A Lei n.º 2/2011 exige a publicitação da lista de edifícios, instalações e equipamentos públicos com amianto. Existiu uma lista publicada em 2014 que esteve a público por pouco tempo e apresentava várias lacunas já explicada exaustivamente em artigos anteriores.
Um ano letivo de marchas, exigências e muito trabalho depois, quer da ZERO quer do MESA, uma lista acabou por ser publicada no início de julho deste ano, referente aos edifícios públicos com MCA (Materiais Contendo Amianto) dias depois de ter sido publicada uma lista referente apenas às escolas a 24 de junho.
A tão esperada lista (que seria a atualização da lista de 2014) foi publicada com lacunas que saltam à vista: i) não especifica quais os materiais contendo amianto em cada uma das situações; ii) não informa quais os responsáveis pela inventariação dos materiais, ou a metodologia utilizada; iii) não indica as datas de levantamento de cada edifício; iv) fala apenas nos imóveis (presumindo-se que as instalações e equipamentos foram deixados de parte).
Podemos confiar em qualquer uma destas listas? Tomando como exemplo o universo dos edifícios escolares as incongruências são preocupantes. Em 2014 estavam referenciadas 813 escolas, em 2017 (aquando da Resolução de Conselho de Ministros n.º 97/2017) seriam 1180, que passaram a cerca de 570 a 24 de junho de 2020 e foram reduzidas a menos de 490 na lista final de julho, publicada uns dias depois.
Continuando nos números será interessante referir que na lista de 2014 eram referidos 271 edifícios com MCA sob a tutela do Ministério da Saúde e em 2017 (após Resolução do Conselho de Ministros n.º 97/2017 ) apenas são mencionados 96. Segundo o Relatório do Progresso do Amianto de julho de 2019, até 2018 haviam sido feitas 58 intervenções, ficando com menos de 40 edifícios com MCA. Não é claro como se chega a estes números, no entanto, o espanto aumenta, quando na lista de julho de 2020 esse número (edifícios do Ministérios da Saúde) ascende aos 119.
Já os Ministérios da Defesa e da Justiça tiveram uma redução drástica na listagem dos seus imóveis que passaram de 1052 e 880 em 2017, respetivamente, para 213 e 33 em 2020, deduzindo-se que só nestes Ministérios se intervencionaram 1686 edifícios em pouco mais de 2 anos.
As contas parecem estranhas, mas a resposta é simples. Que levantamento está a ser feito, que empresas têm responsabilidade sobre o mesmo e quais os materiais que estão a ser avaliados? O processo é nebuloso, não é conduzido por entidades credíveis e independentes e vamos percebendo à medida que conferimos os dados divulgados nestes levantamentos que a falta de transparência neste processo não é aparente nem casual.
Surge ainda a pergunta, os edifícios sob a tutela dos Ministérios da Educação e da Justiça, que em 2014 apenas viram inventariado o fibrocimento foram agora alvo de revisão? Foi verificado nas escolas ou edifícios do Ministério da Justiça, onde apenas havia sido removido o fibrocimento, se existem outros MCA? E no levantamento que deu origem à presente lista, foram considerados outros materiais para além do fibrocimento?
Não. Segundo a lista de escolas publicada a 24 de junho deste ano, apenas se prevê a remoção de coberturas e telheiros em fibrocimento contendo amianto. Tendo em conta que este material foi aplicado em mais de 3000 produtos a partir dos anos 40 e até ao início do séc. XXI, existindo o mesmo em tantos exemplos de materiais de construção nas várias situações de edifícios públicos e outros, será de questionar o porquê da não inventariação de outros MCA para além do fibrocimento no caso das escolas. O que pretende o Governo afinal com esta iniciativa, retirar o amianto ou calar-nos apenas?
No setor privado a dúvida é ainda maior. Em 2018 publicou-se a Lei n.º 63/2018 que, à semelhança da Lei n.º 2/2011, obriga ao levantamento de todos os edifícios, instalações e equipamentos em empresas a compilar numa lista elaborada com a colaboração da ACT. Da lista não se sabe muito, as empresas parecem saber menos e por cada esquina deste terra encontramos uma instalação, edificado ou construção com MCA.
Sobre instalações ou equipamentos não parece ainda existir qualquer vontade em fazer o levantamento das redes de abastecimento de água com condutas em fibrocimento, que para além da existência de amianto crisótilo na sua composição contêm também uma pequena percentagem de amianto crocidolite, o chamado amianto azul, que dentro da temática do material cancerígeno é considerado o mais perigoso. Ainda que a OMS desconsidere a perigosidade na ingestão de fibras de amianto, assumimos que a substituição da canalização em fibrocimento, contendo amianto, será um dos objetivos neste caminho de descontaminação ambiental, de modo a que possamos viver sem amianto nas nossas vidas.
A resposta à Lei 63/2018 já está atrasada e a meta de erradicar o amianto da Europa até 2032 parece distante em Portugal porque não há um levantamento sério nesta matéria em terrítório nacional. A erradicação não parece ser a meta do governo, mas antes entreter-nos com listas, num processo cada vez mais confuso e impossível de conferir sem detalhes técnicos para que nos percamos todos em perguntas enquanto com pouco se vai fazendo nada.