A acalmia que se seguiu ao último Conselho Nacional dá espaço ao CDS para parar e pensar um pouco sobre que caminho seguir até às eleições autárquicas e qual a solução para o seu futuro.

O partido precisa de uma visão e de uma estratégia claramente definidas e não aparenta tê-las neste momento. A participação nos governos da Madeira e dos Açores, a presidência de algumas câmaras e os deputados e os inúmeros autarcas eleitos garantem uma continuidade importante para o partido, mas a afirmação de um discurso próprio é essencial.

A ausência de uma visão e de uma estratégia clara mostra que o CDS atravessa dificuldades. Os dados são objectivos, e não são só as sondagens. Nos Açores, apesar de ser a terceira força política do arquipélago, perdeu 14% dos votos e desceu de 7,6% para 5,3% da votação, tendo elegido menos um deputado. Foi o partido que mais caiu apesar de toda a direita ter subido nas eleições. Em S. Miguel teve um resultado negativo, tendo perdido quase metade dos votos das eleições de 2016.

Nas presidenciais, todos os partidos de direita viram o seu candidato subir face aos resultados das eleições legislativas, excepto o CDS, que não apresentou candidato próprio e apoiou o vencedor pré-anunciado. Numa noite em que houve uma grande vitória da direita, o CDS foi o único partido deste espaço que não pode festejar efusivamente.

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Por tudo isto é facilmente compreensível que os militantes achem necessário que mude alguma coisa. A questão é o quê?

Um caminho para o CDS

O CDS mantém-se na esteira de ser um partido responsável, institucional e profundamente moderado. Mas tem que conciliar essa postura com uma proposta que cative as pessoas e responda aos seus problemas.

Tem de ser um partido menos virado para dentro, a tentar justificar a sua doutrina e a sua existência, e tem de se virar decisivamente para fora e de uma forma que una os militantes. A maneira mais óbvia de o fazer é o ataque ao adversário comum, o Governo e o socialismo.

As oportunidades são muitas para afirmar a sua visão e para marcar a diferença pela positiva. A vida em Portugal continua e os portugueses precisam de propostas que ajudem a solucionar os seus problemas, que são muitos e cada vez maiores.

Estamos numa altura em que Portugal tem um governo completamente desorientado, em que a incompetência demonstrada é transversal a quase todos os ministérios. O sistema nacional de saúde está em ruptura porque não foi uma prioridade para a esquerda que dominou a governação nos últimos 5 anos. O país está de pantanas e estagnado há mais de 20 anos de políticas erradas. Esta é uma oportunidade para o CDS afirmar a sua visão que não pode ser desperdiçada.

Para isso, é necessário que os militantes sejam chamados a participar activamente e que sejam ouvidos. É necessária uma coordenação estreita com os vários eleitos do partido, a nível nacional, regional e local. Acima de tudo, é necessário um discurso com conteúdo, consistente, e que introduza novos temas políticos que vão para além do burburinho dos canais digitais. Só desta forma é que o partido mudará o suficiente para apresentar uma via alternativa convincente e merecer a confiança dos portugueses.

Uma estratégia para o CDS

Há um consenso interno generalizado de que o CDS é um partido que conta e que faz falta ao país. Falta clarificar a estratégia para que esta ideia possa ser confirmada em eleições.

O CDS teve 4,2% e 221 mil votos em 2019, o pior resultado dos últimos 20 anos e menos 433 mil votos do que em 2011 (uma quebra de 66% face aos 11,7% e 654 mil votos registados então). Esta queda aconteceu com uma excelente líder, uma das melhores que o país teve nos últimos anos em todos os partidos, e um excelente programa, no qual eu colaborei dentro das minhas possibilidades.

Mas isso não foi suficiente porque o CDS seguiu uma estratégia desadequada. O “embalo” dos 21% que Assunção Cristas conseguiu em Lisboa em 2017 criou a ilusão de que um crescimento significativo do partido era possível. Para isso, o CDS apostou decisivamente nas questões sociais, fazendo uma inversão da sua estratégia habitual e tentando transpor temas relevantes a nível local para os assuntos a nível nacional.

O primeiro problema é que o CDS sempre teve preocupações sociais e nunca precisou de o provar a ninguém. Por isso a mudança de estratégia para um partido renovado a defender “causas” sociais não foi bem compreendida.

