Muito se tem escrito e previsto sobre os efeitos económicos do Covid-19. Na generalidade, não valem o tempo que se gasta a lê-los. Sejam organizações internacionais, sejam empresas de consultoria ou bancos não velem a pena. Baseiam-se em modelos e, como todos os modelos, baseiam-se no passado que nada tem a ver com o que se passa neste momento.

O que vale a pena ler são as notícias das universidades e institutos sobre a pandemia, sobre o vírus. Só poderemos fazer alguma abordagem aos aspectos económicos quando os viroligistas souberem alguma coisa mais do que sabem neste momento. Até lá as previsões económicas são impossíveis.

Sem cair na tentação de fazer futurologia económica, vale a pensar sobre o assunto de forma qualitativa e percebermos porque não podemos ir muito longe de conjecturas e não podemos fazer previsões.

Desde logo esta crise económica é diferente por duas razões. Primeiro, foi abrupta e inesperada. Havia a percepção há mais de um ano que a economia europeia estava a entrar numa fase de desaceleração e a dúvida era saber se haveria uma recessão. Tudo levava a crer que era apenas uma desaceleração, embora houvesse preocupações sobre a Alemanha, do ponto de vista político e sobre a base industrial assente no sector automóvel.

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Esta crise foi abrupta como não houve outra e por factores exteriores aos agentes económicos, seja a procura dos consumidores, seja a economia internacional ou problemas novos nas empresas. Foi uma surpresa que apareceu num mês.

Segundo, esta crise é nova e nunca vista porque tem a ver com a quebra na procura e por uma quebra na oferta. A procura, por exemplo, no turismo foi numa semana. Foi uma quebra na procura de muitos serviços por causa do isolamento necessário, das companhias aéreas aos ginásios e cabeleireiros; foi também uma quebra na procura no imobiliário, no sector automóvel, da roupa para a nova estação…

Mas foi também do lado da oferta, pois há muitas empresas que deixaram de laborar. Desde logo e mais uma vez no sector dos serviços: dos hotéis aos cabeleireiros, passando por restaurantes e bares. Mas também muitas empresas no sector industrial, não podendo em muitos casos passar a tele-trabalho, tiveram de deixar de produzir.

É uma crise do lado da procura e do lado da oferta. Qual o impacto no crescimento? Depende da evolução da pandemia, como procurarei mostrar, e que os virologistas também não sabem. Façamos dois cenários extremos para a evolução da pandemia.

Num primeiro cenário, depois de um pico muito acentuado, a pandemia acaba em junho. E o vírus morre com os bafos da canícula para não mais voltar. Tal como aconteceu com o SARS de 2003.

Neste cenário, a vastíssima maioria das empresas sobrevive, os apoios estatais funcionam, o impacto no emprego será sério, mas não devastador. Logo que o vírus desapareça a capacidade instalada está lá para começar a laborar. Quanto ao lado da procura, uma vez que o vírus credivelmente desapareceu, os consumidores estarão desejosos de fazer consumir o que não fizeram durante três meses. Acumularam necessidades não satisfeitas, pouparam sem querer, o impacto no emprego é transitório. A procura aumenta significativamente e os barbeiros vão fazer horas extra.

Neste cenário da pandemia, a crise económica será profunda, mas de curta duração. Um ano depois ninguém dará por nada.

Num cenário da pandemia no outro extremo: o vírus não morre no verão e volta em força no outono. Nesta circunstância, a quarentena regressa igualmente em força e teremos um outono e inverno parecido com este março. Ou seja, quase tudo fechado e as pessoas em casa.

Os efeitos económicos seriam devastadores. Não seria simplesmente duplicar a dose. Nessa altura, uma parte muito significativa das empresas fecharia, não seria possível uma intervenção governamental suficiente nem capaz, o desemprego dispararia para níveis nunca vistos. Teríamos saudades da crise socrática e da troika. Facilmente se somariam outras crises, nomeadamente a bancária e a de finanças públicas.

Não só a oferta não retomaria quando chegasse a vacina lá para a Primavera de 2021, nem a procura dispararia porque o empobrecimento seria geral e os níveis de desemprego aterradores.

Com estes dois cenários extremos vemos como é impossível, neste momento, fazer previsões económicas para este ano ou para o próximo. Primeiro os cientistas terão de nos dizer o que vai acontecer ao vírus, depois podemos tentar fazer umas contas. Desde logo, é preciso saber quando vamos ter uma vacina e se uma pessoa curada do vírus fica imune para sempre. Mas esqueçam os modelos económicos, nesta altura não servem para nada. Desta vez é mesmo diferente.