É outono. Tempo das folhas douradas e dos dias a encurtar. Dilui-se a euforia do verão. Da preferência por uma vida passada no exterior, passa a ser mais confortável estar no recolhimento dos espaços interiores. E, pensemos no interior das casas como uma extensão do que é estar no recolhimento da vida íntima. Com menos actividade lúdica fora de portas, uma vida mais caseira, dá lugar a mais introspecção.

Há quem viva com nostalgia o fim do verão e antecipe um estado de tristeza dos dias mais cinzentos, chuvosos e escuros. As depressões de outono são conhecidas como depressão sazonal e muito associadas à alteração do clima, e consequentemente, do círculo circadiano.  Mas também há outros, que preferem a estação da antecipação do inverno, do tempo da hibernação.

Uma experiência pode ser vista e vivida por vários ângulos e integradas visões opostas; mais escuro, mais repouso, mais chuva, certa nostalgia versus mais conforto íntimo e familiar.

Para quem se sente atingido pela penumbra dos dias curtos, como contrariar os sintomas de tristeza, falta de energia, sonolência, dormência emocional?

Primeiro, há que reconhecer que se sucumbiu a um certo estado letárgico para poder agir no sentido de o ultrapassar. Não é necessário exponenciar a apatia de dias menos eufóricos. Optar por ter uma perspectiva sob os benefícios do recolhimento pode apaziguar as almas mais inquietas e esfusiantes.

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Na história da mitologia, o outono é a época sem colheitas devido à fúria de Deméter, que torna as terras inférteis por a sua filha Perséfone ter sido engolida pelo submundo de Hades. Perséfone tornou-se  a mulher de Hades após ter ingerido umas quantas sementes de romã. Por isso, ficou ligada aos infernos onde passa a viver metade do ano, outono e inverno, com o marido, e só na primavera e verão, vive perto da mãe, altura que Deméter apaziguada por ter a filha perto, permite o nascimento dos frutos e a abundância de colheitas.

Este mito etiológico das estações do ano diferencia a época da fertilidade e das colheitas versus a época da morte e pousio das terras. Por tal, também se percebe o antónimo luz/escuridão.

Se a reacção imediata ao mundo de Hades é uma espécie de repulsa, associada à ideia da escuridão do submundo, e um sentimento de terror perante as representações do mesmo, é verdade que é da escuridão da terra que brotam os bolbos que irão florescer na primavera.

No dito submundo, que podemos comparar ao subconsciente e inconsciente, estão guardados os sentimentos mais profundos. Ora, nesta época outonal e invernosa pode ser uma oportunidade de contacto com o que está mais escondido nos confins da nossa interioridade e daí também poderem brotar ideias mais criativas e construtivas para mudanças mais positivas em tomadas de decisões nas nossas vidas.

anaeduardoribeiro@sapo.pt