Está a chegar ao fim este mês de Agosto quente e indolente, e parecem esquecidas as preocupações de outrora com austeridade, défices, e contas públicas. Por todo o lado, de Lisboa até às praias multiplicaram-se os turistas, que vieram dar novo fôlego ao setor do turismo e a alguns particulares que decidiram alugar o espaço extra para complementar o seu rendimento. A juntar a tudo, a vitória no Euro pareceu mostrar que se calhar somos mesmo os maiores e o pior está para trás.
Mas será que temos razões para estarmos realmente otimistas? Como se compara a situação portuguesa atual com a de 2011, quando fomos intervencionados pela troika? Há 3 variáveis importantes a considerar: défice, dívida pública e défice externo. Em relação às variáveis de fluxo (os défices), estamos sem dúvida melhor. Em 2009 e 2010 o défice público foi próximo de 10% do PIB, o que está claramente acima do défice do ano passado, apesar de estarmos ainda acima dos 3% necessários para evitar sanções. Além disso, desde 2012 temos uma balança comercial positiva, com o turismo de novo a dar uma ajuda num sector de serviços com saldo positivo e o sector de bens cronicamente deficitário em que compramos fora coisas caras que não produzimos. O problema é que o stock de dívida cresceu entretanto devido aos elevados défices acumulados. Além disso, com a reversão de algumas das medidas de austeridade corremos o risco de o défice voltar a disparar, o que começa a deixar a europa e os mercados apreensivos.
A questão fundamental é perceber porque é que Portugal (e na verdade muitos outros países) cai sucessivamente neste ciclo de gastos públicos excessivos seguidos de programas de austeridade dolorosos, para logo de seguida voltar ao padrão inicial de aumentar os gastos de forma não sustentável. Creio que a resposta está relacionada com o facto de um elevado número de pessoas que elegem os governantes receberem também o seu rendimento do estado. Assim sendo, vão votar no programa que lhes proporcionar um maior proveito. Isso significa que funcionários públicos e reformados (entre outros) têm todo o incentivo em formar uma coligação para maximizar os pagamentos atuais do estado. Mesmo que isto não seja sustentável e as gerações futuras acabem por pagar o custo da dívida acumulada, esta escolha parece fazer sentido do ponto de vista individual.
Temos neste momento uma divisão entre setor privado (que gera receita) e setor público (que absorve receita), mas principalmente entre reformados (que absorvem receita), trabalhadores (que geram receita), e crianças e jovens (que acabaram por pagar a dívida). O sistema político que temos penaliza as gerações futuras que não têm direito de voto, e ficam reféns de um grupo de reformados que vai ser cada vez maior numa sociedade envelhecida.
No Reino Unido também foi marcante esta divergência entre gerações, em que os mais jovens queriam na maioria permanecer na União Europeia, enquanto as gerações mais velhas votaram no Brexit, provavelmente tentando salvaguardar os seus direitos adquiridos.
Creio que é importante repensar como em democracia podemos defender os interesses dos menores e gerações futuras, caso contrario os nossos jovens podem votar com os pés e emigrar para onde não tenham uma herança de dívida e pensões para pagar.