O Dr. Pedro Nuno Santos, no discurso de entronização no partido, afirmou que pretende ter o salário mínimo em “pelo menos os 1.000 euros” no final da legislatura, em 2028. Há poucos meses o Professor Valadares Tavares e eu publicámos um livro intitulado “Portugal: porquê o país do salário abaixo de mil euros?” (D. Quixote, agosto de 2023). O paralelo é demasiado evidente para poder ser ignorado. Será possível, em poucos anos, que aquele que era em 2023 o nível de salário mediano passe a valor da remuneração mínima?

À primeira vista o anúncio nada tem de especial. O número implica uma taxa de crescimento anual de 5,1% no indicador durante a legislatura, que até seria inferior à verificada de 2016 até hoje, que foi de 5,6%. Mesmo em termos reais, considerando as previsões de inflação do FMI, o crescimento anual será de 2,9%, pouco acima dos 2,5% dos últimos oito anos. A conclusão é que, seguindo a trajetória recente, o objetivo será alcançado sem dificuldades.

O problema é saber se será boa ideia continuar essa trajetória. De facto, o novo líder do PS nada disse acerca das medidas que pretende tomar para realizar esse desiderato. Subir o salário mínimo é muito fácil: basta escrever um número num Decreto-Lei. A medida nem sequer implica subidas na despesa pública, pois quem paga os aumentos são as empresas. Sendo assim, porque não prometer 1200 ou 1500 euros? A pergunta revela a falácia implícita.

A verdade é que os políticos falam muito de salários, mas realmente têm pouco a ver com eles, que são o preço do trabalho, determinado no mercado. É o crescimento da economia, em particular da produtividade laboral, que permite aumentar salários. E aí as coisas têm sido muito diferentes. Se o salário mínimo aumentou 43.4% acumulados de 2016 a 2023, segundo a União Europeia o produto por trabalhador em Portugal no período subiu 20% em euros e 17% em paridades de poder de compra. Este desfasamento de mais do dobro corresponde à média do país; não existem indicadores para o crescimento da produtividade dos trabalhadores menos qualificados, aqueles que realmente recebem o salário mínimo, mas tudo leva a querer que a sua prestação tenha aumentado muito menos.

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O que isto significa é algo decisivo, e que tem sido sucessivamente referido pelos especialistas nacionais e internacionais: a política de salário mínimo em Portugal, como aliás outros aspetos da política laboral, pouco ou nada tem a ver com a realidade económica. Parece obedecer mais a lógicas de retórica e propaganda que aos interesses dos trabalhadores. Pretende-se ganhar debates e eleições, não orientar a atividade da economia e a vida das pessoas.

Implícita na abordagem está a hipótese que as condições de trabalho só não são melhores porque os patrões exploradores não deixam. Sendo assim, quando a lei força a subida do salário ou concede outras regalias, isso acontece sem problemas ou quaisquer custos para as pessoas e para sociedade. A realidade, como mostra a evolução disfuncional do nosso mercado laboral nas últimas décadas, é bastante diferente.

O elemento decisivo é que estas políticas, na sua ilusão, conseguem realmente o oposto daquilo que dizem pretender. Por isso é que os parceiros europeus, sem as nossas “medidas amigas dos trabalhadores” têm muito melhores condições para eles. Somos uma realidade aberrante no quadro europeu, e quem sofre as consequências disso são os empregados, com especial impacto nos mais pobres.

Desemprego, salários baixos, precariedade, desigualdade, taxa de pobreza e até a baixa qualidade média das nossas empresas e da nossa dinâmica económica são tristes efeitos de sucessivas regulamentações ingénuas e mesmo abstrusas. Entre as causas do nosso atraso relativo, o quadro regulamentar do mercado de trabalho é das mais influentes.

Tudo isto é bem conhecido e tem sido repetidamente analisado. O que é novo é a promessa que, pelo menos com o economista Pedro Nuno Santos no poder, se vai continuar nesse caminho. A manutenção, porém, não é neutra. Num mundo crescentemente mais complexo, em que os nossos parceiros enveredam por novas tecnologias e competem em mercados mais sofisticados, os candidatos ao poder lusitano continuam alheios a essa dinâmica e mantêm lógicas e argumentos frentistas de gerações anteriores. Podemos assim assegurar que, pelo menos até 2028, as condições dos trabalhadores não vão melhorar.