Sexta-feira, quando as televisões iniciaram os directos do encontro que reuniu, no Ministério da Saúde, os especialistas que têm vindo a estudar o surto da Legionella para apresentarem os resultados dos vários estudos epidemiológicos feitos, eu nem quis acreditar. Em vez de um espectáculo mediático semelhante àquilo em que se transformaram muitos dos eventos promovidos pelos nossos políticos, aquilo a que assisti foi um exercício quase ingénuo de transparência, rigor e sinceridade. Na sala, algo acanhada, estavam dezenas de pessoas, entre técnicos e cientistas, altos responsáveis da Administração Pública e dois ministros, o da Saúde e o do Ambiente. Nada parecia ter sido ensaiado ou treinado – houve mesmo momentos em que quem estava a falar se afastava do microfone para ir explicar qualquer coisa num quadro e a sua voz deixava de se ouvir.
Chegou a parecer amador, mas gostei do que vi e ouvi. Melhor: precisamente por ter sido assim, autêntico e franco, gostei do que vi e ouvi.
Vamos ser claros. O surto de Legionella tinha tudo para correr mal, muito mal mesmo. Pela dimensão que assumiu, pois foi o terceiro maior surto de que há registo em todo o mundo. Por ocorrer numa zona densamente povoada. Por a bactéria assassina ser evasiva e difícil de detectar. Por ser muito fácil instalar-se o pânico quando se trata de questões de saúde. Mas não correu mal, porque se reagiu e se trabalhou bem.
Num país demasiado habituado a dizer mal de tudo e todos e a desmerecer as suas instituições, é bom que se sublinhe que houve uma boa resposta do poder político, que os serviços públicos estiveram à altura e que as infraestruturas de saúde souberam responder com competência e humanidade.
Aquela estranha conferência de imprensa foi, de alguma forma, o espelho de como tudo acabou por correr pelo melhor.
Nela ouvimos os responsáveis de diferentes departamentos dos ministérios da Saúde e do Ambiente que, desde que o primeiro caso foi detectado, estiveram no terreno a tentar identificar o foco, a seleccionar as medidas a tomar e a tratar dos doentes. Puderam expor o que fizeram e as conclusões a que chegaram com uma segurança que tranquilizou quem os ouviu. Percebemos como foi feito o estudo epidemiológico e percebemos como tinha ocorrido, nos dias em que a infecção se propagou, um fenómeno meteorológico raro. Foi assim possível perceber que já era possível tranquilizar as populações, que a origem do problema estava detectada, que o surto estava controlado. Não foram os políticos a dizê-lo, foram os responsáveis técnicos. Isso foi bom. Ninguém quis protagonismo alheio.
Nela voltámos a perceber que Frederico George, com a sua barba antiquada, o seu ar de ursinho de peluche ou de Ewok da Guerra das Estrelas, tem tanto de anti-mediático como de eficaz, pois recusa a facilidade dos sound bites e das certezas para consumo rápido, dizendo o que tem a dizer com o único objectivo de informar e aconselhar com correcção, sem alarmismos nem triunfalismos.
Nela também pudemos apreciar, de novo, a forma serena, mas atenta e eficaz, como o ministro da Saúde, Paulo Macedo, acompanhou de perto a crise, transmitindo à opinião pública a percepção de que havia alguém a preocupar-se e a mobilizar os recursos necessários, sem nunca ter de se por em bicos de pés. Moreira da Silva, a seu lado, também esteve no registo certo.
Uma crise como a que vivemos, até pelo número de vítimas que fez, terá sempre sequelas e obrigará sempre ao apuramento de responsabilidades. Não se deixará de verificar se, mesmo assim, houve alguma falha nos dispositivos públicos. Mas também nos diz alguma coisa sobre a segurança com que tudo foi tratado o pouco impacto público do histerismo oportunista do Bloco de Esquerda, que quis ver a origem do mal numa lei sobre inspecções à qualidade do ar no interior de edifícios quando o mal se propagou a partir de dispositivos exteriores.
Numa semana em que descobrimos que alguns altos quadros do Estado estão envolvidos em escândalos de corrupção, é bom e é reconfortante verificar como noutros organismos da administração se trabalhou bem, depressa e com um profundo sentido de serviço público, de serviço à comunidade. Ainda bem.
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