E se os nossos erros de percurso, desamores e traumas fossem o ingrediente em falta nos nossos currículos? Um criativo norte americano experimentou fazer um inovador currículo com base nos seus podres, incapacidades erros e falhas. E resultou: 8 respostas e 5 entrevistas em 10 candidaturas.
A arte de escrever um bom currículo tem sido motivo de muita discussão. A missão é clara: escrever um documento sincero, que retrate o nosso percurso, de modo a nos tornar desejáveis à empresa em questão. Basicamente, uma (ou duas) folhas de papel que nos torne memoráveis.
Jeff Scardino, chefe criativo da agência de marketing Ogilvy & Mather e professor da Escola de Publicidade de Miami, encontrou uma forma de se distinguir dos demais. Enquanto a maioria (para não escrever todos) enviaram um currículo que retratava uma versão embelezada do seu percurso, Scardino escolheu promover-se através de 5 categorias: “experiência”, “educação”, “incapacidades”, “objetivos falhados”, “más referências”.
1. “Experiência”
Uma categoria clássica em todos os currículos. Em casos normais, acompanharíamos a indicação da empresa, do cargo e da data de emprego com um ponto alto desse emprego. Scardino preferiu destacar conflitos, negociações falhadas e falta de produtividade. Alguns exemplos:
- “Não produzi nada de valor durante o primeiro ano nesta empresa”
- “Não vendi nenhum spot televisivo”
- “Outras agências ultrapassaram-me ao fazerem alguns projetos premiados”
- “Devia ter sido mais agressivo”
2. “Educação”
Outra categoria clássica. Scardino não quis destacar nenhuma disciplina feita ou apreciações académicas de sucesso. Enquanto universitário, o criativo norte americano ficou com o coração partido, sem amigos e arrependido por não ter ido para outro curso.
- “Namorei com uma ‘rapariga de espírito livre’ que arruinou o meu ano de caloiro”
- “Devia ter estudado Design”
- “Passei mais tempo com amigos do que a terminar créditos do meu último ano de faculdade”
3. “Incapacidades”
Neste formato não houve espaço para promover o nosso “perfeccionismo” ou “adaptabilidade”. É lento? Chega constantemente atrasado? Tem dificuldades na interação social? Este é o lugar.
- “Tenho dificuldade em lembrar-me de nomes”
- “Apesar de parecer, não retiro os melhores apontamentos durante as reuniões. Na verdade, estou a desenhar”
- “Devia ser mais pontual”
- “Levo o meu trabalho para casa e isso irrita a minha mulher”
4. “Objetivos falhados”
Aqui, pode traçar um lado mais sonhador. A banda que formou mas que desistiu a meio, a língua que tentou aprender mas sem sucesso, ou aquela final de futebol em que foi massacrado.
- “Ainda tenho de concluir um livro que comecei a escrever há anos”
- “Nunca consegui ter uma carreira como DJ de rádio”
- “O meu guião não foi além dos quartos-de-final da competição de guionista”
5. “Más referências”
Deixou má impressão durante um emprego ou estágio? Tem alguém que aponte os seus podres, criticando a sua lentidão ou ineficácia? Deixe o contacto dessa pessoa. Ele apontará a percepção que tem de si.
Será que funciona?
Scardino quis testar a eficácia do seu relevant résumé (currículo relevante, em português), tal como o próprio nomeou. De modo a validar o formato, Scardino enviou duas candidaturas diferentes: uma regular e outra adotando o inovador currículo de falhanços, sob identidades diferentes, para 10 vagas de emprego nas áreas de escrita e de comunicação.
a relevant experiment from Jeff Scardino on Vimeo.
Os números não enganam: o currículo regular recebeu uma resposta e nenhuma entrevista, enquanto o relevant résumé recebeu 8 respostas e 5 entrevistas. Qual o segredo deste formato afinal? Scardino acredita que as empresas apreciam cada vez mais conhecer o lado humano dos seus candidatos. A beleza está na “transparência”, “honestidade”, “humildade” e “vulnerabilidade” do currículo, explica o criativo norte americano.
“É este o tipo de mentalidades que quero na minha empresa”
As empresas ficaram surpreendidas. Mesmo aquelas que já tinham uma vaga preenchida queriam conhecê-lo:
“Acabei de receber o teu currículo. Extremamente interessante. Infelizmente, a posição a que te candidataste já foi preenchida. Mas queremos conhecer melhor o teu projeto. Este é o tipo de mentalidade que gostamos de ter aqui”, lê-se numa das respostas que o criativo recebeu.
Outras respostas foram de total aceitação:
“Em primeiro lugar, aplaudo-te. Nunca recebi um currículo como o teu. Vejo centenas de currículos por ano, por isso é uma lufada de ar fresco ver alguém com uma abordagem diferente. Tenho andado a mostrá-lo pelo escritório, e toda a gente está mortinha por te conhecer”, lê-se noutro e-mail.
Interessado em experimentar? Faça o seu aqui.
Texto editado por Rita Ferreira.