Eurodeputado em Bruxelas, vereador em Lisboa. O registo de presenças do candidato do PCP à câmara de Lisboa está longe de ser famoso no atual mandato como vereador. A cada três reuniões de câmara, João Ferreira falha mais de uma. Desde o início de mandato e até ao início de janeiro o comunista falhou por 54 vezes sessões de câmara, em 145 reuniões escrutinadas pelo Observador (37,4% de ausências). O eurodeputado falhou mais reuniões que os vereadores que representaram os outros partidos da oposição em Lisboa: Fernando Seara, do PSD, esteve ausente em 39 ocasiões, João Gonçalves Pereira em apenas 6. Menos assíduo que João Ferreira, só mesmo a candidata do PSD, Teresa Leal Coelho, que não esteve presente em 91 ocasiões.

Contactado pelo Observador a pouco tempo de entrar para a sessão plenária em Estrasburgo, onde se encontra em trabalhos como eurodeputado, João Ferreira remeteu esclarecimentos sobre as ausências em Lisboa para mais tarde. Depois, não quis prestar esclarecimentos. Fonte da sua assessoria de imprensa diz ser “redutor” medir a intervenção dos vereadores do PCP pela presença nas reuniões de câmara. Isto porque o PCP “funciona como coletivo” e há muito trabalho fora das reuniões, como visitas a juntas e contacto com as populações. Tirando a parte do coletivo, a social-democrata Teresa Leal Coelho deu explicações semelhantes sobre as suas faltas. Disse numa entrevista ao Observador que “a assiduidade não é bitola para avaliar a qualidade de um vereador” e justificou que não faltava, mas fazia-se substituir.

João Ferreira já é eurodeputado desde 2009, ano em que concorreu nas eleições europeias. Já era quando foi eleito vereador da câmara municipal de Lisboa nas autárquicas de 2013. Em maio 2014, foi o cabeça de lista do PCP às eleições Europeias, e agora volta a ser candidato às eleições autárquicas em Lisboa em 2017. Ou seja: desde 2013, já é terceira vez que João Ferreira será cabeça de lista da CDU, ainda que em duas eleições diferentes. É uma das figuras do partido e foi um dos mais aplaudidos do Congresso quando foram lidos os nomes do Comité Central do PCP.

Teresa Leal Coelho falhou 91 reuniões como vereadora em Lisboa

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Ao contrário de Teresa Leal Coelho, quando esteve presente nas reuniões, João Ferreira — que é um dos dois vereadores da CDU — foi sempre muito interventivo. Logo na primeira reunião, João Ferreira prometeu uma “oposição leal e construtiva” e que não seria “oposição por oposição”.

Os exemplos de intervenções em reunião de câmara são vários e vão desde um elevador avariado à política de promoção de transportes públicos. Na quarta reunião de câmara, a 27 de novembro de 2013, o comunista mostrou-se supreendido pelos “novos encerramentos de espaços comerciais, alguns deles emblemáticos na cidade”. João Ferreira deixou registado o encerramento de espaços como a “Caixotaria Duran, a Adega dos Lombinhos, os Armazéns Ramos, a Associação Portuguesa de Barbearias, ou seja, tudo lojas que ali estavam há mais de cem anos”, lembrando ainda, na mesma semana, o encerramento do cinema King. Para o vereador comunista a câmara não podia “alhear-se àquela realidade”, e que “pensar e gerir uma cidade exigia mais do que deixá-la ao sabor do livro jogo das forças do mercado.”

Noutra reunião, João Ferreira registou “o modo com que o senhor presidente da câmara [ainda António Costa] tinha exortado a Polícia Municipal a atuar no caso do domínio do ruído”, mas advertindo que havia outras matérias que deveriam ser “objeto de uma maior fiscalização” como “o problema dos dejetos caninos na via pública.”

Em várias reuniões, o vereador do PCP alertou para os problemas nos transportes públicos, que disse merecerem “uma intervenção firme“. João Ferreira defendeu “um transporte público de qualidade para a cidade de Lisboa, que assegurasse um serviço efetivo e tivesse uma cobertura completa em todas as zonas da cidade, não descurando os critérios de sustentabilidade, nomeadamente ambiental e outros”. Várias vezes denunciou um “sério ataque” ao “transporte público na cidade e ao direito à mobilidade das populações.”

Também não esqueceu problemas mais pontuais que foram ocorrendo na cidade e que o levaram a questionar, por exemplo, o porquê de “não haver gás nos balneários dos espaços verdes da DMAU [Direção Municipal de Ambiente Urbano], concretamente no Parque Eduardo VII e na Quinta do Contador Mor o que teria levado a que no primeiro caso, do Parque Eduardo VII, os trabalhadores tivessem parado em protesto.”

Na reunião de 30 de novembro de 2016, João Ferreira distribuiu uma proposta de moção sobre o passe social intermodal para toda a Área Metropolitana de Lisboa. Lembrou que este passe tinha sido “criado a seguir ao 25 de Abril” e que tinha sido igualmente uma das “muitas medidas de um enorme alcance social tomadas, visando o bem-estar das populações.” De acordo com o vereador comunista “apesar de inúmeros desvirtuamentos” introduzidos ao logo dos anos, este persistia com um “importante elemento de promoção da mobilidade.”

João Ferreira criticou ainda o facto de, na Área Metropolitana de Lisboa, existir um “sistema de bilhética extremamente complexo, fruto de uma política que tinha apostado na multiplicação de títulos”, alertando para a existência de “mais de dois mil de tipos de bilhetes e de passes no conjunto da Área Metropolitana de Lisboa.” Isto ao mesmo tempo que se reduziu a oferta. Por tudo isso, o PCP estava a desenvolver uma iniciativa que pretendia garantir que com um mesmo passe intermodal, ou com um mesmo bilhete, se pudesse circular em toda a Área Metropolitana de Lisboa em todos os operadores.

Nessa mesma reunião, João Ferreira perguntou se a câmara já tinha escolhido o sítio ao qual iria atribuir o nome da Constituição de 1976, já que em abril de 2016 o executivo tinha aprovado uma moção em que se decidira dar esse nome a uma “artéria, praça ou jardim da cidade de Lisboa.” Estas são apenas algumas das centenas de questões que João Ferreira levantou em reuniões de câmara.