As propostas socialistas são incompatíveis com o Tratado Orçamental e o discurso dos socialistas não é assim tão diferente das propostas do Syriza na Grécia, mesmo não sendo os dois partidos a mesma coisa. É esta a análise feita por Ambrose Evans-Pritchard, jornalista e colunista do Telegraph, um dos mais influentes naquele país e seguido com atenção nos círculos financeiros de toda a Europa.
“Enquanto o PS insiste que é um animal diferente do movimento radical Syriza na Grécia, há uma notável semelhança em algumas das propostas e da linguagem pré-eleitoral. O Syriza também se comprometia em manter as regras da UEM [União Económica e Monetária], enquanto que ao mesmo tempo fazia campanha por medidas que tinham como intenção provocar uma colisão frontal com os credores”, escreve o colunista.
Para o colunista do Telegraph, lido por milhares de pessoas e conhecido pela suas posições heterodoxas (opõe-se frontalmente ao euro e é um crítico das políticas de austeridade), a aproximação do socialista ao Syriza faz-se em boa parte pela linguagem de António Costa, que, na opinião do colunista, tem adoptado uma retórica mais radical. Para o fundamentar, Pritchard dá como exemplos a discussão em torno da privatização da TAP e o acentuar do discurso contra a austeridade e contra o Fundo Monetário Internacional, evolução “que reflete o ambiente cultural dominante no centro esquerda de Portugal”.
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De acordo com Ambrose Evans-Pritchard, é este tipo de discurso que está a fazer soar os alarmes em Berlim. Angela Merkel tem-se colocado ao lado do Governo de Passos Coelho, dando-o como exemplo e, para o analista, o facto de o PS estar à frente nas sondagens e de ter um discurso que pode provocar dúvidas é não só motivo de inquietação como de receio de um contágio vindo da Grécia:
“Os ataques cada vez mais ferozes sobre austeridade em Lisboa são susceptíveis de aumentar os temores em Berlim que vai haver uma quebra na disciplina orçamental e nas reformas no sul da Europa em conjunto, se a Grécia conseguir concessões”. Ou seja, haverá um “risco moral” que é preciso ter em conta nas soluções para a Grécia.
Mas além da linguagem, o problema coloca-se também nos números. Na análise que Ambrose Evans-Pritchard, o cenário macroeconómico do PS “parece totalmente incompatível com o Tratado Orçamental”, uma vez que o país precisa de uma redução da dívida e do défice compatível com as regras e, para o analista, o cenário traçado pelos socialistas podem não respeitar essas limitações.
Pritchard avisa também que o país, apesar de ter “resistido” muito melhor do que a Grécia, “continua vulnerável” e está na linha da frente no contágio caso se grave a crise grega.
Como ponto nevrálgico está não só a dívida pública como o endividamento total da economia: “O endividamento combinado do sectores público e privado está nos 370% do PIB, o mais elevado da Europa. Isso deixa o pais perigosamente exposto aos efeitos da deflação e da estagnação do crescimento nominal do PIB”, escreve Pritchard. Já sobre o sector público, e citando o economista-chefe do Citigroup, o analista lembra que os rácios da dívida estão além do desejável e que por isso o país “precisa de algum tipo de reestruturação” e é esse “medo constante” nos mercados que configura a principal vulnerabilidade do país a uma nova crise da dívida.