O PS considera os depoimentos do ex-primeiro-ministro Durão Barroso e do ex-ministro da Defesa Paulo Portas “indiciariamente inverdadeiros” e vai fazê-los chegar à Procuradoria-Geral da República. “Acabou hoje um longo ciclo de mentiras impunes”, disse o deputado socialista José Magalhães durante a apresentação das conclusões da comissão de inquérito à compra de equipamentos militares, que decorreu esta sexta-feira na Assembleia da República. “Mas felizmente em política os atentados à verdade não prescrevem”, acrescentou.

Numa intervenção pormenorizada sobre aquilo que considera terem sido as “mentiras” e “contradições” da comissão de inquérito, que durante quatro meses investigou a aquisição dos dois submarinos, José Magalhães apontou o dedo a Paulo Portas e Durão Barroso, que disseram em respostas à comissão ter estado apenas de forma “circunstancial” com o cônsul alemão Jurgen Adolff, e sustentou a sua intervenção com citações do documento oficial da justiça alemã que condenou o ex-cônsul por corrupção.

Dizendo que “a novidade vem de Munique” e tentando traçar um mapa dos passos de Barroso e Portas, o deputado socialista José Magalhães descreveu vários episódios, almoços e reuniões entre o na altura primeiro-ministro, o ministro da Defesa, o administrador alemão da Ferrostaal, Hanfried Haun, e o ex-cônsul honorário Jurgen Adolff, durante o período de julho de 2002 a junho de 2004 (dias antes de Barroso ser apontado para a Comissão Europeia).

“A 5 de julho de 2002, o cônsul Adolff organizou um almoço que permitiu ao administrador da Ferrostaal uma conversa direta com o primeiro-ministro, que vou citar: ‘Como resultado dessa conversa o primeiro-ministro Barroso solicitou expressamente ao dr. Mário David e ao dr. Adolff que acompanhassem a questão do German Submarine Consortium”, disse o deputado socialista no Parlamento, lendo excertos do processo judicial alemão.

José Magalhães lembrou ainda um encontro entre Paulo Portas e o ex-cônsul numa viagem entre o aeroporto de Munique e o hotel, que Portas chegou a admitir ter acontecido, mas que, segundo o PS foi mais do que um encontro de circunstância. Nessa ocasião, disse Magalhães, “houve uma conversa a quatro olhos, ou seja a sós, do cônsul Adolff com o ministro da Defesa Paulo Portas sobre como continuar o processo e sobre o problema da queixa francesa”.

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Como é habitual nos casos em que o inquérito parlamentar acontece em simultâneo com investigações judiciais, as conclusões do relatório e todo o material da comissão de inquérito vão ser enviadas para a PGR, como confirmou esta sexta-feira em plenário a deputada e relatora da comissão Mónia Ferro. Mas questionado pelo Observador sobre se o PS ia enviar outros documentos à Procuradoria-Geral, de forma autónoma, José Magalhães disse que não ia “fazer uma queixinha à parte“, porque o molde escolhido pela deputada do PSD (de enviar todo o conteúdo da comissão, incluindo o debate de hoje em plenário) “também nos serve”.

Ou seja, o PS quer que a Procuradoria-Geral da República atente nas “contradições” dos depoimentos feitos por Paulo Portas e Durão Barroso no âmbito da comissão – onde são obrigados por lei a responder -, contradições essas que hoje o PS levou ao plenário da Assembleia através da sentença judicial alemã que citou em pormenor.

Para o PS, o relatório “inacabado” do inquérito “apressado”, discutido e votado em plenário, não é mais do que um “relatório fio-dental”, que “não tapa absolutamente nada”. A mesma linha de argumentos é seguida pelos restantes partidos da oposição, que acusam o relatório redigido pela social-democrata Mónica Ferro de ser “viciado” e de ter ainda muitas perguntas por responder.

Segundo o coordenador do Bloco de Esquerda, João Semedo, trata-se apenas de um “relatório de conveniência” com “conclusões tendenciosas e mesmo mentirosas”. “Mentirosas porque não é verdade que ‘nenhuma pergunta ficou por fazer’ e muito menos que ‘não se retirou qualquer indício de cometimento de ilegalidades”, disse.

Para o CDS, no entanto, a comissão de inquérito “foi até onde podia ir” e o deputado centrista Filipe Lobo d’Ávila  aponta baterias ao PS, justificando aquilo que chamou de “o incómodo socialista”: “Foi com o PS que se aceitou a alteração do modelo de submarino, foi com o PS que se deixou cair a execução das contrapartidas, foi com o PS que a ESCOM ganhou o seu primeiro concurso”, disse.