Fernando Nobre, o candidato presidencial que em 2011 sem o apoio de qualquer partido obteve 14% dos votos, garante ao Observador que não voltará a ser candidato e, desiludido, diz que as candidaturas “verdadeiramente” independentes e ganhadoras são “impossíveis” em Portugal. Sobre a futura candidatura presidencial de António Sampaio da Nóvoa, o médico e fundador da Assistência Médica Internacional (AMI) fala num académico “respeitado”, “com provas dadas” e “maturidade suficiente”, mas com um problema: não tem obra feita nem experiência política e isso, na hora ‘H’, vai ser o suficiente para ser “ostracizado”.

O ex-candidato presidencial critica o facto do ex-reitor da Universidade de Lisboa “estar à procura de apoio dos partidos”. “Conheço Sampaio da Nóvoa, um académico respeitado e com provas dadas, mas parece-me que está à procura do apoio dos partidos” e isso, segundo Nobre, será difícil de conseguir. “O PS terá o seu candidato oficial e os que hoje dizem que o apoiam, depois vão ostracizá-lo”, vaticina.

Para Fernando Nobre, que assume falar com conhecimento de causa, é esse o ciclo viciado das candidaturas independentes: “No início [o candidato] é tolerado, depois é ostracizado e até insultado e, no fim, é rejeitado pelo sistema político minado”.

Assim, ainda que elogie as movimentações políticas dentro da sociedade civil, Nobre mata a candidatura do ex-reitor antes da nascença. “O candidato bem pode ser um académico respeitado, com provas dadas na Academia e com maturidade suficiente, mas como não tem obra conhecida nem a tão desejada experiência política, quando se levantar de peito aberto para responder à chamada vai ser o alvo de todas as balas”, diz, antecipando um desfecho prematuro para a provável candidatura de Sampaio da Nóvoa a Belém.

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Fernando Nobre integra o Conselho Geral da Universidade de Lisboa e, nessa qualidade, conhece “pessoalmente” o ex-reitor daquela universidade. Já sobre Henrique Neto, até agora o único que se afirmou oficialmente como candidato a Belém, Fernando Nobre diz que não conhece pessoalmente, mas levanta igualmente dúvidas sobre a independência da sua candidatura. É que, “além de já ter sido deputado eleito pelo PS”, Nobre acredita que a sua candidatura está feita à medida de um partido político que, a seu ver, foi criado especialmente “para esse fim”: o Partido Democrático Republicano (PDR), de Marinho e Pinto.

“Henrique Neto já foi deputado eleito pelo PS mas também já se vislumbra como tendo à partida o apoio de um outro partido que, aliás, parece que foi criado para esse fim”, diz, referindo-se ao PDR.

Por estas razões, Nobre considera que nem Henrique Neto nem Sampaio da Nóvoa encaixam no perfil de candidatos independentes. “Fala-se na importância de candidaturas independentes, vindas da sociedade civil e da participação cívica e democrática, mas essas candidaturas são pura falácia”, diz, defendendo que são os partidos que movimentam, através do apoio financeiro, as candidaturas presidenciais, que deviam ser pessoais e de cidadãos.

O sistema político também não ajuda as candidaturas extra-partidárias, segundo Nobre. Ao Observador, o presidente da AMI fala num sistema “minado” que acaba por “triturar” quem, “por imperativo de consciência”, se assuma como candidato independente, ao erguer as bandeiras da falta de experiência e do “estagiário sem currículo”.

“Uma candidatura verdadeiramente independente é quase uma impossibilidade”, conclui, destacando duas dificuldades primordiais: o processo organizado de recolha e validação das assinaturas junto das freguesias, e o apoio financeiro. “Um candidato independente só pode receber donativos de pessoas individuais, num máximo de 25 mil euros, e pôr uma candidatura vencedora em marcha com menos de 1 milhão de euros é tarefa quase impossível”, diz.

Por estas razões, Fernando Nobre garante ao Observador que é seguramente uma carta fora do baralho na corrida à sucessão de Cavaco Silva. O fundador e presidente da AMI afirma que o seu desafio de curto e médio prazo é continuar o trabalho na AMI – “onde melhor posso contribuir para servir os portugueses” – e preparar a sucessão na presidência, cargo que conta deixar vago nos próximos dez anos, ou menos.

Manuel Alegre, por seu turno, já veio elogiar a coragem de Sampaio da Nóvoa. Em declarações ao DN, lembrou, contudo, o que aconteceu em 2006 quando o PS não o quis apoiar. “Os erros de alguns dirigentes do PS são em parte responsáveis pelo facto de Cavaco Silva ser Presidente da República [PR]. É bom que esses erros não se repitam”, disse.

O exemplo de Pintassilgo

Na história das eleições presidenciais, houve poucos candidatos independentes. Em 2011, quando Fernando Nobre se candidatou, porém, houve mais um: Defensor de Moura. O socialista e ex-presidente da Câmara de Viana do Castelo resolveu candidatar-se por considerar que o leque de candidatos não abarcava todo o centro-esquerda. Teve 67.110 votos, 1,5%. Terá ficado na história mais pelo debate televisivo que teve com Cavaco Silva, um dos mais duros, do que pela expressão de votos.

Alegre que, em 2011, concorreu com o apoio do PS, protagonizou em 2006 uma candidatura independente. Na altura, os socialistas não lhe quiseram dar apoio e quem avançou foi Mário Soares que acabou humilhado pelo velho amigo. Alegre ficou à frente de Soares com 20,7% dos votos (1,1 milhões de votos).

Antes desta vaga de independentes, Maria de Lurdes Pintassilgo tinha assumido em 1986 a primeira candidatura livre dos partidos. A ex-primeira-ministra, que se descrevia como uma católica progressista, concorreu contra Mário Soares, Freitas do Amaral e Salgado Zenha. Foi a primeira a declarar ser candidata, quase um ano antes do dia das votações. Entretanto, surgiu uma série de adversários e acabou por ter apenas 7,3% dos votos. Essas eleições presidenciais foram as únicas até hoje em que houve duas voltas. Freitas do Amaral foi o candidato mais votado, seguido de Mário Soares, mas não conseguiu ter 50% mais um dos votos.