As coisas assumem a importância que lhes damos. Este conselho, tão frequentemente dado na esfera pessoal, é igualmente válido (e especialmente útil) na esfera profissional.

E sabem no que é que somos, nós Portugueses, mesmo bons? A criar comissões de trabalho, inquérito, análise, entre outras, para diluir responsabilidades e estar suficientemente precavidos caso alguma coisa dê para o torto ou se falhe nas promessas. Temo-lo feito ultimamente com a questão da Covid-19 e da discussão das vacinas. Já o fizemos no passado com inúmeros outros temas e nos mais diversos contextos.

Falar em cumprir compromissos e concretizar as tarefas a que nos propomos não é mais do que falar de integridade. E falar de integridade pressupõe o cumprimento da palavra. Quer dizer que temos de fazer exatamente aquilo a que nos propomos ou, se por algum imprevisto isso não é possível, devemos gerir expetativas e renegociar o acordo.

“A que horas começa a reunião das 9h30?”

Andamos todos a enganarmo-nos uns aos outros. Dizemos que sim e depois vê-se. Logo se resolve. Seja aos filhos, aos pais, às mulheres, aos maridos. Seja ao chefe, ao cliente, ao fornecedor, ao colega de trabalho. Depois somos quase sempre medíocres. Fazemos tudo ao mesmo tempo, não cumprimos prazos, promessas, não entregamos com a qualidade combinada, andamos sempre debaixo de água, atrasados, stressados e ansiosos.

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Somos os campeões do desenrasque e os últimos no planeamento estruturado. Em Portugal, os heróis são os bombeiros… quando o fogo já vai bem perigoso. Dois ex-colegas meus foram aos EUA fazer um curso de tomada de decisão e o Professor disse “são Portugueses? Vocês são os melhores do mundo a desenrascarem-se e a resolver problemas, são os McGyvers do mundo”. E continuou, “mas sabem porque são assim? Porque passam a vida a enrascar-se… vocês não antecipam… não cumprem acordos…”. Se apertares mal o primeiro botão nunca vais apertar bem o casaco.

Manter os acordos impecáveis

Já imaginou o que aconteceria se a sua organização conseguisse manter 90 a 100% dos seus compromissos? O caminho para este objetivo quase utópico começa na consciência de cada um quando está a estabelecer determinado acordo.

Não o devemos fazer de forma leviana. Um determinado acordo ou compromisso profissional assumirá a importância que lhe damos. Se for um compromisso que é marcado com antecedência na agenda, que tem um planeamento e uma estratégia própria, assumirá uma importância maior do que outro compromisso que é selado com um acenar de cabeça ou um simples aperto de mãos. As tradicionais expressões “sim, eu faço isso” ou “conta com isso para a semana”, não incluem, regra geral, a definição do que é exatamente a tarefa “isso”.

As ferramentas que temos ao nosso dispor já nos ajudam a estabelecer níveis de importância dos compromissos, para nos ajudar da árdua tarefa de cumpri-los: são as estrelinhas no email, as bandeirolas vermelhas, os alertas, as notificações. Ainda assim, a maior parte deles falhamos e, pasme-se, agimos como se fosse natural. Essa banalização do incumprimento é um hábito vil, como diria o velho Churchill.

A ferramenta que mais uso é o QFQQ – Quem, Faz, o Quê e Quando. Todo e qualquer compromisso assumido por mim segue esta regra. A melhor técnica para estabelecer acordos concretizáveis é definir a sua especificidade. A especificidade é uma regra de ouro no que diz respeito à definição de um compromisso, que deve incluir objetivos e datas de cumprimento. O Grupo Salvador Caetano, após um programa de liderança comigo, nomeou uma das suas salas de reunião de “SALA QFQQ”. Naquela casa, honrar compromissos é assunto sério, talvez por isso tenham consistentemente tanto sucesso.

Quantas vezes, ao aceitar um determinado desafio ou compromisso, pensou para si próprio “não tenho a mínima intenção de fazer isto, mas aceito na certeza de que ninguém irá dar seguimento ou fazer follow up”? Quando assume uma tarefa, sabendo que a mesma está bem lá no fundo da lista de prioridades, é meio caminho andado para que fique esquecida para a eternidade.

Se está a trabalhar na sua lista de resoluções para 2021, este pode ser precisamente o tema que vai fazer toda a diferença na melhoria da sua performance pessoal e profissional: mudar a sua atitude no que diz respeito à definição e gestão de compromissos e tarefas assumidas.

Receita para honrar compromissos

Não é tarefa fácil, mas o Homem é um ser de hábitos e aqui trata-se, precisamente, de substituir uma expressão como “eu entrego isso para a semana”, por outra como “será entregue na próxima 5ª feira, às 17 horas”. O que está na base de um acordo claro e objetivo? Planeamento, organização, reduzir âmbito, focar no processo e não em heróis, fazer o básico bem feito. E é fácil perceber que a prática destes elementos terá um impacto considerável nas várias dimensões da sua vida. O objetivo é simplesmente estabelecer compromissos que sejam muito claros e objetivos, sempre.

A longo prazo, irá perceber, que manter os acordos impecáveis melhora a energia, confiança e produtividade da equipa (do escritório ou lá de casa). Ao começar esta prática, a primeira coisa que irá perceber é que a sua lista de To-Do’s, ou tarefas, vai diminuir consideravelmente porque, se estabelecer metas concretas e objetivos realistas, vai perceber que não é possível fazer tudo ao mesmo tempo, em tempo útil, e entregar com qualidade. Terá de estabelecer prioridades, aceitar o que é efetivamente possível fazer num determinado período e assumir os compromissos que consegue cumprir.

Isto é precisamente o contrário de aceitar tarefas só porque sim, para mostrar aos colegas que vivemos no mundo da ocupalândia para ganharmos uma lápide a dizer “aqui jaz um Gestor e um Pai que nunca teve tempo”, com uma agenda sempre recheada de tarefas impossíveis. Somos consideravelmente mais úteis à equipa quando todos sabem precisamente com o que podem contar.

Honrar os compromissos está na nossa origem mais primitiva. Desde o tempo dos romanos que está escrito numa lápide “pacta sunt servanda”, ou seja, “os compromissos devem ser respeitados”. Assumir um pacto estabelecido sempre foi a base e pré-condição da convivência social.

Porque é que é tão difícil assumir compromissos e honrar acordos? Por três razões principais:

  1. Insegurança e incapacidade de dizer que não. Aceitam-se todas as tarefas e sugestões com a incerteza de que se vão cumprir;
  2. Desfasamento entre o grau de dificuldade de uma determinada tarefa e da pessoa responsável por ela. Seja por falta de especialização, talento ou outro motivo, há que admitir simplesmente que há tarefas que não podem ser feitas por determinadas pessoas;
  3. Vaidade. Quando alguém quer fazer boa figura e assume uma tarefa, mas depois não consegue corresponder por ser, afinal, vazia de conteúdo. Este tipo de pessoa defende-se, habitualmente, com desculpas ou transferindo a culpa do seu falhanço para terceiros.

Se não se quer enquadrar em nenhum destes tipos de pessoas, assuma os seus compromissos de forma realista e, mais importante que isso, cumpra-os. A falta de compromisso é um dos grandes problemas do país e trata-se, acima de tudo, de uma questão de civismo, respeito pelo outro e confiança nos seus pares e no futuro.

Quando é que AGORA vai ser a altura ideal para mudar?

* Autor dos livros “Disse-me um velho marinheiro | um guia para tempos confusos” e “Tudo o que o velho marinheiro não me disse”.