No presente artigo apresentamos os fundamentos para uma nova resposta na supervisão dos convívios familiares em contextos reais de vida, em situações de divórcio conflituoso e alienação parental ou que envolvam algum tipo de risco ou suspeita de risco para os filhos, desenvolvida a partir da experiência com vários casos de crianças vitimizadas por essa circunstância.

Os convívios supervisionados entre pais e filhos podem realizar-se através dos Pontos de Encontro Familiar (PEF) que, segundo a legislação portuguesa, “são um espaço neutro e idóneo que visa a manutenção ou o restabelecimento de vínculos familiares nos casos de interrupção ou perturbação grave da convivência familiar, designadamente em situação de conflito parental e de separação conjugal. Os PEF, na sua atuação, devem: proporcionar encontros familiares em condições adequadas de segurança e bem-estar para as crianças ou jovens, designadamente no que respeita ao exercício das responsabilidades parentais em situações de divórcio ou separação de pessoas; e promover e facilitar um clima de consenso e responsabilidade, através de um trabalho psicopedagógico e social, conducente a uma mínima intervenção judicial (Portaria nº 139/2013, de 02 de Abril – Anexo A)” (cit., Diário da República, 1.ª série — N.º 64 — 2 de abril de 2013).

As supervisões de convívios são decretados por via judicial, quando existe algum tipo de risco ou suspeita de risco para com os filhos, tais como a possibilidade de rapto por um dos pais, situações de abuso, violência física ou emocional, ou inexistência de responsabilidade e competência para desenvolver positivamente o exercício da parentalidade, entre outras situações.

Apesar de a supervisão de convívios ser tida como uma solução transitória, a nossa experiência mostra-nos que, muitos pais e mães, vêem, durante muitos anos, a sua relação com os filhos cingida a convívios de uma hora, uma vez por semana, realizados numa sala fechada de poucos metros quadrados.

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O espaço físico onde existem os convívios supervisionados entre pais e filhos são espaços com o objetivo de re(construir) afetos, vínculos e relações. Por isso, é um espaço que, se não for agradável e acolhedor para construção da relação e convívio familiar, pode tornar-se um espaço adverso e opressor, afetando negativamente a construção das interações saudáveis entre pais e filhos. Observámos já que muitas salas onde decorrem os convívios supervisionados são espaços descaraterizados e despersonalizados, por exemplo, desadequados à faixa etária das crianças. Frequentemente, são salas pequenas, com pouca luz, com falta de conforto, pouco humanizadas, percecionadas como pouco confortáveis e pouco afetuosas. São, por isso, ambientes pouco saudáveis para a construção de relações entre pais e filhos, podendo mesmo predispor para fomentar atritos e conflitos interpessoais.

Os convívios com supervisão presencial de técnicos deveriam, numa primeira fase, ser realizados, com a presença do técnico, mas no exterior, em meio natural, onde é possível observar uma evolução positiva mais rápida na relação de confiança entre pais e filhos. Numa segunda fase, estes convívios deveriam ter o suporte da supervisão apenas no início e no fim e, numa terceira fase, ser realizados sem supervisão presencial do técnico, que reuniria, periodicamente, com ambos os pais, para avaliar a qualidade dos convívios.

Uma opção mais vantajosa para os convívios presencialmente supervisionados em ambiente natural de vida, seria que a supervisão fosse realizada com o suporte de alguém da confiança do pai/mãe, uma pessoa idónea escolhida pelo tribunal, como por exemplo, uma avó, a quem se reconhece ter a capacidade de promover convívios gratificantes, em vez de pelo técnico. Desta forma, fomentar-se-ia a construção de uma relação consistente, ao longo do tempo, para a adaptação e desenvolvimento harmonioso de vínculos afetivos estáveis e duradouros entre os pais e os filhos. Idealmente esta supervisão deveria contar com o suporte de uma intervenção psicoterapêutica, realizada a partir de uma avaliação contextual alargada e rigorosa destes convívios, para permitir uma melhor compreensão da situação e prevenir a exclusão dos pais da vida destas crianças. Tratar-se-ia de uma intervenção para apaziguar o conflito e as tensões, apurando a dinâmica parental na díade pais-filhos, por forma a percecionar a capacidade do pai/mãe para o exercício responsável, funcional e altruísta da parentalidade e das relações de vinculação afetiva.

