista, é inegável que este pingue-pongue de política fiscal é bastante nocivo para a imagem externa de Portugal.

Uma das medidas que poderia ser adoptada pela Administração Tributária passa pela figura dos tax rulings. Um tax ruling é um acordo entre a Administração Fiscal e um contribuinte com vista a fixar um entendimento por parte da Administração relativamente a uma questão fiscal.

Imaginemos que uma grande empresa equaciona estabelecer em Portugal uma operação. Essa operação irá gerar postos de trabalho. A Administração Tributária poderia fazer um acordo com esta empresa e fixar a taxa de Imposto sobre o Rendimento (IRC) em 21% (a taxa atualmente aplicável à generalidade dos contribuintes) durante cinco anos. Na verdade, a empresa não estaria a ser tratada favoravelmente em relação às demais. Simplesmente, saberia que por um período de tempo aquela seria a taxa de IRC a que iria estar sujeita. Esta estabilidade, a certeza de que um novo OE não lhe iria agravar o imposto, poderia fazer a diferença entre investir ou não investir em Portugal. Criar ou não postos de trabalho. Fazer ou não mexer a economia. Esta seria uma das possíveis utilidades que um sistema de rulings traria ao nosso país.

Como esta, outras medidas poderiam fazer de Portugal um sistema mais atrativo para capital estrangeiro e nacional. É possível fazer da fiscalidade um asset na recuperação económica a que todos almejamos, e ao mesmo tempo, lutar contra o planeamento fiscal abusivo, sem para isso precisar de instituir uma nova caça às bruxas.

Se os offshores se tornarem obsoletos, não precisam de ser combatidos.

Fiscalista