“Um ano estranho”. É assim que Luaty Beirão, o mais conhecido dos ativistas angolanos detidos, começa por descrever o ano de detenção, num depoimento por escrito divulgado pelo jornal Público.

“(…) É uma tragédia. Mas se nos focarmos naqueles que são os nossos objetivos maiores, os nossos sonhos para este país, é um pequeno sacrifício que conseguimos com a nossa dignidade intacta. Sinto-me mais livre dentro do meu cárcere sabendo que vim aqui parar por assumir as minhas convicções, do que a maior parte dos meus conterrâneos presos e escravizados pelo medo de pensar e de verbalizar as suas ideias”.

Este é um dos sete testemunhos enviados ao Público, a partir da prisão, e que são publicados esta segunda-feira, dia que assinala a passagem do primeiro ano sobre as detenções dos ativistas angolanos, condenados em tribunal por atos preparatórios para uma rebelião e associação de malfeitores.

Outra das mensagens que chegaram de uma prisão de Luanda, foi a de José Gomes Hata, professor do 1.º ciclo, que alinha também na resistência, afirmando que seria capaz de repetir o período na prisão, “todas as vezes que fossem necessárias” se esse for “o preço a pagar pela democracia.” Este ativista apela ainda à mobilização de quem está do outro lado. “O momento exige atitude concreta da nossa parte (jovens). Após a tomada de consciência, ações enérgicas exigem-se. Não esperamos nada de ninguém senão de nós mesmos.”

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A data será assinalada esta segunda-feira com concentrações e outras ações em Luanda, avança a agência Lusa que refere várias convocatórias de grupos civis que circulam na Internet, onde se apela para o “dia da libertação” e pede o fim da prisão dos 17 jovens. Estão previstas concentrações no bairro do Sambizanga e nas localidades de Cacuaco, Viana e Belas, entre o centro e arredores de Luanda.

A 20 de junho de 2015, uma operação do Serviço de Investigação Criminal (SIC) fazia em Luanda as primeiras detenções deste processo, que mais tarde ficaria conhecido como “15+2”, em alusão aos 15 ativistas que ficaram meio ano em prisão preventiva e duas jovens que aguardaram o julgamento em liberdade, constituídas arguidas só em setembro.

Este caso passou as fronteiras de Angola e foi mediatizado com greve de fome de 36 dias do ‘rapper’ luso-angolano Luaty Beirão, um dos condenados.

Tudo começou em maio de 2015, na Livraria Kiazele, na Vila Alice, Luanda. Era ali que os jovens, associados ao movimento revolucionário angolano, antirregime, promoviam reuniões semanais para um “curso de formação de ativistas” para formadores.

Foi também neste espaço da capital angolana que o grosso das detenções aconteceu, a 20 de junho.

Com base no livro do professor universitário Domingos da Cruz “Ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura, filosofia da libertação de Angola”, adaptação da obra “From dictatorship to Democracy”, de Gene Sharp, que inspirou as revoluções da denominada “Primavera Árabe”, deveria prolongar-se por três meses, mas não chegou a completar o primeiro.

Acabaram condenados pela 14.ª Secção do Tribunal Provincial de Luanda, a 28 de março, a penas de prisão efetiva entre dois anos e três meses e oito anos e seis meses.

Foram todos implicados por rebelião e associação de malfeitores, com o autor do livro, Domingos da Cruz, a levar pena mais pesada, considerado pelo tribunal como o líder do grupo. Cumprem a pena, apesar dos recursos – para os tribunais Supremo e Constitucional e um pedido de ‘habeas corpus’, desde o dia 28 de março.

As concentrações de segunda-feira na zona de Luanda estão previstas para as 12:00 locais (mesma hora em Lisboa).