No modelo de intervenção a adotar recorrer-se-ia à realização de observação a partir de entrevistas, em regime individual com os pais e com os filhos, ou em conjunto, e à observação das interações familiares entre pais e filhos, em vários contextos (e.g., em casa, passeio, ou durante outras rotinas diárias), de forma a conhecer a realidade da vida familiar. Esta observação naturalista, realizada in loco, permitiria compreender o contexto e as necessidades da família como um todo, nomeadamente percebendo a dinâmica familiar vivenciada e realizar o adequado acompanhamento e aconselhamento parental em todos os contextos da vida quotidiana dos filhos, assegurando também o envolvimento dos interlocutores do quotidiano dos filhos – e.g., avós, tias/tios, primos, professores, catequistas, família alargada, amigos, vizinhos, etc., para que, em conjunto com eles, se definissem estratégias conjuntas de intervenção, adequando-as às situações.

Uma visão ecológica do desenvolvimento humano mostra-nos que os comportamentos e as atitudes não acontecem num vazio contextual, pelo que os convívios supervisionados deviam acontecer em meio natural de vida, nos espaços familiares, em contextos do dia-a-dia da criança e dos pais, nomeadamente durante as suas atividades e as suas rotinas (momentos em que se fortalecem os vínculos familiares), em espaços de afetos, tranquilos, como  jardins em que filhos e pais podem brincar, jogar à bola, em cafés onde podem lanchar ou comer um gelado, em casa dos casa dos avós, ou em casa dos pais. Esta é uma forma de convívio que verificamos permitir realizar uma reconstrução mais consistente uma relação entre pai/mãe e filhos, para garantir a adaptação e desenvolvimento harmonioso de vínculos afetivos estáveis e duradoiros entre ambos.

Como nos referiu em tempos um pai, a decisão de ver os filhos com supervisão pode consistir em si mesmo um prolongamento de uma situação de alienação parental: “o Juiz (…), decide que os convívios da criança com o pai teriam que ter a supervisão do Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Familiar (CAFAP), mesmo sabendo que a progenitora tinha feito alienação parental e que a criança nunca apresentou qualquer indício de maus tratos pelo pai” (sic).

Muitas vezes, lidamos com casos em que pais e mães que foram afastados sem razões verdadeiras são castigados com visitas supervisionadas, tal como este em que o Acórdão do Tribunal, em relação à “Interdição de visitas. Reatamento do convívio”, refere que: “Constata-se, pois, que a ora recorrente esteve proibida de contactar os seus filhos desde há vários anos, sem que se tenha comprovado, até à data, que a mesma não tem condições para exercer a parentalidade (…) Existindo um longo período de afastamento entre o menor e a mãe, e que contribuiu para a quebra de laços de proximidade e de afecto entre ambos, importa que o reatamento do convívio dos dois seja concretizado com cautelas, gradualmente e com passos seguros, e de forma a que não seja hipotecado em definitivo a possibilidade de se estabelecerem laços de afecto entre a criança e a progenitora.(…)” (cit.).

Outras vezes, as instituições mantêm as relações entre pais e filhos durante muito tempo numa sala, mesmo quando a própria criança pede para ser noutro local, como refere este pai: “Apesar da criança pedir regularmente para ir à casa do pai, a progenitora só permite o convívio de uma hora por semana no CAFAP” (sic.).

É neste contexto, que surge a necessidade de repensar a prática no âmbito da intervenção social com as famílias divorciadas conflituosas, inovando metodologias e princípios de intervenção, que se constroem na complementaridade e transdisciplinaridade. A partir da nossa experiência, pudemos sentir que a sociedade desconhece as possibilidades de intervenção inovadoras dos técnicos (e.g., psicólogos, assistentes sociais) em contextos de vida real, valorizando apenas o seu papel e práticas mais tradicionais, realizadas em locais tradicionais, normalmente nos consultórios e instituições. Necessitamos que possa ser reconhecido o benefício da introdução de novas práticas de intervenção, com respostas inovadoras da supervisão dos convívios familiares em contextos reais de vida.