Imprudente e enganadora. É desta forma que o relatório da comissão de auditoria da Portugal Telecom (PT), elaborado em julho, descreve a estratégia financeira da operadora, sobretudo, nos últimos anos, noticia o Público. Zeinal Bava, Henrique Granadeiro e o administrador financeiro Pacheco de Melo são os grandes visados do documento, por terem desrespeitado uma regra elementar de boa gestão – a diversificação dos ativos – e ocultado as decisões de tesouraria ao mercado e à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).

“Com o objectivo de mitigar os riscos de crédito, a política da PT é de investir em aplicações de curto prazo, junto de instituições financeiras diversificadas, com reputação no mercado ou tendo em consideração o respectivo rating de crédito”, escreveu a PT nos relatórios de gestão e contas.

Entre 2011 e abril de 2014, a exposição da PT ao Grupo Espírito Santo (GES) em depósitos a prazo e títulos de dívida de curto prazo passou de 70,91% para 98,6% face ao total disponível, diz o Público. A concentração em sociedades do GES contraria aquilo que a empresa de telecomunicações tinha garantido nos relatórios e contas: que diversificava os investimentos junto de várias instituições financeiras “para mitigar os riscos de crédito”.

Depois do Expresso ter publicado o investimento de quase 900 milhões de euros da PT em papel comercial da Rioforte, a Comissão de Auditoria pediu “um resumo da evolução histórica dos saldos das aplicações” entre 2001 e 2014. Foi nesse resumo que a comissão concluiu que a aplicação de excedentes de tesouraria em depósitos a prazo e títulos de dívida de curto prazo em sociedades do GES, sobretudo na Espírito Santo International (ESI), tinha passado de um mínimo de cerca de 36,8% em julho de 2008 para um máximo de 98,6% em abril de 2014. Uma exposição considerada “elevada, tanto em termos absolutos como relativos”. 

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A PT vendeu a participação que detinha na brasileira Vivo à Telefónica em julho de 2010 e encaixou 4,5 mil milhões de euros com essa operação. A 30 de setembro, a PT já tinha aplicado 3.118 milhões de euros, 50,9% do total disponível, em aplicações que pertenciam ao GES. Destes, 2.240 milhões de euros eram oriundos da venda da Vivo. É nessa altura que, pela primeira vez, a PT investe 250 milhões de euros em títulos de dívida da ESI, onde se mantém até janeiro de 2014. Depois, a empresa de telecomunicações transfere o investimento para papel comercial da Rioforte.

Em outubro de 2011, depois de a PT ter comprado a Oi, a exposição ao GES sobe para 79,91% do total, 3.065 milhões de euros. No ano seguinte, sobe para 85,9% e “assiste-se a um aumento da concentração”. Zeinal Bava foi presidente executivo da PT entre abril de 2008 e junho de 2013. Henrique Granadeiro sucedeu-lhe na liderança.

“As aplicações [no GES], em especial as relativas a títulos de dívida, não cumpriram os requisitos cautelares de uma gestão de risco divulgada nos documentos de prestação de contas, quer sobre diversificação, quer a natureza das contrapartes, por terem sido feitos como uma holding não financeira, cuja boa reputação no mercado não se encontrava evidenciada”, comentou a comissão de auditoria.

Omissão deliberada do regulador?

A CMVM desconfia que os gestores da PT tenham “omitido deliberadamente” a informação sobre a aplicação em depósitos a prazo e títulos de dívida de curto prazo ao mercado e caso a suspeita se confirme, os gestores da PT poderão incorrer em “fortes penalizações”, avança o Público.

A situação agrava-se porque a empresa de telecomunicações portuguesa detém uma participação qualificada no BES superior a 2%, o que contraria uma das medidas da troika: quando um banco está em dificuldades o resgate terá de envolver acionistas e obrigacionistas. Desta forma, se o BES falisse, a PT seria atingida enquanto investidor, financiador e cliente. 

O prejuízo da PT com a exposição ao GES rondará 1,1 mil milhões de euros, se somarmos o financiamento à Rioforte com as ações do BES. Perante este cenário, o financiamento de 897 milhões de euros que a PT concedeu à Rioforte é “quase um detalhe”, diz o Público. Quando a polémica estoirou, Zeinal Bava disse à revista Veja não saber do que se passava .

“Da leitura das atas da comissão executiva e do conselho de administração”, o relatório interno de Agosto concluiu que as decisões de investimento no GES “nunca foram objeto de discussão e aprovação daqueles órgãos” e que a Oi (através da transferência da PT Portugal) sabia da dívida da Rioforte.