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“Descrença total”, receio de dar dinheiro aos partidos mediante o voto depositado na urna e a desconfiança generalizada nos partidos e nos perfis são alguns dos motivos que fazem com que muitos eleitores ainda não saibam em quem vão votar. São os chamados indecisos e, segundo algumas sondagens, representam cerca de 20% da população portuguesa. Serão os verdadeiros protagonistas das eleições legislativas de 4 de outubro e é neles que tanto a coligação Portugal à Frente como o PS estão centrados.

Mas porque é que não sabem se vale a pena ir votar? E porque têm dúvidas em sobre qual é o partido que os representará melhor? E o que os ajudaria a tomar uma posição?

As razões dos indecisos

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Muitas pessoas alegam que a proximidade entre os dois partidos e a dificuldade de uma clara maioria – e possível necessidade de coligações pós-eleitorais -, as deixa divididas entre o voto útil, ou seja, contribuírem para uma força política do arco da governação ou votarem num pequeno partido que pode eleger poucos ou nenhuns deputados. “Ainda não consegui decidir se vou optar pelo chamado voto útil, ou escolher um partido que se aproxime mais daquilo que acredito que o país precisa, mesmo sabendo que não terá possibilidade de chegar ao Governo”, disse ao Observador um dos 20 indecisos inquiridos. A falta de alternativa à esquerda, assim como a pouca distância ideológica entre o PS e a coligação, são também causadoras do sentimento de falta de alternativa nos indecisos.

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Após 39 anos de eleições legislativas, as promessas dos partidos convencem cada vez menos os eleitores. “As promessas que seduzem o voto nunca são cumpridas”, acusa um dos indecisos que falou com o Observador – falámos com pessoas dos dois sexos e em diferentes faixas etárias. O discurso dos partidos, segundo os inquiridos, parece estar afastado da sua prática e essa lembrança torna-se mais clara em momentos de campanha eleitoral, em que as promessas servem de bandeira. “Há uma elevada probabilidade de não correspondência entre as medidas propostas nos programas eleitorais e as medidas efectivamente concretizadas aquando da governação”, afirma outra inquirida. “Precisaria de alguém coerente que apresentasse propostas tal e qual como elas são independentemente dos interesses eleitorais. “Precisaria de alguém que transmitisse uma verdadeira vontade de mudança e evolução sem promessas vazias, mesmo que isso implicasse medidas menos positivas“, afirma outro dos indecisos.

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Mais do que os próprios partidos, parece que um dos fatores que mais contribui para a indecisão no eleitorado português, são as figuras que dão a cara pelas forças políticas. Desconfiança, falta de credibilidade, “fraqueza” na afirmação das suas ideias e dúvidas sobre a competência para exercer o cargo de primeiro-ministro são alguns dos pontos levantados pelos inquiridos pelo Observador. Há ainda a questão da coragem. “Acho que ninguém tem ideias novas ou coragem para dizer que vai fazer o que de facto vai fazer quando lá chegar”, disse outro dos inquiridos. Uma das pessoas que relatou as suas dúvidas ao Observador disse mesmo: “Nenhum líder partidário me inspira confiança enquanto potencial PM, até pelas escolhas paupérrimas de quem os acompanha na liderança“.

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Esta será a raiz de todos os problemas falados acima. A crescente desconfiança no sistema político, é “uma característica geral”, alega o politólogo António Costa Pinto. “É esta grande desconfiança que faz com que pontos como a conjuntura no mês que antecede as eleições ou a personalidade do líder, se tornem tão importantes”, alega o investigador do ICS. Um dos indecisos que falou com o Observador disse mesmo que ainda não sabia se votaria ou não porque o seu voto significa maior financiamento para os partidos, já que estes recebem dinheiro para a campanha mediante o número de votos recebidos nas urnas. “Ainda nem sei se vou votar até não quero alimentar estruturas partidárias que pouco ou nada me representam com o dinheiro que o meu voto vai dar [em termos de subvenções] aos partidos”, afirmou. Segundo os resultados do último Eurobarómetro – que data de julho de 2015 -, 76% dos portugueses não confiam no Governo e 72% não confiam no Parlamento, números acima da média europeia.

Os desbloqueadores da decisão

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A polémica sobre os debates, com avanços e recuos por parte dos partidos, não afasta a vontade de ouvir melhor o que os partidos e os seus candidatos têm a dizer. Para vários inquiridos pelo Observador, os vários confrontos diretos entre os candidatos serão momentos que podem influenciar a sua decisão final. Para um dos inquiridos que afirma ser de centro-direita, “a profundidade e seriedade com que os políticos discutirem os problemas do país” pode desbloquear a decisão até dia 4 de outubro. Uma outra opinião recolhida pelo Observador de uma eleitora que é militante do PSD mas não concorda com a coligação pré-eleitoral com o CDS e com o programa, diz que os debates podem esclarecer. “Vamos ver o que debates trazem, gosto de política e estou atenta ao que se passa”, diz a inquirida.

António Costa Pinto considera mesmo que há uma correlação entre os debates e o destaque dado às campanhas nos meios de comunicação e a participação eleitoral. “É aqui que a personalidade do líderes e personalização dos candidatos a primeiro-ministro têm sido mais importantes”, confirma o investigador.

