No final do ano passado tive a alegre surpresa de ser nomeada para os prémios Portuguese Women In Tech, ao lado de mulheres com percursos incríveis em diversas categorias. Na manhã do dia da entrega dos prémios, apanhei o autocarro em Lisboa rumo ao Porto. Não tinha qualquer tipo de expectativa, mas não sabia quando voltaria a ser nomeada novamente, portanto queria ter a experiência completa (derrota incluída).
Saí da cerimónia a questionar-me como é que o meu nome foi parar ali, ao lado de mulheres com carreiras incríveis em vários países, que já passaram por empresas multinacionais e que têm criado impacto em diferentes áreas da tecnologia. E depois vinha eu: 24 anos, recém engenheira biomédica e com cerca de 6 meses no mercado de trabalho. Sentia-me o outlier daquela sala. A criança do infantário que, sem querer, foi parar à sala dos crescidos.
Acredito que toda a gente, em pelo menos um momento da sua vida, experiencie a síndrome do impostor, e atribua a razão dos seus sucessos à sorte, às circunstâncias… a tudo menos ao seu esforço e talento. É fácil não nos acharmos suficientes, quando partilhamos a sala com pessoas muito mais experientes do que nós. Nesses momentos, acabamos por menosprezar as nossas conquistas, insignificantes ao lado das dos outros.
Momentos de mudança são propícios a este sentimento de fraude. Quando passamos de um meio que já conhecíamos perfeitamente para outro em que ainda não sabemos todas as regras do jogo, começamos a colocar todas as nossas competências em causa. Olhamos em volta, e toda a gente é muito melhor do que nós. Ficamos ansiosos, pois é só uma questão de tempo até descobrirem que não estamos à altura das expectativas.
No meu caso, a passagem do meio académico para o meio profissional foi o ambiente perfeito para esta síndrome me começar a pregar partidas. Sempre me considerei confiante e era apontada pelos meus pares como alguém que transparecia segurança face às adversidades. Nunca fui boa a tudo, mas tinha noção das minhas qualidades e maior noção das minhas inseguranças. Sempre acreditei que as nossas inseguranças são apenas competências que nos exigem mais trabalho a desenvolver. No entanto, a passagem para um novo meio levou-me a questionar tudo isto. Deixei de me sentir merecedora das distinções que ia recebendo e comecei a duvidar da qualidade do meu trabalho.
Sair da nossa zona de conforto para um meio onde somos os “piores da sala” e onde estamos longe de dominar grande parte dos temas, leva-nos a colocar em causa tudo aquilo que achávamos ser. Será que andámos o tempo todo iludidos e afinal nunca fomos bons? Olhar em volta e ver pessoas mais velhas e tão mais experientes do que eu levou-me a questionar a legitimidade de ter uma opinião. Por vivemos numa sociedade em que a idade ainda é vista como um posto, qualquer abordagem diferente que tenhamos é facilmente vista como menos credível. Influenciada por todos estes fatores, comecei a perder confiança em mim e no que sabia fazer. Questionei-me se estaria no caminho certo.
Levei algum tempo até começar a silenciar a impostora dentro de mim. Aprendi que temos de aceitar os nossos sentimentos, mas focarmo-nos ainda mais nos factos. É normal que nos sintamos mais pequenos, dependendo das circunstâncias em que nos encontramos, mas não nos podemos esquecer de tudo o que conquistamos e que nos permitiu chegar até onde estamos hoje. Na viagem de regresso a Lisboa, no dia da entrega dos prémios, fiz um esforço para rever as minhas conquistas, a dedicação que coloquei em cada uma delas e que criaram impacto por onde fui passando. Ver o meu nome ao lado de mulheres com carreiras tão impressionantes, num momento tão precoce da minha própria carreira, não foi um erro, mas um privilégio.
Uma vez li que “o pior quarto no melhor hotel, era melhor do que o melhor quarto no segundo melhor hotel”. Esforço-me para me recordar desta frase quando o impostor dentro de mim me tenta sabotar – não somos nós que perdemos competências, a fasquia é que fica mais alta. Enquanto isso acontecer, significa que estamos a evoluir. Enquanto na sala houver alguém melhor do que nós, então ainda temos muito para aprender. E isto é sinónimo de crescimento.
Filipa Rebelo é formada em Engenharia Biomédica e Junior Project Manager
O Observador associa-se à comunidade Portuguese Women in Tech para dar voz às mulheres que compõe o ecossistema tecnológico português. O artigo representa a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da comunidade.