A semana passada ficámos a conhecer o Programa de Estabilidade que o Governo entregou em Bruxelas. E “conhecemos” também os acordos assinados entre PSD e Governo no âmbito da Descentralização e dos Fundos Europeus. Estes dois momentos têm um significado político estrutural e uma enorme relevância para o País. Mas o que significam realmente?

Em relação ao Programa de Estabilidade a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) afirma que “não está prevista nenhuma medida de consolidação orçamental de caráter permanente de dimensão significativa para os próximos anos”. Ou seja, o Governo limitou-se a colocar o País a viver exclusivamente à conta da redução da despesa com juros.

Política e socialmente, este posicionamento significa que António Costa optou pela inércia contribuindo para a promoção de um País instalado e a viver à conta. E os sinais dos últimos meses parecem indicar que o Dr. Rio está em total sintonia com este posicionamento.

Quanto aos acordos assinados, o que contém realmente? Além de servirem os próprios (António Costa e Rui Rio), alguém percebeu o que motivou toda aquela encenação?

Em relação à Descentralização o que mereceu mais relevo foi o anúncio do anúncio da criação de um grupo independente para uma 2ª fase da Descentralização. Mas o que contém então esta 1ª fase?!

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Se o “País ficou a ganhar” não deveria o País saber que melhorias, que valor acrescentado a união do PSD e do Governo trouxe ao poder local? E quais são as medidas concretas que o PSD conseguiu “impor” ao Governo e vice-versa?

Li as 4 páginas do acordo da Descentralização e a conclusão a que chego é que o que ali está não é uma Descentralização mas sim uma Municipalização. Talvez por isso não se encontrem naquelas 4 páginas nada socialmente relevante que mereça ser escalpelizado além da imagem de Rio e Costa unidos.

Quanto aos Fundos Europeus o acordo tem mais 20 páginas do que o da Descentralização. São 24 páginas de generalidades que afirmam a defesa de “uma União Europeia inclusiva, uma União Europeia Inteligente e uma União Europeia Sustentável.”

Li as 4+24 páginas e não percebo o que cada um dos lados inscreveu nos acordos nem o que cada um teve que ceder. Talvez as generalidades ali descritas causem aos autores alguma vergonha alheia e dai darem apenas relevância à imagem da união.

Como me dizia um amigo, negociar um conjunto vazio só requer habilidade a quem só é habilidoso…
Por isso retomo as perguntas: o que motivou toda aquela encenação? Para que servem estes acordos? O que ganhou o País? O que ganhou o País com a imagem de Rui Rio ao lado de António Costa?

Estou convencido que se as respostas a estas questões tivessem sido a prioridade daquele encontro seguramente hoje a leitura de que o PSD se está a tornar irrelevante não estaria a ganhar espaço na opinião pública e publicada.

Mas arrisco uma leitura para que tudo isto tenha acontecido desta forma.

António Costa quer surgir, aos olhos dos portugueses, como o grande agregador moderado da política nacional. Rui Rio quer parecer, aos olhos de António Costa, o seu novo pequeno parceiro que apenas quer uns lugarzinhos na próxima governação. O BE e o PCP estão prisioneiros da solução engendrada por António Costa. Vão esperneando mas no final do dia estão presos à situação atual.

Do PSD esperar-se-ia outra ambição!

Infelizmente, o PSD optou por pactuar e alimentar este Programa Situacionista. Parece que o medo de perder, ou a estratégia programada para a derrota, não permite ao partido a coragem de afirmar um caminho alternativo para o País.

O PSD parece ter escolhido o caminho do medo e ter abdicado de ser alternativa.

O Dr. Rio parece ambicionar apenas fazer parte da situação política vigente. E essa formalização poderá acontecer, imaginará ele, no momento em que tomar posse como vice-primeiro-ministro de António Costa. E para seguir este caminho o PSD terá realmente que continuar a promover o situacionismo.

Há três exemplos que me levam a esta leitura: os acordos assinados; os aumentos salariais na função pública; o fim dos cortes nos gabinetes políticos.

