A relatora das Nações Unidas para a água disse hoje que alguns países não dão prioridade às pessoas, em caso de escassez deste recurso, como refere o direito humano, um alerta que fará no congresso mundial, em Lisboa.
“Hoje em dia não está claro quem deve ter acesso à água, em caso de escassez, ou seja, há países em que não é claro que a prioridade deve ser para as pessoas e, em caso de escassez, os poucos recursos existentes vão ser desviados, nomeadamente para a indústria, a mega agricultura, o turismo, os hotéis ou os campos de golfe”, referiu Catarina Albuquerque em declarações à agência Lusa.
O direito humano diz que “a prioridade tem de ser para a água para consumo pessoal e doméstico”, para beber, para cozinhar e para a higiene pessoal e da casa, explicou.
“O que tenho verificado é que isso não acontece sempre. O acesso à água é sobretudo uma questão de poder, ou de falta de poder, quem tem poder e dinheiro, tem acesso à água, quem não tem poder e dinheiro, não tem”, defendeu Catarina Albuquerque.
A relatora da ONU vai participar no Congresso Mundial da Água, que se inicia em Lisboa, no domingo, e terá 5.000 participantes de todo o mundo.
Apresenta o seu “Manual de aplicação do direito humano à água e saneamento”, um livro que pretende fazer com que os decisores políticos, mas também todos os profissionais ligados a esta área, utilizem os direitos humanos para guiarem as suas opções, e vai ter versões em inglês, português, espanhol, árabe e francês.
“Espero que os profissionais da água tomem cada vez maior consciência de que estamos a falar de direitos humanos e de que não é uma questão de favor. Os reguladores, as empresas de fornecimento de água ou os governos, têm de ter as pessoas no centro da sua tomada de decisões, das [suas] opções”, insistiu a especialista.
Para Catarina Albuquerque, “aquilo que os direitos humanos trazem para cima da mesa é precisamente a possibilidade de equilibrar os pratos da balança, de dar voz e poder a quem menos tem, ou pelo menos, dar razão a quem não tem poder”, numa altura em que a situação se agrava devido ao risco das alterações climáticas.
“As pessoas, por muito pobres, por mais que pertençam a uma minoria étnica, por mais que morem numa zona remota, têm um direito humano que tem de ser realizado de forma prioritária, mesmo quando temos outros interesses em jogo”, declarou.
Refere o exemplo do Brasil, onde a cidade de S. Paulo “está a sofrer uma das piores crises hídricas de sempre e continua a haver casas com piscinas cheias e pessoas que não têm água, nas favelas”.
A água para consumo humano representa 3% da água doce existente no mundo, o que compara com cerca de 70% que é utilizado na agricultura.