No Reino Unido, o projeto de investigação Qualitative Election Study of Britain analisou nas eleições de maio deste ano as reações de grupos de pessoas que viram os debates e de grupos de pessoas que viram apenas a cobertura mediática dos debates. As investigadoras Kristi Winters e Edzia Carvalho concluíram através desta experiência que quem viu os debates disse ter “aprendido”, descrevendo um estado de “satisfação”, enquanto que quem apenas viu a cobertura mediática manteve uma “postura negativa e cínica” face aos debates. Entre os pontos negativos referidos pelos dois grupos e que as investigadoras recomendam que sejam melhorados, estão as trocas de ataques pessoais entre os candidatos, a repetição das ideias em debates diferentes, os debates com muitos candidatos não são esclarecedores e alguns líderes parecem ter ensaiado as frases que vão dizer. Já em termos de resultados positivos, as duas investigadoras referem que “quem não consultou os programas dos partidos ficou a conhecer as propostas” e foi “uma forma de envolver as pessoas”. A maior parte das pessoas que participaram neste estudo afirmou que os debates são importantes e se devem manter.

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A insistência dos partidos em temas de Economia e Finanças não parece estar a ajudar os indecisos. Uma das pessoas inquiridas pela Observador disse que seria importante falar sobre questões como cultura ou educação. “Sinto a necessidade de assistir a um discurso mais completo e alargado a outros tópicos e sobre outras políticas, além das financeiras e económicas, por exemplo sobre a cultura, educação, saúde e investimentos específicos”, alega o indeciso, referindo que há medidas que um Governo poder tomar “que estão menos dependentes das questões financeiras”. O emprego é também um tema que interessa aos indecisos, especialmente um plano de emprego a longo prazo. Uma indecisa diz mesmo que “uma política de emprego a longo prazo e sustentável” vai ser essencial na altura de escolher em quem vai votar, identificando-se como pertencendo ao centro-esquerda. Também uma maior discussão sobre temas como euro ou Europa é um pedido dos indecisos já que a crise da imigração e o futuro político da União Europeia fazem manchetes em todo o mundo.

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O medo de uma vitória da coligação ensombra a escolha de muitos indecisos, mas ao mesmo tempo, muitos estão à espera para ver o que o PS vai fazer durante o período de campanha – “Indefinição no PS é o factor chave”, indicou um eleitor que ainda não sabe em quem vai votar. Apesar de António Costa ter decidido enviar missivas diárias aos indecisos, muitos inquiridos pelo Observador que dizem situar-se no centro-esquerda querem ver o secretário-geral do PS tem a oferecer, especialmente num cenário que não lhe dê maioria absoluta. “PS é verdadeira alternativa? Há incerteza quanto à solução governo se não tiver maioria absoluta. Se coliga à esquerda ou direita”, afirmou um dos inquiridos. E há pontos que o PS pode aproveitar: “Dar mais confiança na gestão da dívida e na vontade de fazer verdadeiras reformas poderia inclinar-me para votar PS”.

Segundo António Costa Pinto, apesar de os indecisos não terem uma relevância maior nesta eleição do que em outras, o facto de a coligação estar a recuperar face ao PS, faz com que António Costa olhe para os indecisos com maior atenção, reforçando a necessidade de os cativar. Os eleitores parecem corresponder mostrando-se intrigados pelos próximos passos do socialista.

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Para os eleitores mais jovens com quem o Observador falou, uma das principais reivindicações é que não conhecem as propostas concretas dos partidos para o futuro, nomeadamente no que diz respeito a uma política direcionada aos mais jovens. Embora o fosso entre a política e os jovens seja conhecido em Portugal, nomeadamente na participação da vida política e abstenção, estes jovens também admitiram que um dos seus principais motivos de indecisão se prendia com o facto de não terem lido os programas eleitorais. “Não li convenientemente, ainda, os programas de cada partido”, admite uma das jovens eleitoras com quem o Observador falou. Apesar do desconhecimento, todos os jovens eleitores indecisos afirmam ter votado nas últimas europeias e situam-se politicamente entre o centro e a esquerda. Caso também considere que não conhece as propostas dos partidos, consulte o guia eleitoral do Observador, com as principais medidas das forças políticas, e tenha acesso aos programas dos partidos.

Quem são os indecisos?

Para António Costa Pinto, os indecisos são em muito menor número do que aqueles que dizem não saber em quem votar. “Na realidade, a maior parte dos indecisos já tem ideia em quem vai votar. São normalmente pessoas que já votaram no PS ou no PSD e raramente se abstêm”, descreve o politólogo – a maior parte das pessoas que falou com o Observador disse ter votado nas eleições europeias em maio de 2014, embora alguns tenham referido que votam em branco. Embora a percentagem de indecisos varie consoante as sondagens, tanto em 2011 como em 2015 – até agora – os números situam-se à volta dos 20%:

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Este indicador faz com que Costa Pinto não considere que houve um agravamento no número de indecisos após os últimos quatro anos, considerando que o maior dilema para os indecisos é votarem num partido do centrão (PS ou coligação) ou optarem por não votar de todo, já que os eleitores que vão dar o seu voto aos partidos mais pequenos, já terão decidido.

Pedro Magalhães, investigador do ICS, analisou no seu blog alguns indicadores depois de Luís Montenegro, líder da bancada parlamentar do PSD, dizer em entrevista ao Expresso que “a coligação tinha mais potencial de crescimento entre aqueles que ainda não decidiram em quem votar”. Olhando para vários estudos de intenção de voto pós-eleitorais, o politólogo concluiu “que as diferenças entre os ‘early deciders‘ e os ‘late deciders‘ nunca foram dramáticas, e nem sequer em 2002 serviram para mudar o desfecho principal. Em suma, está por provar que os tais ‘indecisos’ sejam tão decisivos como muita gente parece pensar”.