O Banco Nacional de Angola (BNA) preparava-se para intervir no BESA (Banco Espírito Santo de Angola) uma semana antes da resolução do Banco Espírito Santo (BES).
Em carta enviada ao Banco de Portugal, o governador do BNA adianta que tem vindo a “aprofundar a natureza das graves situações detetadas com a gestão e qualidade de ativos do BESA. Estes novos elementos, levar-nos-ão à tomada de decisão mais assertivas nos próximos dias, no sentido da correção e proteção do sistema financeiro”, afirma José de Lima Massano.
O supervisor angolano revelava ainda que era já “evidente a existência de responsabilidades a nível do próprio grupo que fragilizam, em muito, a condição económica e financeira do BESA”.
A mensagem de 27 de julho, a que o Observador teve acesso, chegou ao Banco de Portugal uma semana antes de concretizada a resolução do BES, que foi anunciada na noite do domingo seguinte, e revela que a filial angolana iria trazer problemas relevantes à casa-mãe, mesmo que não tivesse sido aplicada a medida.
Na sua audição no Parlamento, o ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, defendeu que a situação do BESA estava controlada, devido à garantia soberana concedida pelo Estado de Angola, e que esta só foi anulada devido à decisão das autoridades portuguesas de separar o banco bom do BES, colocando a operação angolana no banco mau.
A mensagem enviada a Carlos Costa revela que o Banco Nacional de Angola esperava ter uma posição assumida sobre a forma de intervenção ainda na semana que antecedeu a resolução, “o que poderá ajudar a esclarecer o conjunto de responsabilidades ou imparidades que poderão ter que ser refletidas na escrita do BES”. Os prejuízos semestrais conhecidos a 30 de julho de 3,6 mil milhões de euros ainda não refletiam esta situação.
A garantia foi concedida no final de 2013 para cobertura do riscos de incumprimento de créditos 5,7 mil milhões de dólares, a maioria dos qual terão sido atribuídos durante a gestão de Álvaro Sobrinho. O ex-presidente executivo do BESA, que abandonou estas funções no final de 2012, é ouvido esta quinta-feira na comissão parlamentar de inquérito aos atos de gestão do BES e do Grupo Espírito Santo (GES).
Havia créditos cobertos na garantia que não seriam aceites
Sem colocar propriamente em causa a garantia, o BNA alertou que da avaliação feita à totalidade dos empréstimos cobertos, foram apurados “indícios de que alguns dos alegados créditos não seriam elegíveis, demandando o reforço das provisões regulamentares”. Ou seja, mesmo com garantia a valer, o BESA poderia ser obrigado a fazer provisões fora da cobertura, o que teria impacto financeiro no maior acionista, o BES.
Não se conhecem os clientes dos créditos concedidos pelo BESA na gestão de Álvaro Sobrinho, mas sabe-se que a garantia assinada pelo governo de Luanda tinha um anexo onde estavam identificadas todas as operações cobertas. Sobrinho vai esta quinta-feira à comissão parlamentar de inquérito.
Na mensagem ao supervisor liderado por Carlos Costa, o congénere angolano refere ainda que a linha de crédito concedida pelo BES ao BESA, num valor superior a três mil milhões de euros, teria que ser “amplamente reestruturada”, como aliás veio a acontecer já com o Novo Banco que reconheceu uma perda de 80% deste valor. O capital social do Novo Banco já refletia aliás essa imparidade. A recapitalização do BESA foi feito com investidores angolanos e à revelia do BES, cuja representante foi impedida de participar na assembleia-geral, por se ter atrasado.
O regulador angolano adianta ainda que o AQR (asset quality review), um exercício que avalia a qualidade dos ativos, realizado ao BESA, foi muito útil e seria alargado aos outros bancos regulados pelo BNA. Era ainda realçada o objetivo de encontrar soluções que protejam todas as obrigações do banco, com prioridade para os direitos dos depositantes.