Para se afirmar como um “novo” partido com propostas para os problemas sociais era necessário trazer um novo discurso e novas ideias. Não foi isso o que se passou, e o CDS adoptou a linguagem da esquerda radical e começou a enfatizar direitos, minorias, quotas e desigualdades, propondo subsídios e “privilégios” a nível nacional como se estivesse em discussões camarárias.

Esta tentativa bem intencionada de fazer crescer o partido para o centro foi interpretada por muitos eleitores tradicionais do CDS como uma cedência à esquerda nas chamadas “causas fracturantes” e em outas questões em que predominava o intervencionismo do Estado sobre a vontade das famílias e das empresas.

Para além disso, esta inflexão estratégica foi feita numa altura em que surgiram dois novos partidos no espaço da direita. O resultado foi que o uso da linguagem “moderna” aliou-se à desvalorização dos valores tradicionais do CDS e não só não trouxe novos eleitores como contribuiu decisivamente para afastar muitos dos seus habituais votantes tradicionais, que lhe garantiam uma base de apoio confortável acima dos 400 mil votos.

Assim, a solução parece ser voltar à estratégia tradicional que o partido seguiu nos últimos 20 anos, e que lhe permitiu estar por duas vezes, mesmo que em conjunturas muito difíceis, no governo de Portugal.

O CDS precisa de se afirmar voltando-se para a sua base eleitoral. Actualmente o CDS está numa situação completamente diferente da que estava em 2017. A perspectiva de crescer pela captação de novos grupos de eleitores está afastada de momento.

A estratégia mais óbvia é recuperar o eleitorado tradicional que o abandonou. E isso passa por afirmar, sem vergonha, os valores fundacionais da democracia-cristã e do conservadorismo-liberal, e aplicá-los em propostas que respondam às preocupações da sua base histórica de eleitores. O CDS tem de se afirmar inequivocamente de direita e isso é totalmente incompatível com o discurso das “causas” sociais manipuladas pela esquerda.

O CDS não pode recusar votos de quem quer que seja e ficar contente por ver militantes a saírem do partido, nem pode ter os seus militantes a subscreverem manifestos em que se propõem “cercas sanitárias” a este ou aquele grupo. Todos os votos são válidos e os eleitores não querem saber das idiossincracias que existem dentro do partido. Por isso, o partido tem de se afirmar, sem margem para quaisquer dúvidas, como alternativa de poder e defender um acordo à direita para mudar o governo.

O CDS deve ter um propósito muito bem definido e explicado aos militantes, de forma a motivá-los para participarem activamente, e aproveitar os grupos parlamentares e todos os eleitos para apresentar uma resposta própria aos grandes problemas que afectam Portugal e os portugueses.

O CDS tem de saber o que é que vai fazer relativamente às falhas do sistema nacional de saúde e à ausência de cuidados paliativos para contrapor à desvalorização da vida humana? O que é que vai propor para acabar com o controlo dos sindicatos e dos burocratas sobre o ensino em Portugal? O que é que vai fazer para resolver a insustentabilidade da segurança social? Vai aplicar políticas de apoio à natalidade ou acredita que há gente a mais no planeta e por isso é preciso reduzir a população?

Como ultrapassar 20 anos de estagnação e como conciliar com os desafios ambientais? Como valorizar a iniciativa em Portugal? O que é que vai ser prioritário para a recuperação económica do país? Tem de esclarecer que não está disposto a ceder soberania em troca dos fundos alemães da “bazuca” e o que é que vai mudar na lei de imigração para que as falhas de integração que existem em França e em outros países não se estendam a Portugal? O que é que vai propor para melhorar e legalizar os lares? O que é que é necessário para aumentar a segurança de Portugal?

O que vai mudar para acabar com as interferências políticas na justiça? Que política para a cultura? Que condições criar para que o pluralismo na imprensa aumente? Como deslocar a aposta na investigação de uma visão burocrática para o desenvolvimento de aplicações que sejam úteis para as pessoas? Para quando uma reforma séria do Estado, que é um dos obstáculos ao desenvolvimento do país?

Acima de tudo, o CDS deve concentrar-se no que é mais importante, que é derrotar o socialismo. O socialismo está a falhar e há décadas que corrói as estruturas do nosso país, tendo colocado Portugal em estagnação e na extrema dependência do exterior, como um verdadeiro protectorado. Pior ainda, o socialismo já demonstrou que não consegue apresentar soluções para os problemas dos portugueses.