Na sequência dos extraordinários incêndios de 2003 foi publicada a Lei das ZIF – Zonas de Intervenção Florestal, destinada essencialmente aos territórios de minifúndio.

As ZIF, que tinham como área mínima para a sua constituição 1000 ha, pretendiam ser a solução para os problemas de falta de “escala” nas áreas de minifúndio para poderem ser aplicados os famosos conceitos de “ordenamento” e “gestão” que finalmente trariam a “sustentabilidade” que todos desejávamos para o sector florestal.

Temos alertado que por muito bem que o “condomínio” funcione, ainda que o Prédio esteja bem pintado por fora, que as escadas estejam limpas, todas as lâmpadas do corredor acendam e o elevador funcione, se não entrar ninguém durante quarenta anos dentro dos apartamentos mais cedo ou mais tarde vão acontecer problemas graves.

O “nível” de condomínio da ZIF é no entanto essencial, para articular todos os proprietários de um território, e existem muitos que têm condições para continuar a realizar individualmente a gestão das suas propriedades. No entanto, não podemos ignorar que em muitas regiões a percentagem de proprietários que já não reside no território supera os 70%. Com áreas diminutas, de cerca de 0,5 ha por propriedade e uma média de área total por proprietário inferior a 2 ha, a gestão conjunta é incontornável.

Necessitamos de encontrar “novas ferramentas” de gestão do território que substituam o pequeno agricultor que já desapareceu em muitas regiões, respeitando a propriedade privada mas viabilizando a “gestão conjunta” das propriedades, de modo a que numas se possa construir aceiros para produzir “segurança” enquanto noutras possamos produzir eucaliptos ou plantar sobreiros que só darão rendimento daqui a 40 anos, o que importa é que todos os proprietários tenham direito a receber proporcionalmente à dimensão da sua propriedade. E que a rentabilidade do eucalipto, bem como o esforço de realizar as culturas e atividades menos interessantes como manter as infraestruturas, seja igualmente dividido por todos.

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Estes projetos, para serem sustentáveis, têm que ser economicamente viáveis, têm que valorizar todas as potencialidades do território, sejam as culturas florestais a caça, os frutos silvestres, cogumelos, biomassa, culturas agrícolas ou o rebanho de gado que já ninguém quer ter, mas é essencial ao equilíbrio do sistema.

Temo que alguns sonhem com EGF, geridas a partir da cidade a explorar apenas o que dá maior rentabilidade, eucalipto e um pouco de pinheiro, e a contar que o povo das aldeias trate do resto.

Temos nos últimos anos proposto insistentemente, a criação dentro das ZIF de uma figura paralela de “Sociedades de Gestão Territorial” que agrupe numa entidade, robusta em termos jurídicos, os proprietários interessados em gerir conjuntamente as suas propriedades.

O atual Governo, na Reforma Florestal, propôs a criação das “Sociedades de Gestão Florestal”, agora redenominadas ”Entidades de Gestão Florestal”. Tudo estaria bem, não fossem os detalhes.

Apesar dos avisos e solicitações no sentido de efetuar alguns ajustes na lei que entretanto foi já promulgada pelo Sr. Presidente da Republica, um único proprietário ou entidade pode constituir-se sozinho como uma “Entidade de Gestão Florestal” desde que tenha mais de 100 hectares e mais de metade de área seja constituída por prédios com área média inferior a 5 ha, ainda que as propriedades se encontrem dispersas por todo o País, incluindo as ilhas.

Tenho pensado muito, e procurado com grande cuidado, mas, confesso que não consigo perceber: as propriedades são dispersas, de muito pequena dimensão, ainda que se trate de um exemplar e dedicado produtor florestal não consigo descortinar qual o serviço relevante que presta ao País ao gerir bem as “suas” pequenas e dispersas propriedades. O que justifica então a sua situação de privilégio fiscal relativamente a todos os outros cidadãos?

Situação distinta teríamos se a Lei exigisse que da “Entidade de gestão Florestal” fizessem parte 30 ou 40 sócios que, no seu conjunto, detivessem por hipótese 100 hectares juntos ou contíguos na envolvente de uma aldeia e dentro de uma ZIF, num processo apoiado tecnicamente por uma Associação. Esses proprietários estariam, sim, ao aderir a um processo de gestão conjunta a prestar um relevante serviço ao País e merecem ser recompensados fiscalmente.

Esta Lei permite esta situação e também a premeia com incentivos fiscais, mas… desincentiva claramente o proprietário do caso anterior a juntar-se ao resto da aldeia, pois sozinho acede às mesmas regalias, premiando e incentivando o individualismo.

Assim, como permite a constituição de “entidades” em território fora de ZIF, o que contraria toda da política florestal dos últimos anos.

Ao País de nada servirá a mera redenominação dos atores que já estão instalados no território e que pouco têm contribuído para a melhoria da situação.

Entendemos que as Entidades de Gestão Florestal e Fundos de Investimento são fundamentais para o desenvolvimento do setor florestal e dos territórios rurais e têm enorme potencial, mas é fulcral que o processo seja construído com a participação dos proprietários e não substituindo os proprietários por agentes externos ao território.

A questão decisiva é saber quem serão dentro de décadas os proprietários de grande parte dos territórios rurais. Simplesmente, as EGF e os fundos de investimento? Ou os proprietários rurais, organizados em EGF e com o apoio dos fundos? No meio da floresta, quem serão no futuro os donos disto tudo?

Vice-Presidente da Câmara de Mação, Presidente do Fórum Florestal-Estrutura Federativa da Floresta Portuguesa