A Petição Pela Remoção Total do Amianto nas Escolas Públicas surge após identificação de inúmeras escolas onde existiam ainda materiais alegadamente contendo amianto, como o fibrocimento, visível a olho nu, entre outros, enquadrados na lista de materiais que poderiam conter o material cancerígeno. Em apenas alguns dias, ZERO MESA e FENPROF conseguiram a recolha de milhares de assinaturas.

Já em 2019, a grande preocupação e os alertas da ZERO chamavam a atenção para a ineficaz inventariação dos materiais contaminados nas escolas, que se resumia ao fibrocimento. Após o início da ação de remoção dos Materiais Contendo Amianto (MCA) por parte do governo (louvável, a pesar de tudo) corremos o risco de não saber em que ponto estamos, já que este material nocivo pode encontrar-se em diversos outros materiais como revestimentos de pavimentos ou paredes, tintas, divisórias, entre tantos outros.

Nesse sentido, mantêm-se as preocupações de 2019:

“(…) sem uma correta avaliação prévia de todos os materiais que contêm amianto, as obras que já foram realizadas para a remoção deste material perigoso nos edifícios dos referidos ministérios podem ter deixado ficar outros materiais contendo amianto, eventualmente mais perigosos do que o fibrocimento.”

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Sobre o programa de remoção de amianto nas escolas públicas, que em boa hora ZERO e MESA aplaudiram, continuam por esclarecer as questões que nunca foram respondidas:

  1. Quais as empresas responsáveis pela inventariação dos MCA nas escolas?
  2. Quais os materiais que foram considerados na inventariação?
  3. O que aconteceu às escolas que tiveram uma fase de remoção de MCA e onde foi deixado um pavilhão ou uma estrutura para mais tarde?
  4. O que aconteceu às escolas identificadas na primeira lista de escolas com MCA cujas autarquias não se candidataram ao plano de remoção?

No seguimento do tema da identificação de MCA nas escolas, comparando os documentos oficiais refletidos no gráfico abaixo, há uma queda abrupta nos edifícios identificados no Ministério da Educação em apenas 1 ano. Entre o Relatório de 2019 e a Listagem de 2020, passando de 1180 edifícios para 578 escolas no Despacho n.º 6573-A/2020. Esta variação volta a surpreender-nos quando, no mesmo ano, na Listagem do primeiro semestre de 2020 o número desce para os 489 imóveis. Este valor ganha mais expressão uma vez que, por comparação, entre o primeiro semestre de 2020 e o segundo de 2022 são intervencionados 285 imóveis aproximadamente, após o Programa da Remoção do Amianto ter sido decretado.

Gráfico 1- Gráfico sobre os dados dos imóveis contendo amianto (a amarelo) e dos imóveis sob a tutela do Ministério da Educação contendo amianto (a azul), segundo publicação nos diplomas supra referidos – ZERO.

Persiste a dúvida sobre o que aconteceu aos 691 imóveis referidos em 2019 e que desapareceram até ao final do primeiro semestre de 2020.

Preocupam-nos as denúncias chegadas da prática de remoção de fibrocimento em tempo de aulas, em algumas escolas, pela perigosidade na exposição de toda a população escolar a este material cancerígeno. Relembramos as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) a este respeito (não existe valor abaixo do qual seja segura uma exposição ao amianto).  No programa de remoção do amianto, a colocação de uma data limite para remoção do fibrocimento nas escolas, originou uma corrida desenfreada na procura de empresas capacitadas para executar os trabalhos em apenas dois ou três verões de férias letivas. A necessidade de resolução deste programa em tão curto espaço de tempo foi o cenário propício a variadas situações que colocaram em risco importantes princípios de segurança.

O programa de remoção do amianto nas escolas públicas foi decretado, e bem, pelo governo (no Despacho n.º 6573-A/2020). Enquanto donos de obra, os municípios poderiam candidatar-se para obter acesso a fundos que permitiam os meios para essa remoção. Mantém-se ainda como necessário: i) a inventariação séria e rigorosa, por empresas reconhecidas para o efeito, de todos os materiais suscetíveis de conter amianto; ii) a publicação da listagem de edifícios, instalações e equipamentos públicos, objeto desse estudo, bem como a identificação das entidades responsáveis por essa inventariação; iii) garantir a segurança e a metodologia recomendadas na remoção de MCA em vez da sujeição a um prazo que comprometa a boa execução dos trabalhos; iv) por fim, fiscalização e acompanhamento de todo o programa através da publicação de relatórios claros e rigorosos sobre o que é feito, como, quem é responsável por e quais os estabelecimentos objeto dessas intervenções.

Parece assim haver um desfasamento entre o anúncio feito pelo Governo de que o amianto foi ou está a ser retirado das escolas e a realidade: i) afinal nem foi retirado o amianto, mas sim o fibrocimento; e ii) apenas das escolas públicas entre o Jardim de Infância e o 12º ano, deixando de fora mais de 3000 escolas, conforme havia já sido comunicado pela ZERO, MESA e FENPROF.

Passados 18 anos sobre a proibição do amianto em Portugal, 12 anos da publicação da lei sobre remoção de amianto em edifícios públicos, 6 anos sobre o primeiro grupo que atualiza o número de edifícios públicos contendo amianto, 5 anos da lei sobre remoção de amianto em empresas privadas, 3 anos sobre o programa da Remoção do Amianto nas Escolas, ainda se cometem os mesmos erros do início desta caminhada. Muito há por esclarecer num trabalho que carece de transparência e rigor. Tem passado de ministério em ministério como uma batata quente, impossibilitando o acompanhamento e verificação do tema pela sociedade civil e uma segura e correta monitorização de um problema tão sensível de saúde pública. Numa democracia não chega parecer sério, é necessário sê-lo também. A comunidade escolar, os pais das crianças e população em geral têm o direito a saber como, por quem, e o que está a ser removido nas escolas. A transparência promove o rigor e a responsabilidade. São as regras básicas da democracia.