Ninguém de bom senso põe em causa a evidência das alterações climáticas. Já sobre quais são os mecanismos exactos por detrás dessas alterações só temos hipóteses, porque hipóteses é tudo o que conseguimos ter sobre uma realidade tão complexa como é o clima. E quando entramos na definição de soluções e ainda mais na sua aplicação política, a incerteza aumenta exponencialmente. Portanto, mais ainda neste assunto do que noutros mais simples (como, digamos, o controlo da dívida soberana), querer passar da evidência do fenómeno para a sua solução com três frases voluntaristas é uma demonstração, evidente em si mesma, de tolice.

Vem isto a propósito da “greve mundial pelo Clima” que está a ser convocada um pouco por toda a Europa para o dia 15 de março pelos “jovens” e, sobretudo, do entusiasmo um pouco estranho que o episódio tem despertado em gente adulta. O caso começou há seis meses com uma rapariga sueca de 16 anos, Greta Thunberg, que resolveu faltar às aulas todas as sextas-feiras “skolstrejk för klimatet” (“em defesa do clima”). Tem sido sublinhado por gente vária, em tom sibilino, que a jovem tem síndrome de Asperger. Eu diria que ter síndrome de Asperger não dá competências divinatórias ou sapienciais a ninguém, pelo que as afirmações de Greta Thunberg valem, nestes assuntos, exactamente aquilo que valem as palavras de qualquer outro adolescente de 16 anos: pouco.

Confesso. Não tenho nada contra as campanhas pelo ambiente mas tenho contra os movimentos de “jovens”. A última vez que o Ocidente conheceu grandes movimentos de jovens, os resultados não foram brilhantes. Nos anos 1960, o mundo encantou-se com o “flower power” e deixou-se arrastar pelo “sonho” dos revolucionários do maio 68 em Paris. Depois do espectáculo acabar, sobraram a proliferação das DST, grupos terroristas como os Baader-Meinhof alemães e as Brigadas Vermelhas italianas e os pesadelos de drogas que varreram o Ocidente e destruíram literalmente dezenas de milhares de pessoas ao longo de duas décadas. Acresce a facilidade com que todos esses movimentos foram infiltrados e manipulados, acabando nos anos 1970 e 80 a promover “comités de Paz” que defendiam o desarmamento unilateral do Ocidente perante uma União Soviética em máximos de agressividade – com o fantástico slogan: “better red than dead” (“vale mais vermelho que morto”) – uma esplêndida declaração de cobardia.

A “greve pelo clima” pode ter começado como uma obsessão de Greta Thunberg e servir agora aos adolescentes de toda a Europa para fazerem gazeta, mas já há quem esteja a colocá-la noutra fase. A carta aberta da “coordenação global” deste movimento que “não é centralmente organizado”, publicada pelo “The Guardian” no dia 1 de março reza assim: “Não aceitaremos mais essa injustiça. Exigimos justiça para todas as vítimas passadas, atuais e futuras da crise climática. … Nós, os jovens, começámos a mobilizar-nos. Vamos mudar o destino da humanidade, quer queiram, quer não. Unidos vamo-nos sublevar até que haja justiça climática.” Reconhecem os acordes? “De pé, ó vítimas da fome! Etc.”

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