A violação dos direitos de autor nos conteúdos disponibilizados online afeta diretamente o comércio legal (e físico) desses mesmos conteúdos? A resposta é “inconclusiva”, diz a Comissão Europeia (CE) sobre um estudo encomendado em 2014 e que está agora a ser posto em causa pela eurodeputada Julia Reda.

A eurodeputada alemã, uma das principais vozes europeias em defesa da pirataria, diz que esta questão é “fundamental” e que tem “implicações profundas sobre direitos de autor” e sobre as formas como a legislação é aplicada nesse sentido.

Em causa está um estudo encomendado pela CE à empresa holandesa Ecorys por 360 mil euros, escreve Julia no seu blog. A abordagem dos resultados é diferente para as duas partes, mas Julia acusa a CE de nunca ter publicado o estudo (que terá sido entregue em maio de 2015).

O estudo com 300 páginas foi entregue à Comissão em maio de 2015, mas nunca foi publicado. Até hoje – eu arranjei maneira de ter acesso a uma cópia”, escreve Reda

Contudo, uma porta-voz da CE, Lucia Caudet, explica ao Observador que não houve ocultação: “Nós próprios enviamos o estudo completo a Julia Reda porque o requerimento [dela] de acesso aos documentos estava a demorar demasiado tempo para processar”.

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Julia preencheu um requerimento a 27 de julho para aceder ao estudo através da legislação europeia que garante a liberdade de informação.

A eurodeputada garante que o estudo conclui que “não há evidências que suportem a ideia de que a violação dos direitos de autor online desloca vendas”, mas alerta que essa conclusão não tem em conta os filmes blockbusters lançados recentemente.

E é exatamente por aí que a CE pega para responder às acusações de que manteve o estudo “numa prateleira”, como escreve Reda. “Este estudo académico forneceu estimativas sobre a assim chamada taxa de deslocamento de violação de direitos de autor”, começa por explicar a CE num email enviado ao Observador. “Em parte alguma os resultados questionam os efeitos da pirataria na venda de conteúdos protegidos por direitos de autor”, elabora a porta-voz.

Pelo contrário, os resultados mais relevantes deste estudo concluem que, pegando numa pequena amostra do top 100 de blockbusters em seis países, quase metade (40%) dos filmes vistos ilegalmente teriam gerado vendas legítimos se o conteúdo ilegal não tivesse sido disponibilizado.”

A CE responde ainda a Julia Reda, dizendo que afirmar que “não há evidências” de que as pessoas preferem consumir conteúdos de forma gratuita (mas ilegal) ao invés de os comprar é “incorreto”. Aliás, “para outros conteúdos além dos top 100 de blockbusters, o estudo foi estatisticamente inconclusivo” mas que os estudos e metodologias clássicos “colocam a taxa de deslocação na ordem dos 50%”.

O estudo em questão pode ser consultado na íntegra aqui.

A lógica é que se os utilizadores têm acesso a conteúdos disponibilizados na internet de forma gratuita – apesar de ilegal – abstêm-se de os comprar e consumir legalmente. Julia Reda diz que uma coisa não implica a outra. A posição da CE é clara: a pirataria afeta diretamente possíveis vendas legais.

De qualquer das formas, a CE garante que um sumário dos resultados do estudo esteve sempre disponível online e que um relatório final foi publicado. Julia Reda defende que informações “como esta, valiosas tanto financeiramente como em termos de aplicabilidade, devem estar disponíveis para toda a gente quando são financiados pela União Europeia – não devem ficar a acumular pó numa prateleira até que alguém os requer ativamente”.

A eurodeputada escreve ainda que a alegada ocultação do estudo está relacionada com as duras políticas europeias face à pirataria online, e dá como exemplo a mais recente proposta (da CE) de exigir que as operadores instalem filtros de conteúdo para supervisionar todo o conteúdo que é carregado pelos utilizadores.