“Os seus olhos e os seus apetites trariam uma longa fila de homens para a sua vida – e enviariam um deles para a morte”. Era assim que o Los Angeles Times descrevia o triângulo amoroso protagonizado por Walburga Oesterreich – “Dolly” para os amigos. Um caso que acabaria por chegar às cadeiras dos tribunais norte-americanos por longos anos. Foi o misterioso processo de uma “vampira marota e graciosa”, um marido assassinado e um amante fantasma que acabou a viver como um morcego em nome de uma paixão assolapada.
Dolly era a mulher de Fred Oesterreich, um dos homens mais ricos do ramo da manufatura têxtil nos Estados Unidos. Em 1913, tinha ela 33 anos, conheceu um jovem de 17 chamado Otto Sanhuber. O caso amoroso entre a dona de casa e o aspirante a escritor começou tão rápido como um fósforo a consumir-se pelo fogo. E como mandam as leis da traição, os dois encontravam-se em segredo nos hotéis das redondezas, no quarto do rapaz e, muito de vez em quando, na casa da mulher. Mas há contornos da história que a viriam a tornar, no mínimo, estranha. É que Otto passou a morar no sótão da casa que Dolly dividia com o marido, sem que este desse por nada.
A ideia foi de Dolly. A vizinhança começou a aperceber-se do amor proibido entre Dolly e Otto e avisou Fred de que estava a ser enganado. Foi então que a mulher sugeriu ao amante que largasse o trabalho e se mudasse para o sótão da família Oesterreich. E ele aceitou sem pestanejar: primeiro, porque estaria mais próximo da sua amada; e depois porque poderia seguir o sonho de escrever uma “pulp fiction” (e de a viver na pele). Não sabia que havia de se tornar num “escravo sexual” de Dolly, termo que ele próprio usaria em tribunal anos mais tarde. No entretanto, Fred acabou ignorar os avisos da vizinhança: afinal, como podia Dolly estar a traí-lo se nunca saía de casa?
A vida fantasmagórica de morcego que Otto escolheu durou quase dez anos. Em agosto de 1922, viria a terminar de forma trágica. Otto ouviu uma grande discussão entre Dolly e o marido. Julgando que a vida da sua amada estava em perigo, desceu do sótão com duas pistolas .25 e baleou Fred Oesterreich por três vezes. Fred morreu, obrigando o casal de amantes a encenar um assalto: Otto fez desaparecer o relógio de diamantes de Fred e Dolly escondeu-se no armário, que foi trancado por fora pelo amante, que entretanto voltou a refugiar-se no sótão.
Esta versão baralhou os polícias durante muito tempo. Embora Dolly fosse uma das principais suspeitas – toda a gente sabia as vantagens que tinha em ver o marido morto -, não havia forma de a culpabilizar: como poderia ela matar alguém se estava trancada no armário e não vivia mais ninguém em casa? Enquanto decorria o julgamento, Otto Sanhuber fugiu para o Canadá e mudou de nome: passou a ser Walter Klein e casou-se com outra mulher. Só voltou para Los Angeles ao fim de oito anos de fuga.
Mas não para se entregar. Foi Herman Shapiro, advogado de Dolly e seu novo namorado, que em 1930 revelou tudo o que sabia sobre o envolvimento de Otto na morte do abastado empresário norte-americano. Otto foi preso, mas libertado pouco tempo depois porque o caso já tinha prescrito. Também Dolly foi presa, mas saiu da cadeia quando foi apurado que não tinha qualquer responsabilidade na morte do marido. Otto desapareceu para sempre, quando saiu em liberdade. Dolly morreu em Los Angeles em 1961.