As gelatarias são, tradicionalmente, sítios coloridos e informais, com uma decoração rudimentar, cuvetes onde nunca faltam pelo menos três sabores, morango, baunilha e chocolate, e um ambiente que mais depressa lembra um jardim de infância do que um laboratório químico. Mas o novíssimo Laboratório do Gelado – Sub 196, aberto desde o final da semana passada, em Alvalade, não respeita essa tradição. Muito pelo contrário. Está bem mais próximo de um cenário de Breaking Bad do que da vizinha Conchanata.
Para começar, não será de estranhar ver Pedro Torgal Viana, o responsável e mestre gelateiro, a atender os clientes vestido à cientista, qual Walter White: não lhe falta a bata branca, as luvas de látex nem os óculos protetores. Quem não souber que está numa gelataria vai achar que está num laboratório. Na verdade, também está. Não só porque é esse o nome da casa mas também porque o respetivo conceito está ligado a esse imaginário. A decoração, da autoria de Pedro, ajuda: a começar nos inúmeros hexágonos que tipificam as estruturas moleculares e acabar no material à vista, como uma fila de tubos de ensaio dispostos ao balcão.
Não se trata apenas de uma opção estética. “Somos a única gelataria em Portugal, que eu saiba, que faz os gelados ao momento recorrendo a azoto líquido“, explica o chef pasteleiro, que depois de trabalhar em seis países e percorrer outros 40 nos últimos anos — “fiz mais de 200 mil quilómetro de carro”, revela — regressou a Lisboa com esta ideia na bagagem. Assim, os sabores disponíveis não estão estão à vista de quem entra, como em qualquer estabelecimento do género, mas sim guardados, em estado líquido, em recipientes semelhantes aos béqueres usados em qualquer laboratório. E só se transformam em gelado, através de uma técnica molecular, depois de feito o pedido do cliente: é o contacto com o azoto líquido a -196ºC (daí o sufixo sub 196 no nome) que transforma o líquido em sólido numa questão de segundos. As sorveteiras fazem o resto.
“Preparo os sabores todas as manhãs, com fruta fresca, não recorro a misturas feitas“, conta Pedro, que tem sempre disponíveis uma dúzia de opções fixas, mais uma ou duas que vão variando e que, por isso, têm a designação “do dia”. Quem estiver à espera de fazer as combinações clássicas desengane-se. “Sou anti mainstream, anti baunilha, morango e chocolate“, afirma. Olhando com atenção para a ementa percebe-se melhor a afirmação. Nenhuma das propostas se limita ao sabor base. Alguns exemplos: alfazema com folha de prata e flor de violeta, banana com noz pecan, caramelo e pipocas, chocolate preto com pepitas e amor perfeito ou caramelo com toque suave de uísque e nougat, o único que não é apropriado para crianças. Os sorvetes de fruta, sem leite, seguem o mesmo caminho. Incluem amora com algodão doce, romã com flor de hibiscus ou limão com pipeta de limonada de yuzu, entre outros.
A ideia aqui não é misturar sabores e muito menos comê-los num cone. Nada disso. “Cada sabor é como se fosse uma viagem gastronómica” descreve Pedro, que os cria para que se comam individualmente, como diz, “sempre num copo, para poderem ser apreciados devidamente“. Os gelados têm textura dada por elementos diferentes — folha de prata, ouro, suspiro, macaron ou flores comestíveis, por exemplo — logo dispensam a bolacha, toppings e outros acrescentos comuns. Cada dose custa 3€ e equivale a perto 200 gramas de gelado. Trocando por bolas, são cerca de três, numa gelataria convencional. No futuro, haverá waffles, crepes e chocolate quente para complementar a oferta, mas sem nunca tirar o protagonismo aos gelados.
Apesar da sua juventude, 24 anos, Pedro Torgal Viana já tem experiência considerável em matéria de pastelaria. Depois de um período de formação em Portugal, aperfeiçou os dotes na cozinha de restaurantes conceituados, como o Attica, em Melbourne (32º colocado da última lista 50 Best Restaurants) o Lion d’Or, perto de Genebra, e o do Hotel Million, em Albertville, ambos restaurantes com estrelas Michelin. Chegou a trabalhar “quase 100 horas por semana“, mas o cansaço não lhe afetou a relação com a pastelaria, que o atrai mais do que qualquer outra faceta da cozinha. Porquê? “Porque é como a química, tem ser precisa para funcionar. Um grama a mais ou a menos pode estragar uma receita“, justifica. No seu laboratório esforça-se diariamente para que isso não aconteça. Custe o que custar, até porque, como se lê numa das paredes, “sans sacrifice il n’y a pas de victoire”. Nem victoire, nem grandes gelados.
Nome: Laboratório do Gelado – Sub 196
Morada: Rua José Duro, 21B (Alvalade), Lisboa
Telefone: 91 836 1263
Site: facebook.com/laboratoriodogeladosub196
Horário: De segunda a sábado das 13h às 20h
Preços: Um gelado (180 gramas) custa 3€. Também vendem para fora: meio litro custa 8,5€, um litro 13,5€ e um litro e meio fica por 18,5€