Martin Blessing é o líder executivo do segundo maior banco da Alemanha, detido em 17% por capitais públicos, mas acaba de indispor o acionista de referência da instituição. Num artigo publicado no jornal Handelsblatt, o banqueiro argumentou a favor do lançamento das eurobonds, títulos de dívida comuns aos membros da zona euro e uma solução que tem sido defendida como via para fortalecer o euro e superar, em definitivo, a crise da dívida soberana.
O Ministério das Finanças alemão não gostou daquilo que leu e foi rápido a reagir, ao sugerir a Blessing que se concentrasse na gestão do Commerzbank. Steffen Kampeter, vice-ministro das Finanças no Governo de Berlim, afirmou que “as eurobonds estão longe, muito longe da agenda política. E por boas razões”.
O ponto de vista de Martin Blessing, recorda o Financial Times, está em choque frontal com aquela que tem sido a perspetiva defendida por Angela Merkel desde o início da crise financeira que fez tremer a zona euro. A chanceler alemã considera que a introdução das eurobonds iria afrouxar os esforços das economias mais fracas da moeda única europeia para adotarem reformas estruturais e recuperarem.
“Em vez de ocupar o seu tempo com este tema na hora errada, Martin Blessing devia concentrar-se no seu papel como presidente executivo” do Commerzbank, acrescentou Stephen Kampeter. O banqueiro escreveu que a resposta do Banco Central Europeu (BCE) à crise, que tem envolvido a aquisição de obrigações emitidas por Estados-membros do euro, significa que, na realidade, já existe na zona um sistema de partilha das responsabilidades sobre os compromissos assumidos perante os credores.
A polémica surge um dia antes de o conselho de governadores do BCE tomar decisões sobre política monetária, durante uma reunião prevista para quinta-feira, 4 de setembro. Alguns analistas acreditam que a instituição presidida por Mario Draghi dará sinais de que irá, em breve, concretizar um programa agressivo de aquisição de títulos de dívida, numa operação qualificada como “quantitave easing” e que visa, em última análise, aumentar a liquidez disponível na economia e fazer chegar mais crédito às empresas para ajudar a financiar novos investimentos, a estimular o crescimento e a criar mais empregos.
Os números mais recentes sobre o comportamento da zona euro não são animadores. Na Alemanha, o segundo trimestre de 2014 foi marcado por uma contração de 0,2% na economia mas, além do fraco desempenho da maior potência da zona, a economia da moeda única registou uma estagnação no mesmo período, quando a variação do produto é medida em relação ao período que decorreu de janeiro a março deste ano.
A taxa de inflação ter-se-á ficado por 0,3% em agosto, de acordo com as estimativas do Eurostat, gabinete de estatísticas da União Europeia, longe do objetivo de 2% definido pelo BCE e agravando a ameaça de um período longo de baixo ritmo de evolução dos preços. Os valores finais para o mês de agosto da taxa de inflação anual, a variação do nível de preços entre um mês e o mesmo mês do ano anterior, serão divulgados pelo Eurostat a 17 de setembro.
As eurobonds, ou “euro obrigações” em tradução livre, que suscitaram a polémica entre o homem-forte do Commerzbank e as autoridades de Berlim, são títulos de dívida emitidos pelos países da zona euro cujos compromissos seriam assumidos pelo conjunto dos membros do euro. Entre as vantagens, os defensores apontam a de que os países com maior risco de crédito conseguiriam financiar-se nos mercados a taxas de juro mais baixas. Em contrapartida, as economias mais sólidas e financeiramente saudáveis teriam de suportar um preço mais elevado pelo seu financiamento, já que a taxa de juro incorporaria um prémio pelo risco associado aos países mais endividados. Neste cenário, a Alemanha seria uma das nações mais penalizada.