Nesta campanha eleitoral, há propostas para todos os gostos e para todos os bolsos. Tipicamente os pequenos ou médios partidos mais à direita propõem medidas de descida de impostos, e os mais à esquerda aumentos de despesa pública. Nenhum desses partidos faz conta aos impactos dessas medidas quer do ponto de vista orçamental quer macroeconómico. É um pouco naquela base do … depois logo se vê.
É um problema endémico da nossa democracia, considerar-se que são irrelevantes os impactos orçamentais, sociais, económicos e ambientais das políticas públicas. O que interessa é apresentar várias medidas que sejam apelativas a vários segmentos do eleitorado.
Uma quase excepção a esta regra são os dois grandes partidos: PS e PSD. No caso do PS, não há nenhum cenário orçamental ou macroeconómico apresentado no programa eleitoral. É pena. Se quisermos ter alguma ideia das perspetivas do PS para a legislatura, temos de usar os dados do Ministério das Finanças do OE2022 (MF para 21 e 22) e de um documento de Abril 2021 – o Programa de Estabilidade – algo desactualizado, para os anos seguintes (MF* para 23 a 25). Iremos, até porque António Costa acenou com o OE2022, admitir que esses documentos espelham a política orçamental do PS até 2025. O PSD apresentou um cenário macroeconómico e orçamental que não resulta de nenhum modelo, mas que é, como se verá, apenas uma variante do cenário de políticas invariantes apresentado pelo Conselho de Finanças Públicas (CFP) e que vai apenas até 2025. Aquilo que a tabela em baixo mostra são as diferenças em pontos percentuais das várias rubricas em relação a esse cenário (CFP). Permite-nos também comparar diretamente PS e PSD e tirar algumas conclusões que decerto surpreenderão muitos eleitores. Todas as respostas se reportam a 2025 pois é o último ano onde existem previsões quer do CFP quer do MF. Várias questões se podem colocar face a estes dados.
O que antecipam os cenários orçamentais de PS e PSD para este ano de 2022?
No caso do PS, as diferenças com o cenário do CFP, mostram o efeito esperado das políticas inscritas no OE, a saber: um aumento do peso dos impostos sobre a produção e importação (incluindo o IVA) e uma diminuição do peso dos impostos sobre o rendimento (em particular o IRS). No que toca ao peso da despesa corrente primária, o CFP prevê uma redução significativa (3.1 p.p.) sobretudo devido à redução dos subsídios associados à pandemia, mas também nas prestações sociais e nas despesas de pessoal. O PS prevê também uma redução na despesa corrente primária, mas menor (2.8 p.p.) pois não reduz tanto nem o peso das despesas com pessoal nem das prestações sociais.
Já o cenário do PSD é intrigante pois, sendo exactamente igual ao do CFP, de políticas invariantes, sugere que o PSD se ganhar as eleições, não toma nenhumas medidas discricionárias este ano. Estranho…
Quem prevê que haja maior peso do Estado na economia em 2025, o PS ou o PSD?
O melhor indicador para responder a esta questão é o peso da despesa efetiva no PIB.
É o PSD que prevê um peso maior face ao PS (respetivamente 43,4% face a 43%)
Quem prevê que haja maior redução do peso do Estado na economia entre 2021 e 2025?
Mesmo usando o indicador para o PS em que a variação é menor (a série completa do PE21-25 e não a série com duas fontes aqui utilizada e que daria uma variação maior), ainda assim é o PS que prevê uma ligeira maior redução do peso do Estado do que o PSD (respetivamente variação de 5,1 p.p. face a 4,9 p.p.).
Quem prevê que haja maior carga fiscal (impostos mais contribuições sociais) na economia em 2025, PS ou PSD?
É o PSD. O CFP prevê, com a manutenção das taxas de imposto e de contribuições sociais, que a carga fiscal se situe nos 35,8% do PIB nesse ano. Ora o PSD prevê, com as políticas entretanto adoptadas, que ela se situe apenas cerca de 0.1 pp abaixo. Em contrapartida o Ministério das Finanças (o “PS”) previa um peso da carga fiscal bem menor (cerca de 0,8 p.p. abaixo das previsões do CFP).
Quem prevê que haja maior redução do peso dos impostos no PIB entre 2021 e 2025?
Para o PSD as contas são simples de fazer pois usa-se apenas uma fonte: reduz-se apenas 0,4 p.p. Para o PS depende dos dados considerados. Se usarmos apenas a série consistente do Programa de Estabilidade esta prevê uma redução de 0,5 p.p., ou seja, semelhante à do PSD.
Olhando para a despesa pública, onde são as principais diferenças de previsões para 2025?
Não é nem nos gastos com pessoal, nem nos consumos intermédios nem nas prestações sociais onde os valores são semelhantes. É sobretudo nos subsídios, em que o PS pretende gastar menos, e nos investimentos em que conta despender mais que o PSD:
Finalmente, olhando para a trajetória dos défices orçamentais, do rácio da dívida no PIB, e do crescimento económico há grandes diferenças?
O PSD assume os mesmos valores que o CFP para 2021 e 2022. O PS é mais pessimista no saldo orçamental em 2022, mas mais optimista em relação à capacidade de redução do peso da dívida nos próximos anos do que o CFP. A nosso ver o MF/PS é demasiado optimista nesta variável. O PSD por um lado assume a mesma evolução do rácio da dívida no PIB de 2021 a 2025 que o CFP. Em relação à trajetória dos saldos em 2024 e 2025 tem objetivos semelhantes ao PS.
Muita coisa se poderia concluir destes números, mas vamos reter algumas ideias. Por paradoxal que possa parecer, olhando para 2025, o PSD de Rio (previsões de Janeiro 2022), é até ligeiramente mais estatista que o PS de Costa (previsões de Abril 2021), antecipa maior carga fiscal, e menor redução do peso do Estado. São, porém, pequenas diferenças. Ao nível das grandes variáveis a estratégia orçamental não difere muito, apesar de ao nível das pequenas políticas haja diferenças substantivas. Não duvido que se BE e PCP, por um lado, e IL e CDS por outro apresentassem a suas estratégias orçamentais (o que infelizmente não fazem), elas seriam muito mais diferentes das do PS e PSD respetivamente.
Não é este o espaço para discutir a razoabilidade destas estratégias. Porém, isso significa que, na ausência de uma maioria absoluta, os moderados Costa e Rio têm um muito maior terreno para entendimento do que poderia parecer à primeira vista. Não haverá uma segunda oportunidade reformadora do país, pois os mais radicais sucessores de ambos, no PS e no PSD, nem sequer terão vontade de dialogar entre si. Para que algum sucessor não entre já, é necessário que o PS ganhe, mas sem maioria absoluta, e o PSD tenha uma boa votação. Os portugueses o decidirão no próximo domingo.
Tabela: Diferenças dos cenários orçamentais de PS (Finanças) e PSD relativamente ao C. F. Públicas.