O Grupo Espírito Santo (GES) e Ricardo Salgado constituem a principal razão que levou à constituição de arguido de Zeinal Bava e de Henrique Granadeiro. São os alegados benefícios que estes dois ex-gestores da Portugal Telecom (PT) terão concedido ao grupo da família Espírito Santo que estão na origem das duas diligências que decorreram esta sexta-feira nas instalações do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), localizado na rua Gomes Freire, em Lisboa.

E por que razão esta questão está a ser analisada na Operação Marquês — e não nos inquéritos relacionados exclusivamente com a Portugal Telecom? Por uma razão simples:

  • A partir do momento em que Ricardo Salgado foi constituído arguido por corrupção por alegadamente ter ordenado transferências para Carlos Santos Silva alegadamente a propósito da compra da Oi pela PT, era inevitável chamar Zeinal Bava e Henrique Granadeiro à Operação Marquês.

No centro dessa suspeita estão os alegados pagamentos da sociedade offshore Espírito Santo (ES) Enterprises. Não só Carlos Santos Silva (o alegado testa-de-ferro de José Sócrates) terá recebido cerca de 17,4 milhões de euros que tiveram origem na ES Enterprises, como Hélder Bataglia, o homem que recebeu os tais montantes do saco azul do GES e transferiu os mesmos para as contas de Santos Silva, terá alegadamente incriminado Salgado ao afirmar no DCIAP que teria transferido uma parte desse valor (cerca de 12 milhões de euros) a pedido do então presidente da Comissão Executiva do Banco Espírito Santo (BES).

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Declarações que Ricardo Salgado refuta.

As suspeitas contra Zeinal Bava

Tendo em conta que os negócios da PT e os pagamentos da ES Enterprises passaram a ser centrais na Operação Marquês, Zeinal Bava teria sempre de ser constituído arguido neste inquérito.

No que diz respeito a Bava, o principal crime pelo qual está indiciado prende-se com corrupção passiva (tal como José Sócrates) e a razão prende-se com duas transferências, num valor total de 18,5 milhões de euros, que o ex-presidente executivo da Portugal Telecom (PT) recebeu da Espírito Santo (ES) Enterprises, o famoso ‘saco azul’ do Grupo Espírito Santo (GES) tal como o Observador noticiou, depois do Expresso ter avançado com a notícia do valor total.

‘Saco azul’ do GES fez duas transferências para Zeinal Bava em 2010 e 2011

Bava terá recebido as duas transferências da ES Enterprises da seguinte forma:

  • 10 milhões de euros na segunda metade de 2010.
  • 8,5 milhões de euros nos primeiros meses de 2011.

As datas não são pormenores irrelevante. Ao que o Observador apurou, a investigação da Operação Marquês liga essas transferências as seguintes momentos-chave:

  • 28 de julho de 2010 — O Conselho de Administração da PT anuncia a venda da sua participação de 50% na empresa brasileira Vivo aos espanhóis da Telefónica por 7,5 mil milhões de euros. De acordo com as condições do negócio anunciadas pela PT, a Telefónica transferiu 4,5 mil milhões de euros até setembro de 2010, mil milhões de euros a 30 de dezembro de 2010 e os restantes 2 mil milhões até 31 de outubro de 2011. Dos cerca de 7,5 mil milhões recebidos, cerca de 1,5 mil milhões de euros (que equivale a 20% do total do produto da venda) foram distribuídos pelos acionistas da PT, incluindo o Banco Espírito Santo (BES). Foi igualmente anunciado neste dia pelo Conselho de Administração liderado por Bava que a PT iria adquirir 22,4% do capital da empresa brasileira Oi, concorrente da Vivo.
  • 26 de janeiro de 2011 — A PT e a Oi anunciam o acordo definitivo para a aquisição de 22,4% do capital da Oi e a entrada da empresa brasileira no capital da PT com uma posição de 10% — um negócio avaliado em cerca de 3,5 mil milhões de euros.

A fundamentação para a imputação do crime de corrupção a Zeinal Bava estará relacionada, nomeadamente, com a alegada intenção de satisfazer o BES, acionista da PT que era detido pela Espírito Santo Financial Group — a holding financeira do GES, ao qual pertencia a ES Enterprises.

‘Saco azul’ do GES. Ricardo Salgado ordenou transferências de 18,5 milhões para Zeinal Bava

No âmbito das investigações ao chamado Universo Espírito Santo (a designação que a Procuradoria-Geral da República escolheu para o caso BES/GES), os casos relativos à PT foram autonomizadas em inquéritos específicos. Além da aplicação de 897 milhões de euros em dívida da Rio Forte, também a venda da participação na Vivo e a entrada no capital da Oi está sob investigação.

Resta saber se a compra de dívida será igualmente analisada na Operação Marquês ou se continuará a ser investigada nos inquéritos do caso PT.

Bava foi igualmente indiciado por fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais por o DCIAP encarar os montantes recebidos pelo gestor como rendimentos que, por um lado, não terão sido declarados ao fisco, e, por outro, terão sido alegadamente alvo de uma tentativa de ocultação por parte do ex-líder executivo da PT.

“A maior operação financeira alguma vez realizada em Portugal”

A imputação do crime de corrupção passiva a Henrique Granadeiro acaba por ser a grande surpresa das diligências desta sexta-feira. Tal significa que a equipa liderada pelo procurador Rosário Teixeira tem indícios de que o ex-chairman e ex-chief executive officer da PT terá recebido alegadas contrapartidas do GES.

Granadeiro foi o homem que, enquanto líder do Conselho de Administração da PT, classificou a venda da Vivo à Telefónica e a compra da Oi pela PT como “a maior operação financeira alguma vez realizada em Portugal”.

A Operação Marquês e os negócios (ruinosos) da PT no Brasil

Henrique Granadeiro, ao que o Observador apurou, terá sido confrontado com as origens do negócio de compra da Oi. Tal hipótese surgiu em 2007, quando Granadeiro tinha assumido a liderança executiva da PT e após ter derrotado a OPA da Sonae. Foi o gestor alentejano quem iniciou contactos com Sérgio Andrade, líder da Andrade Gutierrez, e com Pedro Jereissati, chairman da Telemar Participações e representante do Grupo La Fonte/Jereissati.

E foi também Granadeiro que terá contratado o escritório LSF & Associados, de Fernando Lima (advogado que veio a liderar a Sociedade Lusa de Negócios e que é Grão-Mestre do Grande Oriente Lusitano) para ajudar nas negociações com os acionistas brasileiros da Oi. Porquê? Porque o escritório de Lima tinha contactos privilegiados com José Dirceu, ex-braço direito do Presidente Lula da Silva, e que naquela altura ainda tinha muita influência no Partido dos Trabalhadores de Lula e de Dilma Roussef. A PT terá pago cerca de 511 mil euros a este escritório, existindo a suspeita de que Dirceu tenha ficado com parte desses fundos.

O maior problema para a equipa do procurador Rosário Teixeira, contudo, reside em provar a alegada gestão danosa por parte de ex-responsáveis da PT na compra de uma participação minoritária na Oi/Telemar que terá custado 5,4 mil milhões de euros — e não os 3,7 mil milhões oficiais que foram comunicados ao mercado — quando os consultores aconselhavam a PT a adquirir uma posição maioritária na Oi por menos dinheiro do que pagou a empresa portuguesa em 2010.