A Confederação Nacional da Agricultura afirmou, esta terça-feira, que a construção do armazém de resíduos nucleares em Almaraz “pode ter impactos trágicos” na alimentação se houver um problema e pede ao Governo português e à Comissão Europeia que travem essa possibilidade.

Pode fazer com que essa água que vem do rio Tejo e que constitui um imenso regadio para a agricultura portuguesa e para a espanhola também possa, numa situação de problema sério, ser contaminada por resíduos nucleares, o que seria trágico quer para a alimentação quer para a agricultura portuguesa”, disse o dirigente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), João Dinis, em declarações à Lusa.

João Dinis lembrou que Portugal “produz bons alimentos e com qualidade alimentar” e imaginou o cenário destes “serem contaminados por radioatividade”, reforçando que tal “seria perfeitamente trágico”.

“Pode ter impactos trágicos, já houve pequenos problemas nessa central nuclear (situada junto ao Tejo). E temos exemplos das tragédias que aconteceram com centrais nucleares”, lembrou.

O dirigente da CNA sublinhou que a já a central nuclear é um perigo e “agora este depósito é um perigo acrescido e real”.

Espero que o Governo português e a União Europeia, dialogando com o Governo de Espanha, evitem a todo o custo” que se empurre “para o quintal português lixo nuclear tóxico que [os espanhóis] estão a produzir na sua central nuclear”.

João Dinis afirmou que “se o Governo de Espanha não for travado” não vai querer saber “ou pouco quer saber” daquilo que pode provocar tal construção, dentro de Portugal, e também não está muito preocupado com o pode acontecer aos espanhóis que ali vivem.

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Na segunda-feira, o ministro do Ambiente, Pedro Matos Fernandes, afirmou estar convencido que, “no próximo ano, por esta altura, o diferendo” com Espanha sobre a construção do aterro de resíduos nucleares em Almaraz “estará resolvido” a favor de Portugal.

Segundo o ministro do Ambiente, tendo a queixa sido entregue há uma semana, “é natural que a Comissão Europeia queira [agora] ouvir o Estado espanhol”, sendo, assim, de esperar que “nos próximos 90 dias” nada seja solicitado a Portugal.

Portugal apresentou queixa em Bruxelas contra Espanha depois de os Governos dos dois países não terem conseguido chegar no dia 12 a acordo sobre a construção de um aterro nuclear na central de Almaraz, que Lisboa contesta.

O Governo português defende que no projeto de um aterro de resíduos junto à central nuclear de Almaraz “não foram avaliados os impactos transfronteiriços”, o que está contra as regras europeias.

O processo para a construção do Armazém Temporário Individualizado (ATI) da Central Nuclear Almaraz teve início em 18 de novembro de 2015, quando o diretor-geral das Centrais Nucleares de Almaz-Trillo (CNAT) solicitou a autorização para a construção do armazém de resíduos nucleares, com o objetivo de resolver as necessidades de armazenamento do combustível gasto nos reatores.

A funcionar desde o início da década de 1980, a central está situada junto ao Tejo e faz fronteira com os distritos portugueses de Castelo Branco e Portalegre, sendo Vila Velha de Ródão a primeira povoação portuguesa banhada pelo Tejo depois de o rio entrar em Portugal.

A decisão de Espanha deu origem a protestos, tanto da parte das associações ambientalistas, portuguesas e espanholas, como dos partidos políticos na Assembleia da República.

Contra privatização da água

A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) afirmou ainda que está contra a privatização do recurso água, considerando que tal leva ao seu encarecimento para uso agrícola.

Somos contra a privatização do recurso ‘água’ e a privatização à larga escala da gestão do recurso água”, disse o dirigente da CNA João Dinis, à saída da reunião com o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, em Lisboa.

O responsável frisou que “a água é um bem público de enormíssima importância para a vida das pessoas e para a agricultura” e que o custo da água para rega “tem de ser muito baixo”.

Não houve uma clarificação da parte do senhor ministro, além de dizer que é necessário ter [água] e que a água continua a ser muito barata para uso agrícola (…). O ministro do Ambiente contrapôs dizendo que se tem de ter muito cuidado com o gasto de água por ser um bem escasso.

João Dinis reforçou que com “a mercantilização do bem público água” corre-se o risco de encarecimento deste recurso para uso agrícola.

Na reunião com o ministro do Ambiente, João Dinis disse que também abordou as questões das alterações climáticas e do mercado dos carbonos.

“Constatámos que já está a haver alguma transferência de fundos do Ministério do Ambiente e do Orçamento do Fundo Ambiental para o Programa de Desenvolvimento Rural 2020, que é da tutela do Ministério da Agricultura”, disse.

O responsável disse que perguntou ao ministro “se há um plano B”, ou seja, o que fará o ministério se “não vier” a verba superior a 100 milhões de euros que está “prevista no seu orçamento e que deve vir destes fundos dos carbonos”.

“O senhor ministro dirá que o Orçamento do Estado terá de responder também a esse problema se esse problema se colocar”, disse, acrescentando que “há um plano B, mas é insuficiente” e que “é errado e um perigo mercantilizar-se também o mercado dos carbonos”.

A mercantilização dos carbonos está a caminho de dar mau resultado, já deu, porque está sujeita à especulação e certamente vai dar pior, porque o novo Presidente dos Estados Unidos [Donald Trump] já foi pôr em causa todos os acordos que subscreveram nesta área do controlo dos carbonos e das alterações climáticas”, disse.

João Dinis alertou para o facto de não se saber qual o valor que tal mercado vai ter, uma vez que a política anunciada pelo novo Presidente dos Estados Unidos é a da liberalização completa. O ministro do Ambiente não prestou declarações no final da reunião.