A Comissão Nacional do PS, órgão máximo entre congressos, reunida na cidade do Porto, aprovou uma moção onde defende a despenalização da eutanásia.
A notícia foi avançada inicialmente pelo Diário de Notícias e confirmada pelo Observador. O texto foi aprovado apenas com três votos contra e cinco abstenções.
Como explicava aqui o Observador, a moção, da autoria das deputadas Maria Antónia Almeida Santos e Isabel Moreira, defende, em linhas gerais, que “o ato médico de retirar a vida a um doente terminal a seu pedido reiterado e com o seu consentimento” deve “deixar de ser punível”.
Atualmente, lembram as autoras da moção, “administrar uma dose terapêutica para alívio da dor de um doente terminal e replicar essa dose”, mesmo que isso “possa provocar a morte” do paciente, já não é punível por lei. Noutros casos, os médicos já estão obrigados a respeitar a vontade do paciente quando este “pede que não lhe sejam administrados mais medicamentos ou que lhe sejam desligadas as máquinas”. Ou seja, as proponentes defendem que é preciso dar o próximo passo no sentido de garantir o “princípio da autonomia individual” e “da afirmação dos direitos dos doentes em fase de fim de vida“.
As moções foram levadas ao último congresso nacional socialista, mas só este sábado estão a ser discutidas na Comissão Nacional do PS, no Porto.
Horas antes da reunião socialista, em declarações à Agência Lusa, Maria Antónia Almeida Santos defendia que a eutanásia não é uma “cultura da morte”, mas uma “valorização” da autonomia da pessoa.
“Não há nenhuma cultura de morte, muito pelo contrário, é uma questão de valorizar mais a autonomia da pessoa, a autonomia dos valores que defendemos e, principalmente, perceber a quem é que se dirige esta questão da morte assistida ou da legalização da eutanásia”, defendeu Maria Antónia Almeida Santos, uma das autoras e a primeira subscritora da moção.
Numa altura em que o tema entrou em força na agenda política portuguesa, depois de a petição promovida pelo movimento Direito a Morrer com Dignidade ter conseguido as assinaturas necessárias para ser discutida no Parlamento e de o Bloco de Esquerda ter apresentado um anteprojeto de lei nesse sentido, a socialista defendeu que o PS não podia alhear-se desta discussão.
“O PS e os militantes do PS não deviam ficar alheios desta discussão e, portanto, a oportunidade desta moção é trazer a ‘Eutanásia – um debate sobre a vida’ – e que se pretende que seja uma vida digna – à discussão e ao debate”, por ser um tema que “causa grande incomodidade”, explicou Maria Antónia Almeida Santos.
Maria Antónia Almeida Santos assume que não se deve fugir a esse debate, até porque em breve, no parlamento, se vão discutir iniciativas de outros partidos.“Convém, apesar da liberdade de voto, perceber qual é a sensibilidade do Partido Socialista para a questão da eutanásia”, afirmou.
Antes da votação da moção sobre a eutanásia, o presidente do PS, Carlos César recordou que o partido decidiu dar liberdade de voto no caso de ser suscetível de votação no parlamento. Fica a “cargo da decisão individual de cada deputado” de agir de “modo livre e de acordo com a sua própria consciência e, portanto, não haverá uma orientação do Partido Socialista nesse domínio”, sustentou.
Regulamentação da prostituição e legalização das drogas leves também aprovadas
A Comissão Nacional do PS acabou por aprovar igualmente duas moções onde defendem a regulamentação da prostituição e a legalização das drogas leves.
No que diz respeito à regulamentação da prostituição em Portugal, uma moção assinada pela JS, os socialistas propõem-se agora a equiparar o trabalho sexual a todos os outros, em termos de direitos e deveres.
Na prática, o partido defende a legalização da prostituição sob o argumento de que a “prática de prostituição” continua condenada ao limbo jurídico: “Nem [é] legal, nem [é] ilícita”. “Além de marginalizadas, estas pessoas estão totalmente abandonadas, desprovidas de contrato de trabalho, com contribuições e impostos, de proteção social ou mesmo do direito a terem acesso a crédito à habitação”, pode ler-se no texto da moção.
Partindo desta realidade, os socialistas defendem que o Estado deve “apoiar tanto quem escolhe prestar serviços sexuais, como quem pretende deixar de exercer essa atividade”. A legalização da prostituição, “acompanhada dos mesmos direitos laborais que têm os restantes ofícios” seria um primeiro passo para dignificar “estas pessoas aos olhos da sociedade”. O partido defende que as prostitutas vejam salvaguardados os seus “direitos laborais, sociais e de cidadania plena”, e que tenham acesso a “direitos básicos, como o de terem higiene e segurança no trabalho, direito a baixa médica, férias, horas extraordinárias, subsídio de desemprego, reforma e a formação profissional”.
Além disso, acreditam os socialistas, uma regulação eficaz permitiria trazer para o “lado da economia formal uma realidade que pertence à economia paralela, através do pagamento de impostos”.
Quanto à legalização das drogas leves, um moção igualmente apresentada pela JS, o partido defende que o Estado deve “garantir um controlo efetivo sobre todas as fases do processo, desde a produção” de canábis, “até à venda ao consumidor final, que fica, assim, verdadeiramente protegido”. A ideia é clara: ao garantir a legalização e regulação do mercado de drogas leves, o Estado não só consegue proteger o consumidor, mas também arrecadar receita com a venda deste tipo de estupefacientes.
No entanto, e ao contrário do texto inicial, foi retirado o ponto em que referia que o “Partido Socialista deverá promover a apresentação de iniciativas que visem, nomeadamente, a legalização do consumo e produção da canábis em Portugal”.
“Fazer a diferença nas comunidades”, “Dar força à economia social”, “Autarquias locais: proposta de criação de lei-quadro e correção dos erros da agregação de freguesias”, “Reestruturar as secções e concelhias”, “Limitar proporcionalmente os salários – uma questão de igualdade” e “Em defesa dos jovens do interior de Portugal” foram as outras seis moções aprovadas.
Inicialmente estava prevista a apresentação de dez moções na reunião deste sábado, mas acabaram por ser votadas nove porque uma delas – “Novas propostas para a Justiça” -, não chegou a ser apresentada.
* Com Lusa