Nos últimos anos, o turismo espalhou-se um pouco por todo o lado e passou a fazer parte da nossa vida. Foi este o ponto de partida para mais uma Conversa do Observador. E faz justiça ao momento de sucesso que o setor turístico em Portugal atravessa. Os dados do Turismo de Portugal, referentes ao primeiro semestre de 2015 indicam que as receitas turísticas atingiram 4,6 mil milhões de euros (mais 12,2% que no mesmo período em 2014). Ou seja, entre janeiro e julho deste ano o setor do turismo gerou 28 milhões de euros por dia.

Mas o valor do turismo não deve ser apenas económico, chegou o momento de passar dos números às palavras de ordem, que são agora sustentabilidade e unicidade. O desafio é como “não matar a galinha dos ovos de ouro?”, conseguir manter o nível de atratividade e não perder turistas para outros destinos, é nisso que é preciso pensar atualmente.

“A sustentabilidade tem de ser planeada já para os próximos 10 a 20 anos”, disse Duarte D’Eça Leal do The Independente Collective e proprietário de vários hostels e guest houses “fora da caixa”, como os carateriza. “O crescimento de hostels não deve ser encarado como um problema”, referiu. E em jeito de resposta a algumas vozes críticas que se levantam sobre a proliferação deste tipo de alojamento turístico, Duarte D’Eça Leal relembrou que a desertificação da baixa da cidade de Lisboa começou muito antes do boom da criação deste tipo de alojamento. Este aumento deve ser olhado como uma oportunidade para pensar e criar modelos de negócio que sejam sustentáveis no longo prazo. É importante refletir nos padrões do turismo a nível global, porque o paradigma está a mudar.

“O que o viajante quer é uma experiência social,” mais do que uma simples viagem a meia dúzia de locais e monumentos de referência, relembrou Duarte D’ Eça Leal. A procura de alojamento de proximidade reflete a procura da experiência de viver como um habitante do bairro ou da cidade. O viajante não quer apenas “ir a”, mas sentir que por alguns dias faz “parte de”.

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No caso da zona de Belém, o que falta é precisamente esse sentimento de pertença – ainda que fugaz – assente na experiência. “É preciso subir o ‘nível de experiência’ de Belém, é preciso melhorar a experiência turística da zona, para lá do património edificado,” referiu António Lamas, Presidente do Centro Cultural de Belém e coordenador do Plano Estratégico Cultural da Área de Belém.

Apesar de ser uma zona turística por excelência da capital, com grande concentração de património edificado e imaterial, não é uma zona onde se vivam “experiências”. Um dos projetos na calha é a promoção do Distrito Cultural de Belém, um programa estratégico que pretende criar mais valor assente na cultura.

E existem outras formas de proporcionar uma experiência mais rica? “A melhor forma de fazermos negócios ou lojas para turistas é pensarmos primeiro nos portugueses.” Catarina Portas, não tem dúvidas que para garantir a sustentabilidade do setor turístico em Portugal  – e dos negócios associados, como as lojas Vida Portuguesa e os Quiosque de Refresco – o caminho a percorrer é “de dentro para fora” e não o inverso. Até porque um dos principais mercados do turismo em Portugal são os portugueses. “O vai para fora cá dentro teve e ainda tem sucesso,” relembrou Nuno Seabra Lopes, editor e diretor da Zest ­- Books for life.

Experienciar para partilhar e voltar

O número de turistas no nosso país aumentou de forma exponencial e está mesmo a tornar-se um fenómeno de massas. As razões são várias, mas um fator inegável foi a chegada das companhias low cost ao aeroporto da Portela. O turismo massificou-se, mas contra-intuitivamente, também se humanizou. “Hoje em dia os turistas saem de sua casa para entrar na casa de outras pessoas. Preferem o serviço e a proximidade e dispensam as amenidades, como o serviço de quartos” apontou Duarte D’Eça Leal.

A proximidade com a cultura e vida da cidade é precisamente o que os visitantes procuram. “Os turistas querem coisas vivas e, por isso, Lisboa não pode ser uma cidade museu que apenas esteja nos guias internacionais.” A cidade deve ter vida própria e não apenas viver para o turismo, considera Duarte Calvão, coordenador do Projecto Gastronomia da Associação de Turismo de Lisboa.

O turismo existe porque nós existimos. Parece redundante, mas é a essa evidência que não devemos esquecer. A unicidade – aquilo que faz de Portugal um destino único – é a chave para a sustentabilidade. Porque, no paradigma atual, o turista é um consumidor e ao mesmo tempo um promotor, especialmente através das redes sociais. Quem gosta partilha e quem vê, quer vir.

Nuno Seabra Lopes diz a oferta turística deve ser pensada precisamente como partilha turística. “As pessoas não vêm para visitar os monumentos vazios. Vêm para nos ver. Se nos vêm cá ver, alguma coisa, de certeza que fizemos bem. É preciso reforçar a nossa unicidade.” Até porque há um público novo que quer aquilo que é único. “E nós queremos que as pessoas queiram voltar.”

Veja o vídeo integral da sessão Conversas do Observador dedicada ao Turismo:

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