Sobre os acordos assinados a obsessão passou por mostrar Rio ao lado de Costa. Mas os acordos não são inéditos. Com Marques Mendes foi assinado o pacto da justiça com José Sócrates. Com Pedro Passos Coelho foram negociados os fundos europeus com o António José Seguro, negociada a criação da CRESAP e debatida a reforma de descentralização com este Governo (que estava praticamente fechada). Já para não falar das várias tentativas do PSD, liderado por Pedro Passos Coelho, em chegar a acordo com António Costa sobre a Segurança Social ou a reforma do Estado, negociações estas sempre recusadas pelo atual Primeiro-Ministro.

É verdade que tais acordos não privilegiaram a encenação, mas eles existiram e com informação clara sobre quais os pontos concretos inscritos pelo PSD. Desta vez temos mais imagem, mas pouco sabemos do valor acrescentado do PSD nestes acordos.

O que começa a materializar-se é que, em apenas dois meses de liderança do Dr. Rio, o PSD permitiu ao PS construir a percepção de que não há alternativa ao PS.

O PSD sempre foi favorável e promotor de acordos alargados. Sempre a bem do País! Mas teve sempre a capacidade de vincar as diferenças e de apresentar aos portugueses um caminho alternativo ao caminho socialista.

Sobre o aumento dos funcionários públicos verificamos o mesmo. A total inércia do PSD em apresentar uma alternativa. Depois da encenação que o Governo construiu, e em que todos os partidos embarcaram (o CDS em menor escala), os aumentos salariais para a função pública, em ano de eleições legislativas, estão garantidos.

O Governo construiu o enredo: mostrou-se inicialmente muito responsável recusando aumentos, a seguir os partidos de esquerda e os de centro direita exigiram aumentos, agora o Ministro das Finanças diz que é possível. Daqui a dois anos, se algo correr mal, António Costa pode afirmar que houve um consenso alargado para este aumento salarial!

Se não se tivesse deixado manipular, e se não estivesse sobretudo interessado neste Programa Situacionista que está hoje implementado no País, o PSD estaria em posição de apresentar um compromisso sério e estável, a médio prazo, com os funcionários públicos, em vez de medidas ao sabor de eleições! E estaria em posição de alargar este compromisso ao sector privado que continuará a ter que arcar com uma carga fiscal nunca vista em Portugal.

Acentua-se uma sociedade desigual. O único racional é eleitoralista.

Pois os partidos continuam a ter a leitura que é com os funcionários públicos que se ganham eleições. Tudo isto com a bênção do PSD.

Em 2010 Pedro Passos Coelho impôs a José Sócrates, entre outras medidas, o corte nos vencimentos dos políticos. Foi uma das medidas impostas pelo então líder do PSD ao Primeiro-Ministro socialista que avançou com um grande plano de austeridade em Portugal.
Hoje vemos o Dr. Rio unido na defesa de António Costa quando este propõe o fim dos cortes nos gabinetes políticos. E justifica afirmando que tendo o Governo acabado com todos os cortes estes também devem ter o seu fim. Com esta posição o Dr. Rio não só participa uma vez mais na encenação socialista do fim da austeridade como desvaloriza todos os cortes que o atual Governo tem imposto nos serviços públicos, nomeadamente na Saúde.

Será que iremos ver o Dr. Rio mais uma vez unido com António Costa caso este venha a apresentar uma proposta para acabar com os cortes nos vencimentos dos políticos?!

Ser mais do que um pequeno País à beira mar plantado está ao alcance de Portugal. Infelizmente, o contexto político atual não nos permite acreditar que seja alcançável no curto prazo. Deixámos de ter no espaço político e social a ambição de tornar Portugal n’O País de referência europeu. As atuais chefias partidárias desistiram de continuar a transformar Portugal.

Há pouco mais de dois anos discutíamos a ambição do País que queríamos ser, hoje, infelizmente, falamos de um País instalado.

Consultor de Comunicação