No passado dia 20 de outubro, o Parlamento Europeu (PE) premiou Alexei Navalny, activista político e o maior opositor ao regime de Vladimir Putin, com o prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento de 2021. Este, que foi supostamente envenenado em agosto de 2020 com novitchok e que se encontra a cumprir uma pena de prisão de dois anos e meio por ter violado a liberdade condicional de uma anterior condenação, recebeu o reconhecimento da “sua coragem nas tentativas de restaurar a liberdade de escolha ao povo russo” que, segundo a vice-presidente do Parlamento Europeu, a finlandesa Heide Hautala, “custou-lhe a sua liberdade e quase a sua vida”. Também o líder do Parlamento Europeu, David Sassoli, na rede social Twitter, reconheceu a bravura de Navalny reiterando “apelos à sua libertação imediata”.

Desde 1988, este prémio (no valor de 50 000 euros) premeia pessoas ou organizações que se dedicam à defesa das liberdades e dos direitos humanos. Para receber o prémio deste ano, os nomeados foram: Alexei Navalny (activista e político russo), 11 mulheres afegãs, Jeanine Áñez (ex-presidente interina da Bolívia), Sultana Khaya (activista que promove o direito à autodeterminação do povo sarauí) e a Global Witness (ONG que expõe violações dos direitos humanos e ambientais). Sem dúvida há aqui boas candidaturas. No entanto, a premiação de Navalny mostra uma derrota antecipada da Europa no jogo político com a Rússia.

Se questionarem se a atribuição deste prémio a Navalny é justa? Sem dúvida. A Rússia tem tido um regime político muito rígido, com Vladimir Putin a concentrar o poder político em si, afastando qualquer sinal de oposição directa, o que torna difícil o funcionamento da democracia e da própria liberdade política. É claro que um activista e opositor político como Navalny, ao confrontar um regime como o do Putin impondo liberdades e Estado de Direito, acaba por ser acusado, perseguido, ameaçado, preso e até mesmo… morto! Ao longo da história da humanidade o procedimento foi assim com qualquer oposição política que estivesse contra uma autocracia ou um absolutismo por parte de quem governasse.

Porém, no ponto de vista diplomático, a atribuição do prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento de 2021 a Navalny vai além de qualquer tipo de liberdade em torno deste prémio. Podia ter sido premiado a Global Witness, a Sultana Khaya ou até mesmo as 11 mulheres afegãs. Mas não foi. E porquê? Porque acabou por ser uma questão política, que em parte envolve a crise energética que a Europa tem atravessado ultimamente e que tem sido tema de discussão no Conselho Europeu devido aos altos preços provocados na electricidade, no carvão e no gás natural. Segundo a Foreign Policy, devido a esta crise energética a Europa está desesperada para ter mais gás russo, mas de acordo com a CNBC, por enquanto a Rússia não está inclinada a fornecer a quantidade de energia de gás natural que os lideres europeus tanto anseiam ter.

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Actualmente a Rússia é o país com a maior reserva de gás natural do mundo e assegura aproximadamente 50 por cento das importações de gás natural da União Europeia. O resto vem de países como Noruega e Argélia. Porém, o facto de grande parte das importações de gás natural da UE ser proveniente da Rússia mostra que existe uma grande dependência dos europeus para com os russos, o que significa que uma crítica, uma exigência ou até mesmo uma entrega de prémios com indirectas a Kremlin pode não trazer benefícios a curto e a médio prazo para a diplomacia europeia e para nós enquanto cidadãos europeus.

Para concluir, e no que ao prémio Sakharov diz respeito, a cerimónia de entrega está marcada para 15 de dezembro, em Estrasburgo. Dificilmente Alexei Navalny estará presente para receber o prémio, mas já disse sentir-se honrado pela nomeação enquanto o Kremlin indicou respeito pelo PE, mas não manifesta respeito pela atribuição do prémio a Navalny.

A Europa pode tentar “chatear” a Rússia com a escolha de Navalny. Ainda assim, Putin não irá dar relevância a essa questão porque neste momento a Rússia tem questões mais importantes, como a situação pandémica vivida no país e a situação geopolítica no Pacífico. Mais, não nos podemos esquecer de que a Rússia é um dos principais parceiros comerciais da União Europeia e neste momento tem algo que a Europa não tem e de que está a precisar, a energia. E Putin sabe muito bem disso.

Por esse motivo, a comunidade europeia necessita de repensar os seus actos e a sua comunicação diplomática com o Kremlin e, ao mesmo tempo, tentar encontrar uma solução de forma a que a UE tenha uma independência energética sustentável e renovável com o objectivo de proteger a qualidade de vida das futuras gerações, as economias e, acima de tudo, proteger a sua soberania da energia russa.