Quinze anos depois de terem chegado os primeiros prisioneiros a Guantánamo, a Amnistia Internacional reforça os apelos para o encerramento daquela prisão militar e faz um pedido específico ao presidente americano cessante, Barack Obama: “Não deixe Guantánamo para Trump”, pediram. “Há oito anos, o presidente Obama começou a sua Presidência a prometer o encerramento do campo de detenção de Guantánamo. Ele deve terminar a sua Presidência cumprindo essa promessa”, afirmou Margaret Huang, diretora executiva da Amnistia Internacional (AI) Estados Unidos, por ocasião do 15.º aniversário da prisão militar de Guantánamo.

“Hoje, [Guantánamo] continua a ser um símbolo vivo dos abusos dos direitos humanos por parte dos Estados Unidos”, frisou a representante da organização internacional de defesa dos direitos humanos, lembrando que uma grande parte dos detidos que ainda permanecem naquele campo de detenção “nunca foram acusados, e muito menos julgados, de qualquer crime”.

A menos de duas semanas da tomada de posse do Presidente eleito, Donald Trump, Margaret Huang recordou que os planos do magnata do imobiliário para Guantánamo são contrários aos da administração cessante. “O Presidente eleito Trump indicou que, em vez de encerrar Guantánamo, gostaria de aumentar a população de detidos ou tentar regressar à prática sistemática de atos de tortura. A urgência é clara: Presidente Obama não deixe Guantánamo para Trump”, reforçou.

Após a recente transferência de quatro prisioneiros para a Arábia Saudita, 55 presos permanecem atualmente na prisão militar de Guantánamo, localizada no sul da ilha de Cuba e que foi criada após os atentados de 11 de setembro de 2001 para acolher suspeitos de terrorismo. A prisão localizada na base naval norte-americana de Guantánamo recebeu os primeiros presos, oriundos do Afeganistão, em janeiro de 2002.

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As recentes transferências aconteceram depois dos ‘media’ norte-americanos terem noticiado em meados de dezembro que a administração cessante de Obama estaria a preparar a transferência de cerca de 20 prisioneiros de Guantánamo, detidos que seriam levados para Itália, Omã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos.

Num comunicado divulgado na véspera do 15.º aniversário de Guantánamo, a AI destacou o facto de os Estados Unidos terem assumido, no passado dia 1 de janeiro do ano corrente, um mandato de três anos no Conselho de Direitos Humanos da ONU. A organização internacional salientou ainda que Washington, no seu “manifesto” de candidatura, assumiu o compromisso de defender os direitos inscritos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de cumprir com as suas obrigações ao nível dos tratados de direitos humanos e de se envolver de forma significativa com os órgãos de monitorização dos tratados da ONU.

No entanto, segundo frisou a AI, no que diz respeito às suas obrigações em matéria de direitos humanos, os Estados Unidos “adotam muitas vezes uma abordagem de escolha e, em Guantánamo, optaram por ignorá-las desde o início”.

“Ao longo destes 15 anos, os Estados Unidos proclamaram-se campeões mundiais dos direitos humanos. Fez isso mesmo quando recorria à tortura e ao desaparecimento forçado, em Guantánamo e em outros locais. Continuou a fazê-lo, mesmo quando se recusou a submeter os perpetradores desses crimes sob o Direito Internacional à justiça, e mesmo quando bloqueia a reparação por violações de direitos humanos e mantém secreta a total verdade sobre estes factos”, indicou o comunicado da AI.

Dos 55 detidos que ainda permanecem em Guantánamo, 45 estão presos sem acusação ou julgamento, de acordo com a organização internacional, que acrescentou que os restantes 10 enfrentaram ou estão a enfrentar julgamentos perante uma comissão militar que não respeitam os padrões internacionais de um julgamento justo. Seis detidos enfrentam uma pena de morte.

Durante a campanha presidencial, Donald Trump (que tomará posse a 20 de janeiro) manifestou vontade de manter aberta a prisão militar e “ocupá-la com criminosos”, mas nunca apresentou um projeto detalhado.

O encerramento de Guantánamo foi uma das promessas da campanha presidencial de Obama e da sua administração, desde que chegou ao poder em 2009, mas o processo de esvaziamento da prisão militar foi marcado por várias perturbações.

A oposição do Congresso norte-americano e a relutância dos países em acolherem suspeitos de terrorismo foram apontados como os principais obstáculos ao cumprimento da promessa de Obama. “Embora o governo [de Obama] tenha culpado o Congresso de bloquear o encerramento, (…) a lei internacional, a legislação ou políticas não são desculpas legítimas para o fracasso de um país em cumprir com as suas obrigações com os tratados”, frisou a AI.

“É improvável que os Estados Unidos aceitassem tais desculpas por violações de direitos humanos se fossem apresentadas por outros governos. O resto do mundo não deve aceitá-las por parte dos Estados Unidos”, concluiu a organização não-governamental.

Mesmo assim, Obama conseguiu reduzir significativamente o número de detidos. Quando chegou à Casa Branca, a prisão de Guantánamo tinha 242 prisioneiros. Em fevereiro passado, Barack Obama apresentou um plano que identificava 13 locais em solo americano que poderiam acolher os presos de Guantánamo. Na mesma altura, o ainda Presidente afirmou que a prisão militar manchou a imagem dos Estados Unidos no exterior e enfraqueceu a segurança nacional.

A prisão chegou a contar com cerca de 700 prisioneiros e tornou-se sinónimo, a nível mundial, de atos de tortura, de detenções indefinidas e sem julgamento. Os fatos de macaco cor de laranja dos detidos é outra imagem associada a Guantánamo.