Estudos há muitos. Uns defendem que o vinho tinto tem benefícios para a saúde, outros questionam as suas propriedades. O mais recente, divulgado a 13 de outubro na publicação científica Annals of Internal Medicine, mostra que um copo de vinho tinto à hora do jantar ajuda a aumentar os níveis de “colesterol bom” (HDL) em pessoas com Diabetes tipo 2, além de lhes permitir melhores noites de sono.
A investigação, cuja maior parte dos autores está associada à Universidade de Ben-Gurion, em Israel, contou com 224 pessoas com diabetes tipo 2 — com maior predisposição para desenvolver doenças cardiovasculares e com níveis mais baixos de HDL — que não bebiam álcool com frequência. Foi-lhes pedido que durante dois anos bebessem ao jantar cerca de meio copo (0,15 litros) de apenas uma das seguintes bebidas: água mineral, vinho branco ou vinho tinto. A isso acrescentou-se ainda uma dieta mediterrânica sem restrições calóricas.
Feitas as contas e examinados os grupos, descobriu-se que quem bebeu vinho tinto ficou com níveis mais elevados de HDL — e, consequentemente, níveis mais reduzidos de “colesterol mau” — e dormiu melhor do que quem ingeriu água. Este foi também o único grupo em que se registou uma queda significativa dos componentes da síndrome metabólica, um conjunto de factores associados a doenças cardíacas, derrames e diabetes.
Posto isto, quais os benefícios do vinho tinto?
“Podemos dizer que, dentro da janela do consumo moderado, as suas vantagens são muitas”, começa por esclarecer Conceição Calhau, professora de Bioquímica e Toxicologia Alimentar na Universidade do Porto e investigadora do CINTESIS. É ela quem se apressa a explicar que o facto de o vinho proveniente de castas tintas ser rico em polifenóis faz com que a bebida tenha efeitos antioxidantes e antiflamatórios, além de permitir a diminuição de células tumorais. A também nutricionista e autora dos livros A Dieta Simples e Dieta 1,2,3, Iara Rodrigues, acrescenta que a presença do resveratrol nas uvas contribui ainda para a redução de colesterol.
A enumeração das vantagens associadas ao néctar favorito de Baco não se fica por aqui, uma vez que o vinho tinto possibilita alterações microbióticas, isto é, estimula o aumento de bactérias boas nos intestinos, órgão onde se encontra a segunda maior concentração de neurónios.
Em relação às doenças cardiovasculares, o papel da bebida já entra na esfera do senso comum, com o consumo moderado a ser capaz de aumentar o dito “colesterol bom”. Mas não é só bebendo que conseguimos adquirir os seus benefícios, lembra Conceição Calhau: “O padrão alimentar mediterrâneo consiste em consumir vinho tinto [à refeição], mas este também é usado para temperar alimentos. A carne marinada em vinho tinto, por exemplo, ajuda a prevenir a formação de compostos carcinogénicos que se formam durante o processo culinário”. Preto no branco, o facto de o alimento estar em contacto com o vinho vai prevenir a formação destes componentes.
Na lista de vantagens é importante evidenciar ainda a presença de etanol. “Um vinho sem álcool pode não ter o mesmo efeito, até porque o facto de o etanol estar presente na bebida ajuda a potenciar os benefícios do néctar”, afirma Calhau, salientando que o vinho tinto deveria, na sua opinião, ser considerado uma “bebida fermentada” e não alcoólica, termo com “má conotação”.
Mas o que é um consumo moderado?
Esta é uma pergunta à qual é difícil de responder, dado que o tema é discutível dentro da comunidade científica e depende, segundo a nutricionista Conceição Calhau, da etnia, composição corporal e idade de uma pessoa. Mas se não há limite mínimo definido, o mesmo não se pode dizer em relação à linha que separa o que é moderado do que não o é: a ideia é nunca beber mais do que um a dois copos por dia.
É que o consumo exagerado está diretamente relacionado com a toxicidade do álcool que, por sua vez, afeta o sistema nervoso central e pode até ser responsável pelas constantes perdas de memória. Outra desvantagem considerada a longo prazo relaciona o consumo desregrado de vinho tinto com o aumento do risco de alguns tipos de cancro. Mas não é só a quantidade bebível que entra em debate, como também as circunstâncias em que, neste caso, o vinho tinto deve ser ingerido — “Deve-se beber o vinho à refeição, sem dúvida nenhuma”, afirma Calhau, explicando que ingerir vinho em jejum faz com que o álcool chegue mais rapidamente ao sangue, o que representa um nível mais elevado de toxicidade.
A nutricionista Iara Rodrigues, por sua vez, coloca outra ideia em cima da mesa, defendendo que quem não ingere álcool não deve começar a beber vinho apenas por este estar associado a um conjunto de benefícios: “Não vou considerar vinho no plano alimentar de alguém que não o beba. Estamos a falar de álcool e o álcool vai sempre afetar a saúde de uma pessoa”.
No outro lado da barricada, Rodrigues afirma ainda que quem bebe com frequência deve dar privilégio ao vinho por comparação a outras bebidas, dado que tem menor teor alcoólico do que outras propostas tentadoras como o gin ou o whisky. “No vinho podemos falar dos benefícios da uva relacionados com a parte cardíaca e enquanto agente regenerador de células, no caso das bebidas destiladas isso não acontece. Correspondem à manipulação de cereais e têm um teor alcoólico mais elevado”. Para esta nutricionista, o vinho está no topo da hierarquia das bebidas alcoólicas, sem descurar — repita-se — o seu consumo moderado.