A notícia era esperada, mas Erez Shasha chorou quando leu que Shimon Peres tinha morrido. Era uma “instituição deste país”, disse ao Observador. Tinham passado poucas horas desde que a imprensa israelita anunciou que o Prémio Nobel da Paz não tinha sobrevivido ao AVC que sofreu há cerca de duas semanas. “Perguntei a mim próprio porque estava a chorar, porque nem sequer o conhecia pessoalmente, mas ele era uma instituição. Era um dos pais de Israel”, continuou o gestor de produto.

O país acordou de luto na madrugada desta quarta-feira, quando se soube que o ex-presidente, ex-primeiro-ministro e um dos ícones do Estado de Israel e da paz no Médio Oriente tinha morrido. “Era o último da sua geração, da geração dos grandes líderes”, acrescentou Liron, 29 anos, e estudante de direito. “Sinto que os líderes com os quais crescemos já não estão entre nós. Ele fazia parte de uma geração que era modesta e nós hoje somos tão diferentes. O mundo está todo tão diferente.”

Quando se fala em Peres, a reação de quem mora em Telavive é unânime. Estão tristes, não só porque o país e o mundo perderam “um grande homem”, “um estabilizador” ou “um protetor”, mas porque sabem que não existe, entre as gerações mais jovens, alguém com um perfil semelhante ao dele.

“Estamos numa altura em que as pessoas começaram a perder esperança. Vivemos numa era negra. Com a morte de Shimon Peres, há menos esperança para o futuro da paz agora”, afirmou Erez Shasha, que tem vivido em Israel a maior parte da vida.

Liron confessa que nem sempre concordou com a visão política do “sonhador”, como chega a tratá-lo, mas que não há ninguém em Israel que não partilhe da sua busca pela paz. E concorda com Erez. Todas as gerações precisam de um líder como Peres, mas não vê ninguém atualmente que possa preencher esse papel no país. “Quando uma geração acaba, há sempre algum receio que as coisas colapsem, porque os valores mudam. Mas as coisas continuam a acontecer. Israel continua a andar para a frente. Vamos ter um próximo Shimon Peres”, diz.

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Eres é mais cético. Não duvida que é preciso um novo ícone para as gerações mais jovens, mas diz que o país “não está sequer perto” de encontrar alguém assim. “Ele era um estabilizador. Era o adulto na sala. Sempre que alguém do governo da ala direita fazia alguma coisa errada, ele, que era da ala esquerda, tentava equilibrar as coisas nos bastidores. E agora não há este equilíbrio”, explicou ao Observador.

“As pessoas sentiam paz quando estavam à volta dele”

Shiran Dahan tem 30 anos e trabalha numa mercearia em Telavive. Diz ao Observador que acordou triste com a notícia da morte de Peres, como se fosse alguém próximo da sua família. “Doeu cá dentro, o meu coração está partido”, diz, pedindo antecipadamente desculpa por não falar fluentemente inglês. E assume que é preciso “alguém que queira proteger o país como ele protegia”.

“Ele fez muito pela paz no mundo e as pessoas sentiam paz quando estavam à volta dele. Quando olhavam para ele viam paz, não viam se ele era judeu, muçulmano ou árabe”, afirma Shiran.

Erez recorda que Shimon Peres também “representava coisas más”. “Às vezes as pessoas odiavam-no, outras vezes adoravam-no, mas para o bem e para o mal era uma instituição.

Liron acrescenta que toda agente em Israel o admirava, mesmo quem não concordava com a sua visão. “Ele era humano e não há nenhum ser humano que seja perfeito, mas toda a gente sabia que ele era muito dedicado a Israel. Tinha muitos sonhos, mas não havia condições para concretizá-los”, diz.

A cerimónia fúnebre de Peres decorre na sexta-feira às 11 horas locais, 9 horas em Lisboa, e de acordo com o ministro dos Negócios Estrangeiros israelita, deverá contar com a presença de Barack Obama, de Bill e Hillary Clinton, do Papa Francisco e do príncipe Carlos, do Reino Unido.

O primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu já reagiu, dizendo que o mundo perder “um homem de visão”, cujo “olhar estava apontado para o futuro”. Já o presidente norte-americano falou “do amigo Peres”, que “mudou o curso da história humana”. Tinha 93 anos e morreu na sequência de um AVC, duas semanas depois de ter sido internado.

Peres foi considerado um dos pais do Estado judaico com uma carreira que passou por cerca de dez ministérios, incluindo o da Defesa e o dos Negócios Estrangeiros e pela presidência de Isral. Foi um dos nomes mais sonantes na luta pela paz com os países vizinhos, tendo estado envolvido em vários aspetos da história do país, ainda antes da sua fundação. Em 1997, fez nascer o Centro Peres para a Paz, com o objetivo de criar alianças entre árabes e israelitas que visem a paz.