Rita Marques foi, durante o final de Outubro de 2019 até Março de 2022, secretária de Estado Turismo na dependência direta do Ministério da Economia.

Por alegadas incompatibilidades com o ministro da tutela, Rita Marques é demitida e a pasta é entregue a Nuno Fazenda.

No entanto, e durante o seu mandato governativo, Rita Marques assina o Despacho n.º 2078/2022, a 17 de fevereiro, que atribui a utilidade turística definitiva ao World of Wine, que “visa transformar a zona histórica de Vila Nova de Gaia com um quarteirão cultural de sete museus, doze restaurantes e bares, uma escola de vinho e várias lojas”.

A atribuição de utilidade turística, diga-se, com isenção de impostos, é dinheiro que não entra nos cofres do estado.

O tema não retrata a ilegalidade ou não dos termos do despacho assinado por Rita Marques na qualidade de governante. É mais grave que isso. É de uma clara e verdadeira ilegalidade o que vem a seguir.

Tão clara que a Lei n.º 52/2019, que regula o regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, é das poucas leis que na verdade não deixam qualquer dúvida na sua interpretação.

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Encontramos assim, e logo no início da leitura do diploma para não dar muito trabalho na busca, o artigo 10 nº. 1 que versa:

Os titulares de cargos políticos de natureza executiva não podem exercer, pelo período de três anos contado a partir da data da cessação do respetivo mandato, funções em empresas privadas que prossigam atividades no setor por eles diretamente tutelado e que, no período daquele mandato, tenham sido objeto de operações de privatização, tenham beneficiado de incentivos financeiros ou de sistemas de incentivos e benefícios fiscais de natureza contratual, ou relativamente às quais se tenha verificado uma intervenção direta do titular de cargo político.”

A questão, que ultrapassa mais uma vez a ética, é fácil de analisar.

A senhora ex-secretária de Estado do Turismo despachou, na sua qualidade de governante e de forma favorável, a isenção de impostos a uma empresa privada que, por mera curiosidade, agora é a sua entidade patronal.

Ou seja, serviu-se claramente da sua posição política para “comprar” um novo emprego.

O que seria de facto importante de apurar é se à data do despacho (17 de Fevereiro de 2022), que permite a concessão de benefícios fiscais, tão próxima que foi que da sua demissão (Março de 2022), já haveria intenção da senhora ex-secretária de Estado do Turismo de servir a empresa beneficiária de regalias fiscais.

Repito, não está em questão a legalidade do despacho, mas sim a actuação de Rita Marques.

Ora este é mais um caso recheado, na minha modesta e singela opinião, de graves coincidências com contornos de um esquema que deve ser investigado até às últimas consequências.

De facto, e dando como verídicos os factos que agora conhecemos, que são públicos e que por agora não foram desmentidos, então há verdadeiramente um aproveitamento de uma posição política para fins pessoais.

Tudo isto é, no limite, bastante bizarro.

Podem dar as voltas ao mundo que quiserem mas há um aspecto inegável na questão: a ilegalidade já demonstrada, onde a clareza da lei, que até é de estranhar, corrobora a tese de que não pode Rita Marques exercer quaisquer funções privadas no grupo The Fladgate Partnership.

Em Portugal não pode valer tudo. Este caso não é só um caso de falta de ética e simultaneamente de uma simples ilegalidade, como quem infringe um sinal de trânsito.

Por detrás de tudo há algo que cheira a esturro pela aproximação de datas entre os factos ocorridos: a data do despacho e a da sua demissão.

Em Portugal, já se viu muita coisa, e isto parece mesmo ser mais uma grande aldrabice.