Ryley Walker, o bom americano que gosta de enganar quem o ouve. E quem o ouve faz questão de ir na treta dele. Com a guitarra parece que começou a tocar assim que se sentou pela primeira vez, muito antes de se aguentar nas pernas. E quando percebeu que era agraciado por esse bonito dom, espalhou palavras em cima das cordas. O amor, a vida no geral, o “de-onde-viemos-para-onde-vamos”, outra vez o amor, os amigos que o tempo tramou e só mais um pouco de amor. Parece que sabe tudo quando, na verdade, só está à procura de respostas. Mas como junta estas habilidades todas num pele rara de herói folk do século XXI, não há como fugir-lhe. E já que vai estar em Lisboa e Braga esta quarta e quinta, é de aproveitar.
É provável que tenha whiskey na mesa do backstage mas também tem as unhas da mão direita no sítio certo para sacar aquele som que, por estes dias, mais ninguém saca. Olha-se para ele e não tem nada que o distinga, nada que diga “este rapaz Ryley é capaz de parar o tempo só com uma canção” mas essa falsa aparência faz parte do charme criativo que carrega para todo o lado. E é mesmo de “todo o lado que se trata”. Walker esteve no festival de Paredes de Coura no ano passado (é difícil dar-lhe um cenário melhor, é mesmo), andou pela Europa, voltou às Américas e está de regresso. Não pode, não sabe e não vai parar.
[o vídeo de “Roundabout”]
Cheio de contrariedades, este Ryley Walker. Mas contrariedades daquelas boas, daquelas que interessam. “Mas ele parece o amigo do meio do Tim Buckley e do Van Morrison que vai no carro também com o Nick Drake ou assim!” Claro que parece, mas nunca vai deixar de ser um rapaz dos subúrbios de Chicago que só se fez adolescente depois do ano 2000. Tem 27 anos mas insistem em dizer-lhe que tem um espírito velho. Não é bem por aí. O que Walker tem é bom gosto sem data e isso não é pecado, é uma virtude. Mais ainda porque da inspiração que tem dos outros faz uma coisa só dele: convenhamos que é esse o sonho de todos nós, em qualquer ofício, é ou não é?
Começou como é costume, aborrecido e com dilemas. Meteu-se no punk e na vadiagem e tinha uma irmã mais velha com jeito para dar dicas de outras músicas. Apaixonou-se por Meddle, o álbum de 1971 dos Pink Floyd, aquele que é tão psico-progressivo como campestre. Percebeu que o mundo era grande e quis descobrir o que mais havia por ouvir. Colecionou referências e o resto está nos discos, sobretudo Primrose Green, de 2015, e Golden Sings That Have Been Sung, feito de corações partidos e ansiedades. A receita para um disco perfeito, nem mais.
[uma atuação na rádio KEXP de Seattle]
Só viaja com duas guitarras porque, como o próprio diz, “mais do que isso seria estúpido, um gajo com sete guitarras num avião?”. Vai cantar em jeito de mantra mas quando for preciso dá um grito e ninguém o vai esquecer. Honesto, criado pelo bom velho midwest americano, quem o apanhar para um conversa pode esperar que ele fale de tudo e não esconda nada. É um amigo para a vida, mesmo que nunca mais nos apareça à frente. Vai Ryley, vai.
Ryley Walker vai estar ao vivo na Galeria Zé dos Bois esta quarta feira, dia 12, às 22h (bilhetes a oito euros). Na quinta, dia 13, atua no GNRation, em Braga, às 22h30 (bilhetes a sete euros).