O título do livro é muito atrativo. Só avança quem descansa é  um dos livros do Pe. Vasco Pinto Magalhães sj, um sacerdote jesuíta com quem já tive o privilégio de fazer uns Exercícios espirituais. A celebrar agora os seus 50 anos de sacerdócio, o livro, que vai na sua 9.ªedição, veio à baila. Trago-o aqui hoje por várias razões.

O meu foco hoje é o tempo.  O que é o tempo, o que faço com ele, como passo o meu tempo, que tempo me resta? Desperdiço? Aproveito? Tenho tempo a mais? Se estou desempregado, ou doente na cama, tenho tempo a mais! Ou tenho tempo a menos? Às vezes passa depressa, outras devagar, porquê? Passa tudo a correr, dizemos por vezes. Ou “nunca tenho tempo para nada!”. Ou “para matar o tempo jogo às cartas”, ou “faço paciências”, “adoro séries”. E podia continuar, com tantas expressões e ditados, como “devagar se vai ao longe”, ou com a Fábula da “Febre e a da Tartaruga” ou com livros, e filmes, sobre o mistério do tempo – Groundhog Day, Em busca do tempo perdido…

Um dos meus filósofos de eleição põe assim a coisa: O que é o tempo? Se não me perguntam eu sei o que é o tempo; agora se me perguntam, eu já não sei!  –  pode ler-se no seu Livro Confissões, uma boa leitura de férias…

Nos Exercícios de Santo Inácio de Loyola somos desafiados  a  fazer silêncio.  Há vários tipos de exercícios mas os que fiz foram de apenas 3 dias, durante os quais se meditam passagens do evangelho e o sacerdote está à disposição para conversar com quem o procurar. Não me lembro em concreto das conversas que tive mas retenho que me ajudaram a focar no essencial. Que aquele tempo de paragem, de certa forma um “recuo”, me alavancou para a vida do dia-a- dia com outra energia. É esta também a ideia de férias.

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O Pe. Vasco começa com uma passagem do Salmo 89, uma oração: “Ensinai-nos a contar os nossos dias, para chegarmos à sabedoria do coração.” Com efeito, o livro tem como pressuposto que há aspetos da nossa vida que apenas dependem de nós. Por exemplo, se formos verdadeiros connosco, arranjamos sempre tempo para aquilo que queremos, ou seja, se eu quero mesmo, arranjo mesmo. O problema está então em eu ter a coragem de me perguntar: O QUE QUERES?

Uma questão tão simples como a de saber como passar o tempo, leva a que eu me pergunte se ando aqui “a ver andar navios” ou se, pelo contrário tomo as rédeas do meu dia e recuso a ser uma “Maria vai com as outras”.  Postas as coisas em termos de liberdade, trata-se de diante do que me acontece _ e o que é a vida senão uma sucessão de acontecimentos _ eu querer agarrar isso que acontece, como um toureiro pega o touro, ele e não outro.

Diante do que me acontece eu posso ignorar ou levar a sério. Tanto no bom como no mau uma coisa é certa, o que me acontece é para mim, e sou Eu que devo responder. A responsabilidade é a minha resposta esclarecida aos desafios  de cada instante, bem como aos desafios que terei por diante, até ao momento da morte. Sim, porque não me vou iludir e dizer que não vou morrer – embora eu deva confessar que nas louçanias dos meus vintes, esse era um assunto a adiar.

O nosso Santo Inácio era um jovem nobre habituado a livros de aventuras cavaleirescas. Um tiro numa perna, na batalha de Pamplona, fez a diferença.

A forma como viveu a sua convalescença, no castelo do seu pai,   mudou a sua vida e a de milhares e milhares de pessoas, como o Pe. Vasco, e eu, que são ainda hoje tocados pela sua forma de viver. No seu tempo de convalescença,  não tendo as suas habituais leituras para se “entreter”,  não lhe restou senão ler o que havia disponível: A Vida de Cristo e A Vida dos Santos. Porque descansou, ele pôde avançar!

Não precisarei de um tiro na perna, mas há muitos tiros e muitas pernas. Mas há um tiro ao qual nenhum de nós escapa, e esse é a morte. Pode vir aos 70 ou pode vir logo à noite. Diz a Bíblia, em outro dos seus 150 salmos: “os dias da nossa vida chegam a 70 anos, ou a 80 para os que têm mais saúde; entretanto, a maior parte dos anos é de labuta e sofrimentos, porquanto a vida passa muito depressa, e nós voamos!”

Há tempo para morrer e tempo para viver, com refere o Pe. Vasco, ao citar outro livro da Bíblia: Tudo tem a sua ocasião própria, e há tempo para todo propósito debaixo do céu./Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou/tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar/tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de chorar, e tempo de dançar/tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de abster-se de abraçar/tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de deitar fora/tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar/tempo de amar, e tempo de odiar; tempo de guerra, e tempo de paz. (Eclesiastes, 3).

Alegro-me ao ler o testemunho deste homem que viveu tantos séculos antes de Cristo. Porque acontece que eu experimento o mesmo que ele. Não sei como ele respondeu nas suas circunstâncias ao que lhe aconteceu. Alegro-me nesta identificação de uma mesma humanidade…

Está porém nas minhas mãos , e só nelas, o decidir avançar, como conta neste livro o jesuíta que um dia me fez Companhia para dar os passos na boa direção!