Perfil originalmente publicado em setembro de 2014, quando Fernando Santos foi anunciado como selecionador.

Uma vida passada entre Portugal e a Grécia. É assim que se pode resumir a carreira de Fernando Santos no futebol. O novo selecionador nacional não fez grande história enquanto jogador, mas, como treinador, levou o FC Porto ao penta e, na Grécia, não só foi considerado o melhor treinador do país por três vezes, como ainda foi eleito o melhor técnico da primeira década do século XXI.

E, agora, “este é o culminar do sonho que tinha, que era chegar ao topo do futebol português. Ele merece lá estar”, considera Luís Roquete, atual treinador do Sporting Ideal, dos Açores, e que foi adjunto do novo selecionador durante seis anos e meio.

Tudo começou no Estoril, no final dos anos 1980, quando foi adjunto de António Fidalgo, que, mais tarde, sairia para o Salgueiros – e aí assumiu o comando técnico da equipa principal. Na altura, contou recentemente ao jornal i, o engenheiro de formação acumulava a direção da equipa com um trabalho no Hotel Palácio.

“O Fernando no início não pensava ser treinador profissional. Trabalhou no Hotel Palácio como chefe da manutenção, ganhava bem. Ele gostava muito do que fazia e agora sempre que pode vai lá visitar o hotel e as pessoas”, relata Luís Roquete.

Antes disso, já passara pelo António Coimbra da Mota como jogador, depois de ter representado os juniores do Benfica durante duas épocas, entre 1971 e 1973. “O Estoril pediu-me para aguentar o barco mais seis meses” depois da saída de Fidalgo, conta. Acabou por ficar seis anos. No final da época 1993/1994, quando o Estoril ficou em último lugar da Liga e desceu à segunda divisão, rumou ao Estrela da Amadora, onde se manteve por três temporadas e conseguiu levar o emblema à sétima posição do campeonato – a melhor classificação obtida pelo clube na primeira Liga.

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Mas foi no FC Porto que ganhou reputação. Chegou, viu e venceu. Levou a equipa ao primeiro pentacampeonato da história do clube e ganhou para sempre o título de “engenheiro do penta”. As duas épocas seguintes não seriam tão bem sucedidas – cedeu o primeiro lugar ao Sporting em 2000 e depois para o Boavista no ano que se seguiu. No início dos anos 2000, viajou pela primeira vez para a Grécia.

Treinou o AEK e o Panathinaikos. Voltou ao país para treinar o Sporting e, no final da época de 2004, quando Portugal perdeu a final do Euro para o seu novo país adotivo, rumou de novo ao emblema de Atenas, que levou ao segundo lugar do campeonato ao fim de duas épocas. Apesar de só ter ganho uma taça, foi eleito por duas vezes consecutivas o melhor treinador da Grécia. Viria a ser reconhecido como tal uma vez mais, em 2009, por orientar o PAOK Salónica, onde chegou depois de uma atribulada passagem pelo Benfica. Ao orientar o clube da Luz, fez história: tornou-se um dos quatro treinadores a passar pelos três grandes nacionais. Fez terceiro lugar na primeira época e, na segunda, não teve sequer tempo para aquecer o banco: apenas treinou a equipa por um jogo em 2007/2008.

“Só não foi campeão no Benfica por acidente – e depois veio o erro do clube, de despedi-lo na primeira jornada da segunda época. Aliás o presidente reconheceu-o e é por isso que tem dado oportunidades a Jorge Jesus. Sem estabilidade nada se faz. Ele ficou muito triste, foi uma situação anormal“, lembra Roquete, que também foi seu adjunto na Luz, em 2006/2007.

Desde aí, nunca mais saiu da Grécia, primeiro no PAOK, depois na seleção, que conseguiu levar ao melhor resultado de sempre numa fase final de Mundiais: os oitavos-de-final. Mas nunca fechou a porta a um regresso a casa. “Dificilmente diria que não à seleção do meu país”, afirmou em 2010. Chegou agora a sua vez.

“É a pessoa indicada. A seleção está com uma crise de identidade”, diz Luís Roquete, que acredita que o processo de renovação por que a seleção terá de passar é semelhante à que Santos enfrentou na Grécia, após a saída de Otto Rehhagel. “Juntou jogadores jovens com alguns mais velhos. Somou apuramentos e bons desempenhos no Euro 2012 e Mundial 2014. Vai fazer o mesmo cá”.

E, acredita o amigo de longa data, “para liderar craques e pseudo-craques, a liderança dele será importante”, porque Santos, “sem usar chicote, exige respeito”. Como exemplo, relata um episódio passado no Estoril.

“O Erwin Sánchez chegou do Benfica emprestado. Era um craque. Jogava era só para a frente, para trás nada. O Fernando chamou-o ao balneário e explicou-lhe que jogar no Estoril era diferente. Ali todos atacavam e todos defendiam. Foi frontal e simples. Sánchez mudou e fez uma grande época.”

Um homem “extremamente divertido” e “extremamente inteligente”, que sabe “adaptar-se às circunstâncias” e que está finalmente no lugar com que sempre sonhou. Só o tempo dirá se a sua engenharia conseguirá recuperar uma seleção destroçada. Só o tempo dirá se, ao epíteto de “engenheiro do penta”, outro se juntará.