Antigamente, os artistas e escritores eram as únicas pessoas que podiam levar o trabalho com eles enquanto viajavam. A Costa do Sul da França e as Caraíbas parecem ter estado cheias de escritores na primeira metade do século 20 a enviar os textos pelo correio e por telegrama.
Hoje, não são apenas os escritores. Além dos “criativos” (e há muitos), há outras profissões onde é possível trabalhar à distância. Por exemplo, os advogados, os tradutores, os vendedores digitais e os “developers” de software, muitos deles podem hoje ser trabalhadores-nómadas. Alguns passam uma parte do ano a viajar, levando o seu computador com eles. Trabalham um par de meses num lugar, e depois noutro, ou voltam a casa. Há quem mude permanentemente de sítio, sempre à procura daquele onde o estilo de vida é melhor. Esse “melhor estilo de vida” é normalmente definido por ser mais barato, mais lento e mais quente. Já que Lisboa está cada vez mais no radar mundial da moda, ela é, claro, um novo alvo para os trabalhadores-nómadas.
Estes visitantes de longo prazo trazem com eles novas perspectivas (e, por vezes, dinheiro), e num lugar que pode ser descrito como “um bocadinho preso a velhos hábitos” como Portugal, isso é uma coisa boa. Normalmente.
Neste momento, Lisboa está a encher a uma taxa acelerada com jovens criativos e hip/cool/fixe. Um multidão de pessoas que não conhecem Lisboa, nem têm por ela qualquer estima especial, estão a chegar, apenas porque Lisboa é barata, lenta e quente… e cool, por causa dessa coisa de estar na moda. Pergunto-me se este grande fluxo de gente que vem por causa da barateza, da lentidão, do calor e da coolness trará nova energia e riqueza à cidade, ou pura e simplesmente irá diluir aquilo que Lisboa tem de especial. Uma grande parte dos seus rendimentos e impostos vão para outros países. Estarem cá ao mesmo tempo que não estão cá (porque nunca se vão tornar Lisboetas, nem nunca aprenderão bem a língua ou a cultura) separa-os da cidade e do país.
Muitas vezes queixo-me dos meus compatriotas que são incapazes (ou teimosos ou antipáticos ou simplesmente burros) de aprender português. Como podem-se sentir em casa sem um entendimento básico do que está a acontecer à volta deles? Como se podem queixar com tanta energia de um problema e ao mesmo tempo não terem a mínima ideia do que possa ser a causa desse problema? Gostava de poder decretar uma lei que obrigasse qualquer estrangeiro em Portugal a viver numa aldeia remota durante cinco anos antes de se mudar para Lisboa, de modo a ser obrigado a falar a língua. Infelizmente não posso ser Primeiro Ministro nem Presidente da República e portanto nunca haverá essa lei.
Se aceitamos que o facto de os estrangeiros passarem por cá é uma coisa boa (e mais vale aceitarmos, porque Lisboa está na moda), há uma coisita de nada que Lisboa pode fazer para integrar melhor os estrangeiros. Já sei que o vão negar fortemente, mas o facto é que é muito, mas mesmo muito difícil fazer amizades em Portugal quando se é estrangeiro (sim, sei que até também pode ser bastante difícil mesmo quando se é português) Um estrangeiro pode ter colegas e conhecidos, mas amigos genuínos, não. Há muita gente que ainda está agarrada ao mito de que os portugueses são as pessoas mais amigáveis e mais simpáticas do mundo. Mas não são. Muitas vezes, os estrangeiros em Portugal são tratados como suspeitos, ou como pássaros exóticos (quando já não são exóticos). E o pior é quando somos automaticamente tratados como ricos, só por termos chegado do norte da Europa.
Um amigo britânico, que está cá em Portugal já há muitos anos sugeriu-me uma solução, que me parece uma ideia bonita: Lisboeta, adopte um estrangeiro!
