Sem a pressão do voto útil para derrotar o PS e considerando que as eleições europeias são habitualmente uma ocasião privilegiada para a expressão de voto de protesto, no próximo dia 9 de Junho o CH tem fortes possibilidades de conseguir o seu melhor resultado eleitoral de sempre e – talvez – concorrer seriamente pela vitória – ou pelo menos para ficar à frente da AD, o que seria em si mesmo um pequeno terramoto no sistema partidário português.
Com uma magríssima vitória eleitoral nas legislativas e um empate em número de deputados entre PSD e PS, a margem de Montenegro para erros era escassa e este início não tem sido o melhor, com uma série de erros não forçados. O processo para a eleição do Presidente da Assembleia da República foi, no mínimo, atabalhoado e causou um desgaste absolutamente desnecessário por inabilidade política do PSD. A escolha de Secretários de Estado revelou grandes dificuldades de recrutamento, dificuldades essas que, sendo compreensíveis na actual conjuntura, não deixam ainda assim de fragilizar o Governo. Depois, algumas más escolhas de assessores, ainda que materialmente não muito relevantes, minaram adicionalmente a credibilidade do executivo. E, claro, a enorme trapalhada relativa à baixa do IRS que afinal (e como a IL desde o início alertou) pouco acrescentou ao que o PS já havia aprovado.
Neste contexto, o desastrado e imprevidente processo de selecção do cabeça de lista da AD para as eleições europeias só veio piorar as coisas. Depois de permitir que se gerasse a ideia de que esse lugar seria assumido por Rui Moreira, e no seguimento de forte (mas não surpreendente) contestação interna no PSD a essa opção, Montenegro terá optado por oferecer a segunda posição nas listas a Moreira, tendo como cabeça de lista Sebastião Bugalho. A falta de bom senso inerente a este convite só foi superada pela posterior desvalorização da ideia de Rui Moreira ter sido convidado, gerando mais um desnecessário impacto negativo para o PSD e para a AD.
Sebastião Bugalho (disclaimer: foi meu aluno no Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa e tenho por ele estima e consideração pessoal) é uma escolha compreensível – pela sua combatividade, experiência mediática e potencial apelo ao voto jovem e disputado com o Chega – mas nem por isso deixa de ser surpreendente num partido com a escala do PSD. É também uma escolha de altíssimo risco para Luís Montenegro: numas eleições que a AD está obrigada a vencer, a responsabilidade por um mau resultado não poderá ser atribuída ao jovem Bugalho – que compreensivelmente se sentiu motivado e aceitou esta oportunidade – mas sim a quem lhe dirigiu o convite.
O talento comunicacional e a argúcia de Sebastião Bugalho são inegáveis e não tenho qualquer dúvida de que dará o seu melhor na campanha, mas poderá ser complicado ultrapassar as críticas de falta de experiência relevante para estas funções assim como será difícil contrariar a ideia de que Montenegro foi incapaz de recrutar um cabeça de lista com outro peso político.
A estas dificuldades somam-se candidaturas fortes por parte do CH e da IL. Por parte do CH, a opção por Tânger Corrêa, Vice-Presidente do partido, pode ainda gerar alguns dissabores devido a posições assumidas no passado pelo experiente diplomata relativamente à Rússia. Mas o anúncio do ex-deputado do PSD Tiago Moreira de Sá como número 2 é um primeiro sinal forte (muito mais do que os das legislativas) de que o CH começa a conseguir recrutar quadros políticos qualificados da área do PSD: além da experiência parlamentar, Tiago Moreira de Sá é Professor Associado na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e investigador no IPRI, com ênfase nas relações transatlânticas. Por sua vez a IL apresenta também uma lista forte, com o ex-líder João Cotrim de Figueiredo a liderar e Ana Martins (a quem se aplica o mesmo disclaimer que deixei relativamente a Sebastião Bugalho), Vice-Presidente da IL e coordenadora do ILab, Laboratório de Ação Política da IL, com forte perfil internacional e em particular europeu, tendo sido colaboradora próxima de Timothy Garton Ash, na segunda posição.
Numas eleições que terão – previsivelmente – elevada abstenção muito se decidirá pela capacidade de mobilização dos vários partidos. E com CH e IL a terem um claro potencial para crescerem face às legislativas, a AD enfrenta um dilema: se desvalorizar as eleições europeias para minimizar danos, arrisca-se a ter um resultado ainda pior; se as valorizar e dramatizar o discurso, arrisca-se a agravar as consequências nacionais de um eventual mau resultado.