Há manhãs em que não gostaríamos de acordar. Há manhãs dolorosas em que, ainda que sem surpresa, se conjuga o pior dos mundos e se precipitam todos os cúmulos e outras nuvens negras que adivinhávamos no horizonte.

Ontem foi a exame um Governo que aplicou um inédito plano de 4 anos de austeridade “custe o que custar” e o povo deliberou, face às alternativas apresentadas, que a coligação PSD-PP continuava a ser o agrupamento politico preferido.

Como foi possível chegarmos a esta manhã? Há um ano alguns pensariam que, o aumento de desemprego, o corte de salários e pensões, o aumento de impostos, a emigração coerciva e a falta de uma visão explicitada para o país seriam argumentos mais do que suficientes para o principal partido da oposição convencer os eleitores e suplantar a coligação. Dizia-se que, mesmo abstraindo das questões ideológicas (a retracção das funções sociais, a insistência em reformas estruturais liberalizadoras, o ataque à administração pública, a ausência de uma política europeia, etc), o impacto das políticas do Governo na vida dos portugueses, com sacrifícios enormes e sem réstia de preocupação social, teria como corolário lógico que o PS ganharia as eleições.

Para mais, o PS tinha feito o seu trabalho e até determinado ponto afirmou-se como alternativa. Por isso ninguém acreditaria há um ano na manutenção deste governo. O PS teve uma vitória histórica de 150 Câmaras em 2013 e venceu as Europeias de 2014 pelo que havia um ciclo político vitorioso. Agora interrompido. Com estrondo.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Na noite passada perdeu-se uma oportunidade de mudar de políticas. O PS não esteve à altura das suas responsabilidades e falhou na capacidade de afirmar uma alternativa política. Portugal não teve confiança neste PS.

Apesar de alguns malabarismos de linguagem iniciais, ontem ficou claro que o PS perdeu as eleições e ficou muito aquém de todos os objectivos apresentados.

Terão falhado muitos aspectos e não foram nem os episódios dos cartazes nem as deficiências de organização que levaram ao descalabro. Esta história feia começou mal e tropeçou nas últimas semanas numa estratégia incompreensível e desgarrada do entendimento dos cidadãos. Os portugueses nunca quiseram um PS radical, do contra pelo contra e cego à realidade do país. A derrota do PS é a derrota de uma linha e de uma prática políticas, não é um qualquer amuo momentâneo dos eleitores.

E que consequências se retiram dos resultados destas eleições legislativas? Para o bem e para o mal, a coligação ficou com a obrigação de governar.

Pelo lado do PS, há a recordar o que constava da moção de orientação política com que António Costa ganhou o partido e que constitui a única orientação legítima. Consta logo do primeiro ponto do documento aprovado pelo Congresso: “O Partido Socialista apresentar-se-á ao eleitorado nas próximas eleições legislativas com o objectivo de alcançar uma maioria absoluta na Assembleia da República. Essa é uma condição necessária…”. Este mandato caducou ontem.

Para voltar a ter legitimidade plena, o PS necessita de fazer de imediato uma reflexão profunda sobre o processo e decidir a nova linha política.

Economista