Adoptar estrangeiros e criar amizades genuínas com eles (não entrem em pânico, não tem de ter um em casa a chamá-lo “mãe”) pode ajudar os bons a ficarem por cá e tornarem-se residentes integrados, contentes, produtivos, e a pagar impostos neste país (pensem do dinheiro!!). E por terem amigos como deve ser, talvez os estrangeiros tenham mais incentivo para conhecer a língua, a cultura (muito mais longe do Pessoa básico, do Fado básico e das sardinhas básicas), porque vão querer conhecer-vos a vocês como deve ser. Desse modo, Lisboa poderia acabar por não ser feita de mini-enclaves de estrangeiros, mas uma cidade com estrangeiros interessados, envolvidos, que têm algo para oferecer, e que finalmente irão perceber que Lisboa é muito mais do que apenas uma cidade barata, lenta e quente.
(Traduzido do original inglês pela autora)
Adopt a foreigner!
It used to be that the only people who did or could travel about the world to work were artists and and writers. Think of the first half of the twentieth century when the French Riviera and the Caribbean were probably chock full of foreign writers, filing their copy via post and telegram. They didn’t have to be in an office in the city, waiting for their clients to call on them.
Now, it’s not just the artists and writers. As well as the creative lot (and there are a LOT of them) there are plenty of other professions now working remotely. Lawyers, translators, digital shop owners, software developers are just some of the now nomadic workers of the world. Some are spending a part of their year travelling, taking their laptop with them. They set up shop for a couple of months in a city and then move on or go home. Others are setting up home more permanently in places they deem there to be a better way of life. That “better way of life” is usually determined as cheaper, slower and warmer. Now that Lisbon is so much more on the fashionable radar of the world, it is, of course, a new target for the nomads.
These long term visitors are bringing different perspectives with them (and sometimes money), and in what can still be a stubbornly set in its ways kind of a place, that can only be a good thing. Normally.
Right now, Lisbon is filling up with the young and the hip and the creative at an alarming rate. A vast bunch of people who have no understanding or love or connection or belonging to Lisbon who are coming here because of the cheapness, the slowness, the warmness, and now the coolness, because of Lisbon’s current fashionability. I wonder if this huge and rapid influx of people who are here just for the cheapness, warmness and slowness, will lend not new energy and wealth, but merely a dilution of Lisbon. Much of their income is generated and taxed outside of the country and their being here but not really being here (by never really becoming Lisboetas, never learning the language nor the culture to any significant degree) divides them from the rest of the city and the country.
I often rail against my compatriots who are incapable (or stubborn, rude or maybe just too thick) of learning Portuguese, How can they ever feel like they are home without a basic understanding of what the hell is going on around them? How dare they so happily complain about a problem when they have no interest in where that problem might stem from? I wish I could pass a law that said you can move to Lisbon only after you have lived for five years as the only foreigner in a remote village thereby having to learn the language, but as I will never get to be president, that’s not going to happen.
So, assuming that foreigners moving to Lisbon is a good thing (we may as well accept that it is, since Lisbon is so very fashionable) there is a teensy something that Lisbon could do towards their integration. You will most likely vehemently deny this, but it is incredibly hard to make friends in Portugal if you are from the outside. Hell, it can be pretty hard to make friends in Portugal even if you are Portuguese. Acquaintances, colleagues, yes, but genuine friends, no. Many of you still hold onto the myth that the Portuguese are the friendliest and most welcoming of people in the world. You are not. So often, foreigners of any kind are treated with suspicion, or as exotic birds (until they lose their exoticism, then all bets are off). The worst is when we are treated as being automatically wealthy, just because we came from Northern Europe.
A British friend of mine, who has been here almost as long as me, suggested a solution to all of it and he may be onto something.
Lisbon, adopt a foreigner.
Adopting foreigners and actually befriending them (no, don’t panic, you don’t have to have one in your house, calling you mummy) might help the good ones stay and become integrated residents, be happy and productive and more likely to move their tax affairs to this country (think of the money!), and by becoming their genuine friend, you might help to give them the impetus to learn the language and culture (beyond basic Pessoa and Fado and sardines) because they will want to get to know YOU properly. Then Lisbon might end up not becoming many mini-enclaves of foreigners, but a city with interested, involved foreigners who have something to offer and who will discover that Lisbon is so very much more than just cheap, warm and slow.
Go on, Lisbon. You can do it.