“Não há acordo sobre nada, enquanto não houver acordo sobre tudo”. Foi esta a posição do PS perante o compromisso de salvação nacional, pedido pelo Presidente da República há um ano. Resultado: não houve acordo ou compromisso. Cavaco Silva, ainda assim, nunca desistiu de pedir um entendimento. No último Conselho de Estado chegou mesmo a conseguir que os conselheiros – incluindo Passos Coelho e António José Seguro, personagens do acordo falhado – concordassem em “exortar” ao diálogo. O líder do PS vetou, contudo, a expressão “interpartidário”, que remetia precisamente para essa tentativa de acordo que agitou a política no quente julho de 2013.
Um ano depois do acordo falhado, o Observador revisitou as propostas do PSD e do PS para ver afinal onde houve (se houve) compromisso.
Os documentos estão cheios de intenções e objetivos. Alguns são mais vagos e outros até já foram ultrapassados pela própria realidade. A grande parte dos pontos que o PSD inscreveu na sua proposta de compromissos acabou por ser assumida pelo próprio Governo… sozinho.
REFORMA DO ESTADO
Pode dizer-se que está em curso e ao mesmo tempo que está adiada para tempo incerto. Há dois relatórios feitos pelo vice-primeiro-ministro, que até falou com os partidos, entre eles o PS, e os parceiros sociais. Mas ainda não passou disso mesmo.
Redução pelo lado da despesa
“Os partidos consideram que o esforço de consolidação orçamental necessária para cumprir os compromissos, deve ocorrer preponderantemente do lado da despesa estrutural”. Basta recordar o último aumento de impostos, com o aumento da TSU para os trabalhadores e do IVA para justificar que não aconteceu.
Compromisso nacional para o crescimento e emprego
Existe um: o acordo tripartido da concertação social. Desde aí, houve muita conversa, mas pouco compromisso. O PSD queria um compromisso nas áreas da qualificação de trabalhadores (não foi feito); para o financiamento das pequenas e médias empresas (não mudou muito desde há um ano). Neste ponto, defendia-se um diálogo sobre os fundos estruturais (ver em cima). Neste compromisso estava ainda a eterna questão da redução de custos de contexto do investimento e da ajuda à internacionalização das empresas portuguesas.
reforma da Segurança Social
Foi a área onde o Governo mais mexeu e onde falhou mais o sítio onde queria mexer. O PSD pedia uma “análise dos montantes das contribuições e os montantes das pensões, os anos de contribuição, a forma de cálculo das pensões e uma projeção sobre a esperança média de vida”. O fator de sustentabilidade da Segurança Social até foi agravado e a idade da reforma aumentada para 66 anos, mas não foi feita a redesenhado o esquema de repartição que era defendido. Até porque não foi conseguida a convergência dos regimes de pensões da Caixa Geral de Aposentações e da Segurança Social para os atuais pensionistas (o Tribunal Constitucional só aprovou para futuro). Ainda sem ter saído do plano das intenções ficou o plafonamento das pensões e indexação à massa salarial.
FIM DO PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA
São vários os pontos sobre o fim do programa de ajustamento sobretudo no que toca a lançar as “medidas necessárias para que Portugal possa regressar em pleno aos mercados em 2014”. Nas propostas sociais-democratas, era defendido o apoio parlamentar dos três partidos às medidas para cumprir o programa e ainda a inclusão do PS nas avaliações regulares da troika. Não aconteceu. Os socialistas ainda foram pedindo reuniões às missões técnicas, mas não chegaram a fazer parte das reuniões de avaliação. Mas o Governo concluiu o programa.
Apoio na sequência de chumbos do TC
O PSD tinha como intenção conseguir não só o apoio para as medidas já acordadas, como para aquelas que substituíssem as que foram chumbadas pelo Tribunal Constitucional. Antes disto ainda não sabia os chumbos que se seguiram. Em nenhuma das respostas teve o apoio do PS.
Dívida
O PS ia mais longe e pedia uma renegociação maior das condições: “Afigura-se essencial a renegociação das maturidades dos empréstimos concedidos por credores oficiais, o diferimento do pagamento dos juros e a redução das taxas de juro, para garantir a sustentabilidade da dívida pública”. Ainda hoje o faz – Seguro pôs o assunto em cima da mesa na reunião do Conselho de Estado na semana passada. O PSD ficou pela defesa da “revisão da trajetória do défice orçamental e da dívida pública, da substituição de medidas”, sem implicar o aumento do défice.
Reforma do IRC
Foi a última reforma feita em acordo entre PS e Governo e a proposta final nem foi fácil de alcançar. Já fazia parte das propostas de compromisso de salvação nacional e foi a única concreta entre os temas que os dois falaram.
Fundos estruturais
Ambos os lados concordam que “os fundos do próximo quadro comunitário de apoio devem ser prioritariamente dirigidos para o reforço da competitividade da economia e assumir preferencialmente natureza reembolsável” e já falaram sobre isso, mas o assunto ainda não terminou.
Banco do Fomento
A ideia inicial ate saiu de António José Seguro que o defendeu desde o início e já está em andamento, mas ainda não em funcionamento. A criação do banco estava implícita na proposta de compromisso do PSD, mas era na do PS que era defendido com todas as letras que a “criação desta instituição financeira – com licença bancária – deve permitir a articulação com as demais entidades bancárias, utilizando um leque abrangente de soluções, desde o financiamento, à emissão de garantias, à exploração do negócio de seguros de crédito, entre outros produtos financeiros”.
Aumento do Salário Mínimo Nacional
Acordo mais ou menos. O PS defende-o e queria-o assegurado já no compromisso de 2013, mas Passos Coelho empurrou sempre uma discussão sobre o assunto para depois do fim do programa de ajustamento. Aumento, apesar de discutido agora com os parceiros sociais, só acontecerá em 2015.