Foi toda a gente apanhada de surpresa. À uma da manhã de terça-feira, a agenda da caravana de Sampaio da Nóvoa previa uma travessia de barco entre Lisboa e o Montijo, alguns “contactos com quem vai embarcar para Lisboa, junto à saída do cais”, uma visita à Lisnave de Setúbal e, da parte da tarde, visitas a uma escola secundária e a uma universidade sénior. Dia não muito agitado, que a noite é de debate a dez e, entre o fim da tarde e as nove da noite, convinha prepará-lo.
Mas foi toda a gente apanhada de surpresa pela morte de Almeida Santos, histórico socialista que ainda no domingo tinha estado a apoiar Maria de Belém numa ação de campanha. Por força das circunstâncias, o dia foi atípico. A entourage de Nóvoa cancelou as visitas agendadas para a tarde mas manteve o programa matinal. Às 9h, o candidato embarcou num catamarã no Cais do Sodré rumo ao Montijo. Sentado junto a uma janela, fez quase toda a viagem sozinho, de semblante carregado. À chegada à Outra Banda, prestou uma “sentida homenagem” a Almeida Santos “por tudo o que ele representa na nossa vida na luta pela liberdade e pela consolidação da democracia”. Foi ali que o candidato anunciou que cancelava as atividades previstas para a tarde e todas as de “caráter mais festivo”, como a arruada de quarta-feira, no Chiado. “Conhecia-o bem. Era amigo do meu pai”, disse.
A caravana não se deteve ali muito tempo e seguiu para a Lisnave de Setúbal. Este enorme complexo de estaleiros navais é o maior do género na Europa e tem um valor de cerca de 110 milhões de euros. Nóvoa quis ali ir para “marcar a importância da indústria da reparação naval”, para relevar “a importância do mar e da plataforma continental” para Portugal e para a sua “recuperação económica”. Depois de visitar alguns dos mais relevantes locais dos estaleiros e de estar reunido à porta fechada com a administração da empresa, o candidato presidencial defendeu perante os jornalistas que é preciso “continuarmos a investir na qualificação dos trabalhadores”, dando como exemplo a Lisnave, onde a “experiência incorporada” faz com que os clientes tenham uma “relação de confiança” e voltem a usar os serviços dos estaleiros.
Dos representantes dos trabalhadores, com quem partilhou o refeitório e o almoço, Nóvoa ouviu queixas sobre o envelhecimento da força laboral da empresa, que no ano passado reparou 110 navios. Atualmente, a Lisnave está encarregada da reparação do Tokyo Spirit, o petroleiro que encalhou ao largo de Cascais em outubro do ano passado. O navio estava já a caminho dos estaleiros, mas apenas para uma curta manutenção. Com o acidente, ficará pelos cais da Mitrena, em Setúbal, cerca de quatro meses. Isso significa que a Lisnave contrata trabalhadores temporários e que o nome da empresa ganha escala mundial, explicaram os representantes da comissão de trabalhadores na reunião com Nóvoa (esta aberta aos jornalistas).
“Esta empresa tem uma média de idades muito alta e a carreira é muito desgastante”, explicou António Pardal, da comissão, 61 anos de idade e 46 de casa. Segundo os dados que apresentou ao candidato presidencial, dos 266 trabalhadores efetivos da Lisnave, apenas um tem 41 anos e a grande maioria tem entre 50 e 62 anos. Pardal manifestou “uma grande preocupação” com estes números, considerando que, a manterem-se futuramente, “a Lisnave vai acabar por morrer”. Apesar disto e de se queixarem dos baixos salários (o mais alto é de 1.004 euros), os membros da comissão de trabalhadores sublinharam que têm uma boa relação com a administração e Vítor Ramalho, apoiante de Nóvoa e diretamente envolvido na reestruturação da Lisnave em 1996, apontou a empresa como um bom exemplo de concertação social.